postado em 22/07/2012 08:03
O economista Júlio Miragaya, carioca de 54 anos, virou referência entre os que estudam a economia de Brasília. Há quase duas décadas, ele se debruça sobre a estrutura produtiva da capital do país. Nesse período, perdeu a conta de quantas vezes liderou estudos, palestras e debates sobre a necessidade de a cidade depender menos do setor público e, como todos os outros centros urbanos, apostar na industrialização de seus arredores. Deixou isso claro, inclusive, quando coordenou, em 2010, o programa econômico da campanha do então candidato Agnelo Queiroz (PT).
Com a divulgação dos dados preliminares do PIB local de 2011, no fim de junho, e a confirmação de mais um crescimento abaixo da média nacional, a preocupação aumentou. ;Não dá mais. Se a composição do PIB não mudar, com maior participação do setor privado, o desempenho global da cidade estará seriamente comprometido;, alerta Miragaya, cotado para assumir a presidência da Companhia de Planejamento (Codeplan), onde atualmente é diretor. Ele também preside o Instituto Brasiliense de Estudos da Economia Regional (Ibrase), além de coordenar a Comissão de Política Econômica e de Desenvolvimento Regional do Conselho Federal de Economia.
O que o leva a crer que a economia de Brasília pode estar "virando a curva"?
O relativo esgotamento do setor público em continuar a funcionar como elemento motriz de nossa economia e os avanços que os demais estados têm tido na atração de grandes investimentos industriais.
Ter a maior renda per capita do país e um mercado consumidor pujante não garantem a tranquilidade da economia local?
De forma alguma. O maior PIB per capita ; R$ 61.584 em 2011, contra R$ 21.483 da média nacional ; precisa servir de trunfo para atrair investimentos nos setores industrial e privado, e não como fator de acomodação. Precisamos criar empregos para absorver a crescente população na área metropolitana.
Se o DF continuar tão dependente do serviço público, quais serão as consequências?
A persistência do atual modelo levará a uma baixa criação de empregos, em particular para a população de mais baixa renda, e agravar ainda mais a situação do desemprego. O DF já possui a segunda maior taxa de desocupados (13%) entre as sete áreas metropolitanas pesquisadas mensalmente. Outro reflexo será o agravamento da desigualdade social. A relação é direta: enquanto no Lago Sul (localidade com maior renda domiciliar média mensal), 30% das pessoas trabalham na administração pública, na Estrutural e em Itapoã, regiões mais pobres do DF, esse percentual não chega a 3%.
Por que o processo de desenvolvimento industrial na região metropolitana do DF não emplacou?
Porque alguns gargalos ainda persistem, e os principais envolvem infraestrutura e logística. Isso inibe a vinda de grandes empreendimentos. Precisamos avançar com a criação do PAC-DF e Entorno, compreendendo a viabilização de projetos estruturantes na área de transportes e de energia, capazes de transformar a base produtiva regional.
Qual é a necessidade mais urgente?
Justamente apostar em grandes investimentos em infraestrutura, realizados em articulação com as prefeituras da área metropolitana e com os governos de Goiás e federal. Só assim vamos atrair investimentos industriais e serviços privados e diversificar nossa estrutura produtiva. Vale lembrar que a mudança não vai ocorrer em curto prazo: devemos começar já para colher os frutos em 10 ou 15 anos.
Os governos do DF se acomodaram com o perfil político-administrativo da economia?
A acomodação é de toda a sociedade brasiliense. Brasília se considera deitada eternamente em berço esplêndido, em alusão à dependência do setor público, e considera que tal situação é imutável. O Fundo Constitucional do DF, somado às demais transferências legais e voluntárias, representa metade de nosso orçamento. A força dos salários do funcionalismo nos dão uma renda média elevada e um orçamento parrudo, mas não garantem a criação de empregos que necessitamos e tampouco permite uma boa qualidade de renda e de vida à maioria da população brasiliense.