Cidades

Consumidores insatisfeitos apelam para redes sociais e sites de reclamações

postado em 09/01/2012 07:20
Empresas que não respeitam o consumidor dificilmente ficam impunes na era virtual. Ainda que o cliente aborrecido não vá ao Instituto de Defesa do Consumidor (Procon) registrar queixa nem peça amparo à Justiça, a internet se tornou um meio bastante simples ; e cada vez mais comum ; para dar vazão ao descontentamento e alertar potenciais compradores sobre os riscos do produto ou serviço. Mais prático do que se deslocar, reunir provas ou comparecer em audiências, o ambiente virtual conquista os internautas pela praticidade e preocupa os lojistas e fornecedores, que se veem cada vez mais expostos.

Para evitar a proliferação de burburinhos negativos, as empresas passaram a investir no monitoramento das redes sociais e dos sites de reclamações. Por vezes, as tentativas de contato com o SAC ou e-mail não resolvem. Mas basta postar uma crítica na rede para a resposta chegar praticamente de imediato. Mesmo que não seja a solução do problema, a simples réplica da empresa se torna uma porta de entrada para que a queixa do consumidor seja finalmente encaminhada à ouvidoria.

Marcela, ao lado do marido, Henrique Anes, desabafou na rede social a insatisfação com a empresa de decoração do seu casamento e foi ameaçada de ser processada

Gerson Rolim, diretor da Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (Câmara-e.net), acredita que o curso natural do novo hábito leve à ditadura do consumidor. Para ele, o termo, apesar de ter começado como uma brincadeira, pretende demonstrar o quanto é poderosa a arma que os compradores insatisfeitos têm hoje nas mãos. ;É um dos fatores mais positivos das novas mídias, a possibilidade de interagir de forma transparente, direta e honesta. O brasileiro, particularmente, adora isso. No dia a dia, quem faz o marketing é o consumidor final;, afirma.

Riscos

O diretor acredita que o novo modelo forçará as companhias trabalharem com foco na satisfação dos clientes, o que é determinante para melhorar a qualidade da produção. ;O resultado é bom para os dois lados;, garante. Mas, apesar de o cenário parecer positivo, há detalhes que merecem atenção e passam despercebidos. Poucos dias atrás, a piloto de metrô Marcela Maia de Araújo Anes, 21 anos, por exemplo, temia ser processada pela companhia de decoração e bufê que organizou festa de casamento para ela, em setembro de 2011.

Ela lembra que, mesmo antes de casar, acompanhava uma comunidade de noivas de Brasília. ;É um espaço onde cada noiva conta a própria experiência, lista o que foi bom e o que foi ruim. Os depoimentos acabam servindo para a consulta de outras pessoas. Eu mesma entrava esporadicamente no endereço desde 2009. Algumas empresas também aproveitam para usar o espaço e anunciar promoções;, explica.

Depois que se casou, Marcela incluiu suas impressões sobre os serviços que contratou na comunidade virtual. ;Eu fiquei insatisfeita e disse isso na página. Até mesmo a pessoa que contratei para o cerimonial comprova que eles não fizeram o que eu pedi e o que tinham prometido no contrato.; Além de a empresa ter trocado as flores mais caras por outras mais baratas, alegou que o número de convidados foi maior do que o previsto, deixaram de levar algumas peças decorativas e mudou completamente a forma de tratamento com os noivos, de simpáticos a agressivos. ;Foram muito grosseiros. Me ligaram no dia do casamento para falar de problemas com o buquê, imagine o meu nervosismo. Isso não se faz. Eu não disse que ficou feio, só não foi o que contratei;, completa.

Ameaças

Após o desabafo, ela recebeu uma série de ameaças, postadas pela dona da empresa, dizendo que a levaria para a Justiça por desmoralizar o nome da firma. ;Não sei se eles podem fazer isso. Eu escrevi a minha frustração e falei também de todos os outros fornecedores do meu casamento, como todas as noivas fazem, deixando minhas avaliações;, lamenta Marcela.

A coordenadora institucional da Proteste ; Associação de Consumidores, Maria Inês Dolci, explica que, para evitar problemas como esses, recomenda-se que as pessoas notifiquem os problemas, por escrito, às companhias antes de publicar o comentário na internet. ;Esse simples ato pode evitar o desgaste e a ação judicial. Por outro lado, as empresas devem respeitar o direito de expressão dos consumidores e ter a humildade de reconhecer o que os clientes dizem sobre seus produtos e serviços;, afirma a especialista.

Quando a manifestação é bem fundamentada, as chances de solucionar os problemas são grandes, afinal, a rede não quer danos à imagem ou à reputação. ;Reclamar pela internet é um fenômeno mundial. O problema é que, com isso, algumas pessoas deixam de procurar órgãos legítimos de reclamação. Isso não é bom. O consumidor tem que ter prova do que reclama e evitar usar termos pejorativos contra a reclamada para não perder seu direito;, acrescenta Maria Inês.

Queixas são fontes de consulta

Apesar dos problemas pontuais para quem reclama na internet, o sucesso da web na solução de pendências nas relações de consumo fica estampado em outros milhares de casos que somente são resolvidos após serem expostos na rede. Para o diretor do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), José Geraldo Tardin, o benefício ultrapassa o contentamento individual de quem se vê atendido. Afinal, todos os textos ficam armazenados e podem servir como fonte para consultas futuras por outras pessoas.

Apenas na página Reclame Aqui, a mais popular com esse objetivo da internet, são feitas mais de 7 mil registros novos por dia, ao mesmo tempo em que são realizadas 500 mil pesquisas. ;Fazer esse tipo de busca hoje ajuda muito no momento da compra. Todas as empresas recebem reclamações, mas é possível observar quem atende, quem resolve mais rápido. Alguns carros importados, por exemplo, simplesmente não têm peças para reposição no Brasil. As pessoas compartilham essas informações e quem está interessado no carro passa a pesar esse argumento;, explica.

Preservar a imagem
Para a gerente de relacionamento do Idec, Karina Alfano, há outro detalhe que merece atenção: a agilidade em atender os clientes devido ao interesse exclusivo em preservar a imagem da companhia. ;Quando o SAC, que deveria resolver as situações de conflito em até 5 dias, não consegue, mas o mesmo caso é resolvido quase que imediatamente após ser citado nas redes sociais, podemos entender que há uma postura discriminatória da empresa. Como justificar que elas dão mais atenção a um canal que a outro?", diz. Para Karina, essa é uma prova de que algumas redes só se preocupam com o marketing, sem valorizar os direitos do consumidor, e isso também deve ser levado em conta na hora da compra. ;Além disso, é preciso ter consciência de que a reclamação em órgãos oficiais faz a diferença. É assim que se reforça a fiscalização e que o governo pode se aprofundar nas questões que envolvem conflitos nas relações de consumo;, complementa.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação