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Famílias comemoram Natal com ou sem tradicionalidades da data

Nas casas das famílias Lemos e Furtado, a noite de hoje será comemorada de maneiras distintas. De um lado, orações, enfeites e comidas natalinas. Do outro, um simples jantar com amigos e ressalvas ao apelo comercial da data

postado em 24/12/2011 10:13

A família Furtado: mesmo seguindo os preceitos da Bíblia, os quatro não são adeptos dos tradicionais festejos de Natal
À meia-noite de hoje, as ruas de Brasília estarão em silêncio. Será noite de Natal. Muitas famílias se reunirão para a celebração, ao redor de mesas fartas e de todos os símbolos que marcam essa época do ano. Outras não se importarão com a data, viverão como em um dia qualquer. Há contrastes entre o tradicional e os diferentes costumes.

Na casa dos Lemos, em Taguatinga Norte, os preparativos começaram há meses, com árvore de Natal, presentes e tudo a que se tem direito. Em 1; de novembro, a residência ganhou luzes pisca-pisca. É uma das poucas na rua enfeitadas. Dezembro é um dos momentos preferidos de todos da família. O casal Márcia, 53 anos, e Raimundo, 67; e as três filhas, Leilane, 22, Larissa, 24, e Ludmila, 26, planejaram a festa em todos os detalhes.

Mais de 20 pessoas devem comparecer à ceia. Haverá amigo-oculto, oração, decoração tradicional, comidas típicas e o principal: muito amor e união. Todo ano, os pais e as irmãs de Márcia, os namorados das filhas, primos e quem mais se dispuser a participar são recebidos no sobrado da família, na QNA. ;Quem não tem onde passar também vem para cá, é bem acolhedor;, disse Márcia.

A maior parte da família é católica. Mas também há evangélicos entre os parentes. Todos convivem em harmonia, inclusive nos momentos de oração. Hoje, os preparativos se iniciam cedo. Nas primeiras horas do dia, os alimentos começariam a ser preparados. Haverá peru, leitoa e até contagem regressiva para a meia-noite. Os Lemos cultivam o hábito de ir à missa, especialmente nesse período. Larissa, Leilane e Ludmila nunca passaram o Natal longe dos familiares.

Desde pequenas, acostumaram-se a ver a casa cheia de gente e de alegria. ;Somos católicos, é uma questão de religião. É também momento de estarmos juntos. Durante o ano, todo mundo tem suas atividades, às vezes não dá tempo de se reunir. É muito especial;, afirmou a filha mais velha, Ludmila. ;É o momento de esquecer tudo mais e pensar na família;, acrescentou Leilane.

A família se reúne várias vezes antes do Natal, para arrumar a árvore, definir o cardápio e muito mais. ;Com o esforço de cada um, fazemos a festa. É muito gostoso. A gente reafirma a importância da família;, explicou Larissa. A grande incentivadora do Natal na casa dos Lemos era a avó paterna Maria Neli. Ela morreu em fevereiro, aos 90 anos. Será o primeiro fim de ano da família sem a matriarca. ;Ela deixou para todos nós a herança de nos unirmos sempre. Ela tinha encanto pelo Natal, mas também juntava todo mundo nos aniversários, batizados e a cada domingo, sempre com a mensagem de festejar o amor;, lembrou Raimundo.

Diferenças
Em outros lares, o Natal é visto como uma data essencialmente comercial. O dia e a noite passam como qualquer outro.

É assim para a família do aposentado Rui Batista Furtado, 58 anos, e da dona de casa Angela Guadalupe Furtado, 52 anos. Moradores da Asa Sul, eles seguem os preceitos da Bíblia e acreditam em Jesus Cristo, mas não se prendem a religiões. ;Nós acreditamos em Jesus, fazemos orações, mas não cremos que ele nasceu em 25 de dezembro;, explicou Rui.

As filhas do casal seguem os mesmos princípios. ;Nós comemoramos o nascimento de Cristo todos os dias. Por conta disso, não há necessidade de haver uma data específica para celebrar;, disse a filha Juliana Furtado Silva, 29 anos, bancária. Os Furtado, porém, aproveitam o feriado do Natal para reunir amigos e familiares. ;Muitos amigos que estão longe da família se sentem tristes e oprimidos nesta data. É tanta propaganda na televisão, só se fala nisso. Então, convidamos a todos para um jantar, mas sem as regras de uma celebração de Natal;, explicou Rui.

Angela é avessa à data. Desde criança, nunca se encantou com o espírito natalino. Para ela, todo o envolvimento desse tempo não passa de uma farsa. ;Natal é sinônimo de compras. Eu sou contra o que o comércio faz na vida das pessoas. Estamos vendo-as adoecerem, com compulsão, por conta de tamanho envolvimento com o crescimento do comércio. Assim, fiquei ainda mais arredia;, relatou Angela.

A dona de casa ressalta que a fé em Deus em nada depende dos hábitos adotados nessa época especial para muita gente. ;O interior das pessoas está oco. Elas fazem caridades uma vez ao ano, o que é uma grande hipocrisia. Presentes não são nada sem afeto. Eu compro lembranças para as pessoas das quais gosto, independente de ser aniversário ou Natal. Podemos fazer um belo jantar em família em qualquer dia. O amor deve ser celebrado sem data marcada;, enfatizou.


Somos católicos, é uma questão de religião. É também momento de estarmos juntos. Durante o ano, todo mundo tem suas atividades, às vezes não dá tempo de se reunir. É muito especial;

Ludmila Lemos, 26 anos


Muitos amigos que estão longe da família se sentem tristes e oprimidos nesta data. É tanta propaganda na televisão, só se fala nisso. Então, convidamos a todos para um jantar, mas sem as regras de uma celebração de Natal;

Rui Furtado, 58 anos

Márcia e Raimundo Lemos: todos os anos, a noite é celebrada como manda o figurino

Origem holandesa

A tradição de comemorar o Natal da maneira como se conhece hoje pode ter começado na Holanda. Nessa região, o costume de fazer festas familiares nessa época do ano se desenvolveu mais cedo e espalhou-se por outros países. A história de Papai Noel tem algumas versões. Um bispo chamado Nicolau, que, entre os séculos 3 e 4 viveu na região onde hoje é a Turquia, gostava de crianças e ajudava as mais pobres. O Dia de São Nicolau foi estabelecido pela Igreja Católica e celebrado junto do nascimento de Jesus. Uma lenda holandesa ajuda a reforçar a existência do bom velhinho. Os Estados Unidos importaram a versão europeia e a imagem se espalhou pelo mundo.

De acordo com o historiador Jaime de Almeida, professor de história da Universidade de Brasília (UnB), a festa de Natal ganhou importância a partir de São Francisco de Assis, com a montagem do presépio, entre os séculos 12 e 13. ;Antes disso, não há qualquer indicação de que era uma festa religiosa além de uma missa. Foi se tornando uma festa de banquete e alegria na Idade Média. Nos países protestantes, ganhou esse formato de Papai Noel e árvore de Natal. Em países católicos, até pouco tempo, era o presépio o símbolo mais importante;, explicou o historiador.

Alimentos típicos, como o peru de Natal e as castanhas nobres, são invenções mais recentes, como explicou Jaime. ;A maior parte da população nórdica era muito pobre. No inverno, eles comiam o que conseguiam preparar antes da neve. Peru é sinal de abastança, de uma sociedade capitalista, da ideia de aristrocacia;, afirmou o professor.

O costume de celebrar o Natal com presentes e árvore chegou a Portugal a partir da primeira guerra mundial, no Vale do Paraíba. Antes disso, celebrava-se o nascimento de Jesus com festas de rua, que entravam pelas portas das casas. Era um momento propício para o surgimento de namoros e noivados. ;Na virada do século 19 para o 20, a neve e o Papai Noel tornaram-se um modelo atrativo para famílias mais abastadas, que davam presentes e faziam comilanças.;

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