postado em 30/12/2011 11:00
O mercado de trabalho do futuro, em Brasília, deve primar pela profissionalização. Em 2022, empresas que abriram as portas nos anos 1960, à época da inauguração da capital federal, terão perdido as características de empreendimentos de pequeno porte ou familiares e estarão mais semelhantes aos grandes grupos e às marcas nacionais. Esses empregadores serão exigentes, e, obedecendo a tendências mundiais, valorizarão os candidatos com iniciativa. O nível do desemprego dependerá das políticas voltadas para o Entorno e da situação fiscal dos próximos governos. Caso o setor público corte gastos e diminua as contratações, a desocupação tenderá a crescer no Distrito Federal. O funcionalismo estará diferente do que é hoje, com demanda cada vez maior dos empregadores por eficiência e resultados.Atualmente, o DF apresenta bons números no que diz respeito às oportunidades de trabalho. Dados da última Pesquisa de Emprego e Desemprego no DF (PED-DF), realizada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), apontaram taxa de desemprego de 11,9% em novembro de 2011, o índice mais baixo registrado em 20 anos. Os segmentos que mais empregam a população são os serviços e a administração pública, sendo que o primeiro, embora tenha maior volume de trabalhadores, é sustentado pelos altos salários do segundo.
Pelo fato de o funcionalismo estar consideravelmente presente em termos de quantidade de pessoas e, mais ainda, de massa salarial, os movimentos de emprego e desemprego locais estão necessariamente atrelados ao que acontece com esse grupo. O economista Júlio Miragaya, diretor de Gestão de Informações da Companhia de Desenvolvimento do Distrito Federal (Codeplan), diz que, por esse motivo, o futuro do emprego no DF dependerá do que acontecerá com a economia internacional e de como a administração brasileira responderá a essa conjuntura. ;Se o crescimento econômico do Brasil se consolidar até 2022 e não sofrer as agruras da crise, o quadro vai levar à redução do desemprego no país. E o governo continuará contratando servidores públicos e melhorando os salários;, acredita.
O sociólogo e analista do Dieese Daniel Biagioni faz avaliação semelhante e frisa que o DF leva vantagem sobre as demais unidades da Federação nesse ponto, já que o funcionalismo leva mais tempo para sentir as turbulências externas do que outros setores da economia. ;Aqui, a taxa de desocupação depende do serviço público, mais seguro e menos flexível a mudanças;, pondera.
Em um cenário positivo para o funcionalismo, o índice de desemprego do DF tende a sair da casa dos dois dígitos e ficar entre 9% e 9,5% na próxima década, aposta Miragaya. Entretanto, ele alerta que a projeção não leva em conta as cidades goianas de Valparaíso, Luziânia, Águas Lindas e outras que compõem o Entorno. Ainda assim, as pesquisas não abrangem essa realidade. ;A taxa de desemprego que temos hoje é uma distorção, pois não inclui a área metropolitana. São municípios que estão em outro estado, mas fazem parte do nosso mercado;, diz Miragaya.
Caso o Entorno passe a ser levado em conta no cálculo do desemprego local, a proporção de desocupados no DF pode saltar para 17,5%. A região tem População Economicamente Ativa (PEA) estimada em 450 mil pessoas e índice de desemprego de 22%, segundo estimativa feita por Miragaya. A Codeplan solicitou ao Ministério do Trabalho a inclusão da área na PED-DF.
Sem opções
O DF sempre foi referência na hora de procurar emprego para Leidiane Pinheiro, 26 anos, moradora de Novo Gama, cidade a 51 quilômetros da capital federal. Atualmente desempregada, ela levantava-se às 4h20 e pegava dois ônibus para chegar ao Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, às 6h40. ;Eu cortava sanduíches para serem servidos por companhias aéreas. Tinham contratado a mim e a meu marido para o período de experiência, que dura três meses. Quando terminou, ficaram só com ele;, conta.
Leidiane, que cursou computação e secretariado, quer voltar ao mercado e não esconde a preferência pelo DF. ;Na minha cidade, além de emprego ser mais difícil, as poucas opções que têm não pagam bem. Oferecem o salário mínimo (R$ 545), sem benefícios;, lamenta. Não é apenas o mercado de trabalho local que é atraente para a jovem. ;A saúde e a educação do DF são melhores.;
A cobradora de ônibus Ana Luiza Ferreira, 26 anos, vive na Cidade Ocidental, a 48km de Brasília, e trabalha para uma firma goiana. Ela sonha com a renda e a estabilidade do setor público. ;Comecei a cursar administração de empresas agora. Quero prestar concursos e nível superior paga melhor;, comenta.
Perfil profissional
Para prevenir os impactos de uma eventual desaceleração no crescimento do emprego público, o DF terá de contar com o desenvolvimento do setor privado. A psicóloga Carmem Cavalcanti, especialista em recursos humanos da Rhaiz Consultoria, ressalta que o fenômeno do avanço do empresariado sobre um território, outrora quase exclusivamente dominado pela estrutura estatal, já é visível, e tende a se consolidar na próxima década. ;Brasília vai crescer muito mais em se tratando do mundo corporativo.;
De acordo com Carmem, atualmente, a cidade é caracterizada por empresas que ainda estão em processo de profissionalização. ;São firmas que nasceram de núcleos familiares nos primórdios da capital. Elas irão mudar esse perfil ou serão adquiridas por grupos maiores. É claro que isso atinge quem está planejando a carreira;, destaca.
A especialista aposta que essa lógica não ficará restrita à iniciativa privada. Para ela, quem quiser fazer parte do serviço público em 2022 terá de ir além dos cursinhos. ;A administração está sendo contaminada pelo privado. A gente tem visto uma ousadia na área pública que tende a crescer. Acredito que o recrutamento por meio de concursos vai se tornar mais voltado para a solução de problemas, questionamento de como o profissional agiria em determinadas situações;, diz.
Para aproveitar as oportunidades que surgirão no DF do futuro, é necessário estar antenado com as tendências de mercado. Morador de Santa Maria, o analista Natanael de Souza Leite, 27 anos, tratou de se capacitar na área de Tecnologia da Informação (TI), uma das mais demandadas em Brasília atualmente. ;Por dica de um amigo, resolvi fazer graduação em sistema de informações. Logo fui contratado como terceirizado na Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária);, conta. Natanael, que atualmente tem renda de R$ 3 mil, planeja continuar investindo no segmento que lhe garantiu o emprego atual. ;Quero fazer mestrado e doutorado.;
Três perguntas para
Carmem Cavalcanti, psicóloga e especialista em recursos humanos
De que forma um possível apagão de mão de obra no DF pode afetar o mercado de trabalho na próxima década?
Já temos esse cenário de apagão em Brasília e trata-se também de um problema nacional. A economia do país vem crescendo de maneira galopante. Deve haver uma desaceleração, mas o Brasil vai continuar se desenvolvendo. O resultado é que, em 10 anos, quem oferecer as melhores condições de remuneração, mais benefícios, conseguirá reter os poucos profissionais disponíveis.
Como resolver esse problema da capacitação?
Acredito que, ao longo da década, terá que acontecer uma virada de jogo. As empresas perceberão que, se não investirem nas pessoas, não terão ganho em resultados, pois a competitividade continuará cada vez maior.
Do ponto de vista do profissional de 2022, o que mais será valorizado pelas empresas no futuro?
A experiência. Segundo um estudo norte-americano, em 2030, 70% da mão de obra na faixa etária de 60 a 70 anos terão emprego disponível. Vamos perceber a presença da maturidade com mais proeminência, os ciclos produtivos se alongarão. Afinal, é uma geração de idosos que terá mais saúde do que os que têm a mesma idade hoje. Não será estranho uma pessoa se aposentar com 80 anos.