Cidades

Para especialista preservação do projeto de Lúcio Costa depende de união

Helena Mader
postado em 24/10/2011 07:34
Brasília foi a primeira cidade moderna a ganhar o título de Patrimônio da Humanidade. O projeto de Lucio Costa para o Plano Piloto, escolhido por meio de um concurso público em 1957, representou uma inovação digna de ser protegida e preservada, na opinião da Unesco. Os representantes da entidade não foram unânimes na decisão de 1987: muitos achavam que a cidade, à época com 27 anos, era muito nova para receber o título. Mas os defensores de Brasília venceram e deram o título à capital federal.

O arquiteto Alberto Xavier, professor da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Belas Artes de São Paulo, destaca a importância de os brasilienses se mobilizarem para preservar a área tombada e o projeto original da cidade. Ele publicou, em 1962, o livro Lucio Costa: sobre arquitetura, no qual fez uma análise do projeto elaborado pelo urbanista, mas também de todos os concorrentes do concurso público. Para Xavier, a proposta de Lucio era de fato superior. ;Os governos têm uma grande responsabilidade para proteger o Plano Piloto e impedir novas intervenções que o desfigurem;, comenta.

O escritor afirma que as características peculiares da cidade precisam ser defendidas. ;É necessário manter os pilares do tombamento. Os diferenciais do Plano Piloto são o gabarito de seis andares, as superquadras com um único acesso para veículos, áreas verdes preservadas e os pilotis livres. Há uma pressão grande do setor imobiliário. Só a esses empresários interessa aumentar a densidade do Plano Piloto.;

Puxão de orelha
A visita da Unesco a Brasília será organizada pelo Iphan e pelo governo brasileiro. Mas o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), entidade parceira da ONU na elaboração de pareceres técnicos, também deverá participar da missão. A presidente do conselho no Brasil, Rosina Parchen, diz que a nova visita à cidade servirá como um puxão de orelha nos responsáveis pela conservação do patrimônio. ;Durante a missão, será verificado o cumprimento das recomendações de 2001, que, como sabemos, foram todas ignoradas. Isso pode significar uma descaracterização da área classificada como patrimônio da humanidade. Além disso, até hoje, não foi criada a zona de amortecimento;, diz Rosina.

A representante do Icomos acredita que os integrantes da nova missão ficarão impressionados com a degradação do patrimônio. ;Ao nosso ver, há problemas seriíssimos na cidade. Existe, inclusive, a ameaça de Brasília entrar na lista do patrimônio em risco, já que está na iminência de perder as suas características originais;, acrescenta.

A comunidade da área tombada acompanha com atenção as discussões sobre a preservação do local em que vive. Líderes das asas Sul e Norte preparam até relatórios com detalhes das agressões ao tombamento para entregar aos representantes internacionais. O presidente do Conselho Comunitário da Asa Sul, Arthur Benevides, diz que já mandou documentos ao Icomos com fotos que mostram o estado de abandono do Plano Piloto. ;As construtoras fazem o que querem da cidade. Há agressões à escala bucólica em todas as partes, com a ocupação ilegal de áreas verdes. Além disso, até hoje não foi resolvido o problema dos puxadinhos;, critica Benevides.

Equipe insuficiente
Uma das recomendações apresentadas pela Unesco em 2001 era o reforço da estrutura do Iphan em Brasília, para que os técnicos pudessem fazer um acompanhamento mais rigoroso. Mas o superintendente do instituto na capital, Alfredo Gastal, diz que faltam equipes. ;A gente faz um trabalho de super-herói. Temos dois arquitetos, um historiador, um engenheiro e acabou. A superintendência de Brasília é quase uma ficção científica;, reclama Gastal, que solicitou recentemente à presidência do Iphan mais pessoal para intensificar os trabalhos.

Há 10 anos, os técnicos da Unesco também pediram que o governo local desse total prioridade à elaboração de um plano diretor para a área tombada. Mas só agora estão avançando as discussões para criar o Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília, o PPCUB. ;Esse plano será a lei regulamentadora do tombamento. Com essa legislação, as regras ficarão muito mais claras e será mais fácil fiscalizar o que pode e o que não pode ser feito no Plano Piloto;, comenta o secretário de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Geraldo Magela. ;A preservação do tombamento é prioridade para o nosso governo, sabemos a importância desse título para a cidade;, acrescenta o secretário.


Exemplo único
Brasília é a única cidade modernista tombada e figura ao lado das mundialmente famosas Paris, Veneza, Cairo e Jerusalém, por exemplo. No Brasil, constam na lista do patrimônio, por exemplo, os centros históricos de Olinda (PE), Salvador (BA) e a cidade de Ouro Preto (MG).

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