Roberta Machado
postado em 13/01/2012 08:00
A típica indecisão que precede cada carnaval brasiliense, desta vez, colocou em cheque o lugar da festa popular. Depois de sete anos de realização em Ceilândia, cogita-se o retorno do desfile das escolas de samba para o Plano Piloto. A pouco mais de um mês da comemoração, a mudança ainda é debatida dentro do governo e por carnavalescos, que estão divididos. Enquanto as agremiações de regiões vizinhas ao Ceilambódromo defendem a permanência da avenida onde está, representantes de cidades ao norte do DF apoiam a volta do antigo Caldeirão da Folia, ao lado da Torre de TV.
A Secretaria de Cultura e o Governo do Distrito Federal (GDF) não confirmam nem negam a mudança. A decisão cabe ao governador Agnelo Queiroz, que retorna do recesso na próxima segunda-feira. ;A Secretaria de Cultura nos apresentou uma planta da arquibancada para a Torre de TV, para mim já estava definido. Mas disseram que não está mais. Agora, estamos tratando dos repasses;, esclareceu o presidente da União das Escolas de Samba e Blocos de Enredo de Brasília (Uniesbe), Geomar Leite.
Segundo o representante da Uniesbe, a mudança de endereço foi um pedido das próprias agremiações. Algumas das escolas de samba reclamam da falta de estrutura e da localização do Ceilambódromo, local que não conta com nenhuma preparação permanente para a festa anual. Todos os anos, o governo monta as arquibancadas da passarela do samba no terreno vazio. No ano passado, as estruturas do desfile, do Granfolia e das comemorações do Parque da Cidade e de Taguatinga custaram aos cofres do DF mais de R$ 4 milhões.
No papel
Em 2005, o arquiteto Oscar Niemeyer divulgou o projeto de um Sambódromo para Brasília, semelhante ao Marquês de Sapucaí carioca. Em 2006, o então governador Joaquim Roriz sancionou a lei que autorizava o projeto, mas ele nunca saiu do papel. Sem sede própria para a festa de Momo, os desfiles já foram realizados na Rodoviária, na Avenida W3 Sul, no Ginásio Nilson Nelson, no Eixão e até mesmo no Autódromo. ;Se fosse para sair de Ceilândia, seria melhor que fosse para um lugar onde fosse construído o sambódromo e a cidade do samba. As escolas clamam pelos terrenos;, ponderou Geomar.
Outro motivo da hesitação em deixar o lugar atual é a disputa entre as escolas de samba com sede próxima ao Ceilambódromo e as que precisam percorrer uma distância maior para chegar ao desfile. ;Consideramos que o carnaval é a festa do povo, e deve ser realizado no centro da cidade como em qualquer lugar do Brasil. Se a mudança se confirmar, é uma grande notícia;, avaliou o presidente da Associação Recreativa Unidos do Cruzeiro (ARUC), Moacyr Oliveira.
A festa realizada em Ceilândia atrai cerca de 60 mil foliões por dia. Para algumas agremiações, porém, esse não é um grupo igualitário. Eles afirmam que o público do Ceilambódromo se resume aos moradores da região. ;Hoje, temos dificuldades para escolas de Sobradinho e Planaltina, por exemplo, levarem os carros alegóricos para Ceilândia;, reclamou Alberto Alves Júnior, diretor da Acadêmicos da Asa Norte. Para ele, a mudança é bem-vinda, desde que o padrão da comemoração seja superior ao dos últimos anos. ;Entendemos que tem de haver mais investimentos de estrutura, segurança e apoio logístico.;
A Águia Imperial de Ceilândia, porém, defende a permanência da festa popular na sua cidade sede. ;A gente tem certeza que, se mudar, será ruim para o Carnaval. No Plano Piloto, ele estava morto. O público aqui é de 60 mil, lá é de 12 mil. A comunidade de Ceilândia abraçou o carnaval;, justificou Ronieri Rezende, presidente da escola. Ele também admite que há interesse da escola em manter o apoio da comunidade local dos desfiles, sentimento que é partilhado por outras agremiações. ;Eles preferem lá porque está mais próximo do povão. Meu medo é que seja uma decepção em termos de público. Os moradores do Plano Piloto não vão ver carnaval;, opinou Vicente Bezerra, presidente da Dragões de Samambaia.
Memória
Festa sem planejamento
Em 2011, o Governo do Distrito Federal e as escolas de samba discutiram o orçamento do carnaval de Brasília até o último minuto. Por meses, as agremiações, endividadas com os fornecedores, trabalharam baseadas em promessas de um governo que já não estava mais no poder. Enquanto as escolas pediam mais de R$ 3 milhões somente para a festa do Ceilambódromo, o orçamento para o carnaval do ano passado estipulado pela Câmara Legislativa era de R$ 1 milhão. Na última hora, o Executivo destinou quase mais de R$ 8 milhões e elevou para cerca de R$ 10 milhões o orçamento da festa de Momo. Porém, a poucas horas do início das festividades, o alvará de funcionamento do sambódromo brasiliense ainda não havia sido liberado pela Defesa Civil do DF. Durante a vistoria, os agentes encontraram irregularidades na fixação de cordas de aço e madeiras das arquibancadas, que ofereciam insegurança ao público. A avenida do samba foi liberada apenas quatro horas antes do início da programação.