Flávia Maia
postado em 26/10/2011 07:45
A disputa política toma conta da Universidade de Brasília (UnB). As eleições para o Diretório Central dos Estudantes (DCE) movimenta estudantes e lideranças. O pleito também mexe com partidos, sindicatos e associações que ; de forma velada, ou não ; influenciam a dinâmica política do câmpus. As oito chapas inscritas agregam representantes de diferentes legendas e ideologias ; da esquerda radical à extrema direita. Além de berço para novos líderes, a disputa funciona como uma das instâncias de brigas locais e prepara o caminho para as escolhas, em maio, da diretoria da Associação dos Docentes (Adunb) e, no fim de 2012, da reitoria.A eleição dos representantes dos alunos começou ontem e termina hoje, mas a articulação política nunca para e faz parte da rotina da universidade. Dentro de um contexto particular, grupos de alunos, de professores e de servidores mantêm articulações muito próximas a fim de conquistar os diversos mecanismos de controle interno. No entanto, as disputas não influenciam apenas os processos eleitorais e acabam atingindo diretamente questões práticas, como greves de professores e o crescimento do câmpus.
A ocupação da reitoria por estudantes de Ceilândia, por exemplo, foi utilizada politicamente por candidatos ao DCE e por representantes de oposição ao atual reitor, José Geraldo de Sousa Júnior. Os líderes aproveitaram a ocasião para promover discursos inflamados contra o professor. Ligado ao Partido dos Trabalhadores, ele é combatido por colegas vinculados a outras legendas e orientações políticas. Qualquer assunto é motivo para antecipar as campanhas do próximo ano. Na última reunião do Conselho Universitário, em 21 de setembro, alguns docentes manifestaram as orientações políticas e trocaram farpas. ;Você votou no PT;, gritou um deles. ;Sou petista mesmo e admito, pior os que são e não admitem;, retrucou outro.
Essa efervescência política é histórica e se intensificou após a ocupação da reitoria promovida pelos alunos em 2008. O movimento resultou no pedido de demissão do então reitor, Timothy Mulholland, acusado de usar R$ 470 mil do Fundo de Apoio Institucional da UnB para decorar o apartamento funcional. De quebra, os estudantes ganharam mais peso nas eleições para a escolha do comandante da instituição e foram fundamentais na vitória de José Geraldo sobre o grupo mais conservador, que, até então, era representado por Timothy.
Na disputa pelo DCE, há estudantes ligados ao PDT, ao PSTU, ao PCdoB, ao DEM, ao PSol, ao PSB, ao PCB e a grupos do PT, como Articulação de Esquerda e Democracia Socialista. Existem também grupos ligados a movimentos mais esquerdistas, como o MR-8 e a Combativa, Classista e Independente (CCI). Inclusive na Chapa 3 ocorre a improvável aliança de membros do PCdoB com estudantes de extrema direita.
Os políticos tradicionais ; deputados, senadores, governadores e presidentes de partidos ; não aparecem nas discussões internas, até porque contam com a antipatia dos estudantes, mas não deixam de acompanhar as disputas. Segundo o estudante Felipe Oliveira, do 5; semestre do curso de administração e membro da Chapa 8, é fácil observar a interferência das legendas nos grupos adversários. ;Com certeza, existe dinheiro dos partidos nas campanhas deles;, afirma. Contrários à interferência das siglas no movimento estudantil, a chapa conservadora chegou a expulsar membros que se filiaram ao DEM e ao PSDB.
O professor do Instituto de Biologia e militante do DEM Marcelo Hermes concorda com os integrantes do grupo. Para ele, a partidarização atrapalha a instituição. ;A presença das siglas arrebenta a UnB. A universidade virou trampolim político, tem até professor doutrinando dentro de sala de aula, e isso é um absurdo;, indigna-se. O professor de direito e chefe do gabinete do reitor, Davi Monteiro Diniz, discorda: ;A universidade é um lugar de aprendizado, inclusive, político;.
Raul Pietricovsky Cardoso é cientista político recém-formado pela UnB e ex-coordenador-geral do DCE. Ele acredita que o movimento estudantil cumpre papel importante na organização da UnB e do próprio DF. ;A universidade é parte da cidade que a gente vive. Ela tem uma responsabilidade direta com o DF. Grupos externos, como a própria figura dos partidos, podem contribuir com o movimento desde que não vejam o espaço como forma de aparelhamento.;
O aluno do 6; semestre de ciência política Rodrigo Dias é militante do PSB, mas não gosta de falar da filiação por entender que os colega podem rotular a Chapa 4 pelas ideias gerais da legenda. ;Se falamos sobre isso, fica parecendo que estamos aqui a serviço do partido, mas, na verdade, estamos lutando por uma universidade melhor;, explica. Lorena Fernandes, 24 anos, do 10; semestre de serviço social, é filiada ao PSol e acredita que é melhor deixar claro que na chapa há integrantes de sigla partidária. ;Ela não interfere em nada nas decisões para o DCE, mas é lógico que algumas diretrizes acabam refletindo na chapa;, explica.
De olho
Os docentes acompanham de perto a eleição para o DCE. A próxima disputa eleitoral na universidade definirá o comando da ADUnB. A atual diretoria é da ala conservadora da universidade e ganhou as últimas eleições com vantagem de apenas 24 votos, em um universo de 1.038 votantes. Os representantes dos partidos de esquerda controlavam a associação, mas perderam a diretoria após o movimento de ocupação da reitoria, quando o grupo saiu dividido para o pleito de 2008. Apesar de estarem juntos novamente, os esquerdistas não conseguiram retomar a posição no biênio seguinte e a disputa passou a aquecer assembleias, greves e discussões da categoria.
Atualmente, o conselho de representantes dos institutos da UnB é formado majoritariamente pela oposição, o que gera mais embates. As diferenças políticas interferiram até em questões de interesses da classe, como na discussão sobre o pagamento da Unidade de Referência de Preço (URP), que aumenta em 26% a remuneração dos professores. Segundo docentes, alguns opositores trabalharam contra o benefício a fim de desgastar a atual diretoria.
Quórum baixo
Ao mesmo tempo em que as eleições ganham mais chapas, o número de participantes deixa a desejar e o desafio da próxima disputa é mobilizar os alunos a votar. Na última eleição pelo diretório, menos de 10% dos 33 mil universitários foram às urnas. ;São muitos alunos se candidatando e poucos votando, isso precisa mudar;, analisa Rodrigo Dias, 20, integrante da Chapa Canto Novo.
Diversidade de ideias
Chapa 1 ; Junt@s somos mais
N; de membros: 64
Influências partidárias: Articulação de Esquerda (tendência do PT) e PDT
Apesar de ser o grupo ligado à atual gestão, muitos membros estão na disputa pela primeira vez e não têm filiação partidária, como ocorre na maioria das chapas.
Chapa 2 ; Pra mudar a UnB ; Oposição ao DCE
N; de membros: 51
Influências partidárias: PSTU
A base é formada por estudantes do curso de serviço social. Esteve no comando do DCE antes da atual gestão. Possui um discurso de crítica ao governo federal e à reitoria.
Chapa 3 ; Transparência, unidade e ação: UnB, novos ares lhe caem bem
N; de membros: 91
Influências partidárias: PCdoB, Democracia Socialista (tendência do PT), PSDB e DEM
Possui a maior discrepância interna por reunir estudantes de diferentes orientações ideológicas. Alguns membros saídos da Aliança pela Liberdade (Chapa 8), de direita, formaram o grupo Tradição Acadêmica Universitária (TAU) e promoveram a união com movimentos estudantis mais antigos e de esquerda, como a União da Juventude Socialista (UJS).
Chapa 4 ; Canto novo
N; de membros: 30
Influências partidárias: PSB
Com um grande número de estreantes no movimento estudantil, possui linha ideológica similar à da Chapa 1. Alguns integrantes participaram da última gestão do DCE.
Chapa 5 ; Mobiliza UnB
N; de membros: 71
Influências partidárias: PSol, PCB e PDT
Base formada por estudantes dos cursos de letras, maior área da UnB, com cerca de 2 mil alunos. Até o ano passado, estava ligada à Chapa 2. Conhecida pela elaboração de análises conjunturais críticas ao governo federal.
Chapa 6 ; DCEntralizar para unificar
N; de membros: 36
Influências partidárias: Partido da Pátria Livre (PPL) e Construindo um Novo Brasil (tendência do PT)
Alinhada nacionalmente à União da Juventude Socialista (UJS), surgiu na disputa deste ano como elemento-surpresa ao se afastar do antigo grupo por divergências políticas. É formada, na maioria, por estudantes independentes, mas com quadros ligados ao antigo Movimento Revolucionário Oito de Outubro (MR-8), atual PPL.
Chapa 7 ; Democracia e ação direta
N; de membros: 25
Influências partidárias: não possui
Apesar de não ter vinculação com partidos políticos, possui membros com orientação política trotskista e anarquista. A base está formada em torno do grupo Oposição CCI ; Combativa, Classista e Independente, que surgiu em 2008 e tem crescido na UnB.
Chapa 8 ; Aliança pela liberdade
N; de membros: 27
Influências partidárias: não possui
Até 2010, os integrantes não podiam ser filiados a partidos. Por esse motivo, pelo menos duas pessoas ligadas ao DEM e ao PSDB deixaram a chapa e acabaram formando a TAU. Da direita conservadora e com a maioria de alunos advindos do curso de direito, a chapa foi criada pouco após a ocupação da reitoria em 2008, depois a formação do grupo União dos Estudantes Independentes (UEI), que faz diversas críticas ao movimento estudantil.