Cidades

Após mobilização da comunidade da quadra, árvore permanece na 415 Norte

Luiz Calcagno
postado em 05/01/2012 06:50
Ana Carolina (E) e Roseli colam no pau-de-balsa desenhos feitos pelas crianças que costumam brincar próximo ao local:
Moradores do Bloco G da 415 Norte ganharam a primeira batalha contra a derrubada de uma árvore da espécie do Ochroma pyramidale, mais conhecida como pau-de-balsa. A Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) atestou que o espécime corre o risco de cair. Segundo ele, além de um buraco no caule central, tomado por fungos, a planta está com várias feridas. Mas como a população se mobilizou e pretende, inclusive, entrar na Justiça para garantir que o pau-de-balsa seja tratado e ganhe escoras para permanecer na área verde, a Novacap decidiu fazer uma poda preventiva nos próximos dias e aguardar posicionamento judicial caso a comunidade cumpra a ameaça de buscar o Poder Judiciário.

Na quarta-feira (4), o engenheiro florestal da Novacap Leonardo Rangel esteve no local para esclarecer os moradores sobre a necessidade da remoção. Ele disse ao Correio que a retirada de árvores é a última solução da Novacap. Além disso, Rangel esclareceu não ser possível a aplicação de veneno na planta para interromper o processo de deterioração, já que, por se tratar de uma área pública, a ação poderia intoxicar animais ou pessoas.

;Não queremos ser arbitrários. Vamos podar o espécime e aguardar que eles entrem na Justiça. O Ministério Público já nos deu razão em situações parecidas, inclusive com apoio da polícia. Mas não é o que desejamos. Queremos que os moradores entendam que a árvore está comprometida. Fica ao lado de uma escola e isso inviabiliza a permanência;, disse.

Um besouro que coloca larvas na raiz de árvores foi encontrado ontem pelos técnicos da Novacap: nova ameaça
O engenheiro florestal ressaltou ainda que, por fora, a planta pode parecer saudável, mas que não há como saber o quanto já foi destruída. Além dos fungos, o especialista encontrou ontem um besouro da espécie Euchroma gigantea, que costuma colocar larvas na raiz de árvores de madeira macia, como é o caso do pau-de-balsa. Segundo Rangel, esse é mais um indício de que está condenada. No entanto, ele não confirmou se o espécime está infestado. ;É a primeira vez que vejo esse inseto neste tipo de árvore. É um alerta. Eu entendo a preocupação ambiental das pessoas. Mas não podemos botar a vida da população em risco;, lamentou.

A promotora Kátia Christina Lemos se mostrou favorável à Novacap e elogiou o engajamento da comunidade. Segundo ela, isso mostra que os moradores do DF ;estão criando uma consciência ambiental;. No entanto, ressalta que há um laudo assinado por um especialista. ;O questionamento é importante, mas, em casos como esse, o melhor é retirar e plantar uma árvore do cerrado no lugar. Os moradores têm que exigir isso. Se a Novacap remover uma planta que não é nativa, tem que colocar outras 10 no lugar;, disse.

Proteção
Segundo a geógrafa, consultora ambiental e uma das coordenadoras do Fórum das Organizações Não Governamentais Ambientalistas do DF, Mara Moscoso, a comunidade tem razão em questionar a retirada da árvore. Ela explica, no entanto, que situações como a do pau-de-balsa da 415 Norte são comuns na capital federal e que, em diversos casos, a retirada se faz necessária. ;Na construção de Brasília, a Novacap plantou diversos tipos de árvore de outras regiões brasileiras na área urbana sem um planejamento específico. Com o passar dos anos, essas plantas reflorestadas ficam doentes ou contraem pragas que não são comuns nos locais de origem. O tempo de vida fica menor e é normal que sejam substituídas por exemplares nativos;, explicou.

Os moradores da quadra, por sua vez, permanecem irredutíveis. Não estão convencidos de que o corte é a única solução. A arquiteta Roseli Palissari, 48 anos, acredita que a intenção do governo é expandir a quadra de esportes, que fica ao lado da planta. Ainda assim, ela acredita que o pau-de-balsa tem poucas chances de resistir ao laudo da Novacap. Para Roseli, se tivesse que escolher entre a árvore e a quadra, ficaria com a primeira opção. ;A quadra está malconservada. Eles dizem que plantarão novas árvores, mas, geralmente, ficamos a ver navios. Mas sei que o GDF não vai desqualificar a Novacap. Impedir essa derrubada será quase impossível;, resignou-se.

Uma moradora que preferiu não se identificar ; ela conta ter sofrido uma ameaça de processo por parte de funcionários da Novacap ; disse que procura por biólogos e engenheiros florestais que possam ajudar os moradores a tratar a pau-de-balsa. ;As árvores devem ser mantidas. Brasília precisa delas. Esse espécime abriga vários pássaros e tem um valor sentimental também;, explicou.

As crianças que vivem no bloco também saíram em defesa da planta. Ana Carolina Simonetti, 9 anos, está passando as férias na casa da prima e também se engajou na luta. Depois de passar quase duas semanas brincando próximo à árvore, ela decidiu fazer desenhos para protestar contra o corte. ;Fiz isso para ver se eles acordam. Ela é bonita e ainda faz uma sombra maravilhosa na casa da minha tia;, contou.

[SAIBAMAIS]Maria Eduarda Lacerda, 9 anos, espera que o GDF arrume outra solução para o pau-de-balsa. ;A árvore é viva. Assim como nós, também tem o direito de sobreviver;, reclamou. O irmão dela, Fernando Lacerda, 7, concorda. ;É bonita e dá sombra. Gostaria que eles não cortassem.;

Espécie amazônica

O pau-de-balsa, também conhecido como pau-de-jangada ou pata de lebre, é oriundo da região amazônica. É considerada uma das espécies de crescimento mais rápido do Brasil. Para se ter uma ideia, ela alcança até 7m de altura em apenas dois anos e, em seu habitat, pode alcançar até 30m. O espécime da 415 Sul data da construção de Brasília. Com pouco mais de 50 anos, tem cerca de 10m de altura e um caule com mais 1,5m de diâmetro.

Na lei
O Decreto n; 14.783, de 17 de junho de 1993, regulamenta a poda, o corte e o remanejamento de árvores no Distrito Federal. Qualquer uma dessas ações deve ser feita mediante um laudo produzido por engenheiros florestais. A norma obriga que, a cada corte, a Novacap plante 30 novas mudas caso se trate de uma planta nativa, ou 10 se for um espécime exótico.

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