Cidades

Morador de rua que encontrou universitário também estava desaparecido

Adeílson Mota de Carvalho, 37 anos, saiu de casa em março, um mês após fazer contato com a família e, depois disso, nunca mais deu notícia

Renato Alves
postado em 23/08/2013 15:37

A família de Felipe levou Adeílson para uma clínica de reabilitação para dependentes químicos

O morador de rua Adeílson Mota de Carvalho, 37 anos, que encontrou o universitário Felipe Dourado Paiva, 22 anos, nessa quinta-feira (22/8), também estava desaparecido. Os parentes não o viam havia cinco meses. Ele saiu de casa em março, um mês após fazer contato com a família e, depois disso, nunca mais deu notícia. Mas, com o desfecho do caso do aluno do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), que ocupou o noticiário de veículos de comunicação de todo o país, os familiares do sem-teto souberam do paradeiro dele.

A reportagem do Correio Braziliense conversou com a mãe de Adeílson por telefone nesta sexta-feira (23/8). Ela contou que o filho é dependente químico e a família mora em Redenção, no Pará. Já a ex-mulher do morador de rua, reside em São Paulo, com os dois filhos dela com Adeílson.

[SAIBAMAIS] Repórteres do Correio já contaram a Adeílson sobre a conversa com a mãe dele. O sem-teto está em clínica de reabilitação, para onde foi levado pela família de Felipe Dourado. A clínica fica na Cidade Ocidental (GO), no Entorno do DF. Os parentes do rapaz, que ficou duas semanas desaparecido, se comprometeram a ajudar o sem-teto em tudo o que for possível.

Reencontro

Adeílson caminhava em direção à Água Mineral, por volta das 11h de quinta-feira, quando parou para pedir informação a uma pessoa dentro de uma caixa de papelão, sob uma mangueira e uma jaqueira, em um canteiro em frente a Rodoferroviária, a cerca de 100m de um posto de Segurança Comunitário da Polícia Militar. O estranho disse que não poderia sair da caixa porque estava dormindo. Mandou Adeílson voltar mais tarde. O morador de rua seguiu caminho até a Água Mineral. ;Mas fiquei encasquetado e, na volta, fui ver quem era a pessoa que dormia dentro de uma caixa de apelão fechada;, contou.



Ao reencontrar o estranho no mesmo local, por volta das 14h, Adeílson suspeitou que o jovem era o mesmo dos cartazes de desaparecido que havia visto em alguns pontos da cidade. ;Perguntei se ele tinha almoçado. Ele falou que não. Então, falei que ia comprar marmita para nós dois;, lembrou. O rapaz, porém recusou a oferta. Para contê-lo, o morador de rua disse que iria comprar doce para ambos e pediu que ele permanecesse ali. Adeílson caminhou um pouco e avisou a instrutores de motoescola, que dão aulas práticas no estacionamento da Rodoferroviária, para ficarem de olho no jovem.

Não satisfeito, Adeílson andou mais um pouco, até a feira popular próxima. Lá, encontrou um cartaz de desaparecido fixado pela família de Felipe. Ao conferir a foto, não teve mais dúvida. Comprou doces e voltou para debaixo das árvores. ;Ele já não estava lá. Procurei em volta e vi ele em cima da jaqueira;, comentou o morador de rua. Naquele momento, um grupo de instrutores fazia uma espécie de cerco ao rapaz. O jovem reclamou com Adeílson. Disse que ele o havia ;dedurado;. Para acalmá-lo, Adeílson inventou que as pessoas próximas suspeitavam que ambos estavam de olho nos veículos deles.

Adeílson Mota de Carvalho, 37 anos, saiu de casa em março, um mês após fazer contato com a família e, depois disso, nunca mais deu notícia

Para ganhar a confiança de Felipe, Adeílson subiu na árvore e começou a conversar. Em certo momento, o chamou de Felipe e perguntou-lhe porque havia saído de casa. O jovem reagiu negativamente. Respondeu que se chamava Henrique Prado. Certo da identidade do rapaz, Adeílson usou a desculpa de conseguir um cigarro e foi ao posto comunitário da PM. Pediu a um policial para telefonar à mãe de Felipe, pois o havia encontrado, mas pediu aos soldados para não irem até a árvore, por medo do jovem fugir. Os PMs o atenderam, ligaram para a mulher mas ficaram de olho em Felipe.

Em menos de 10 minutos, um primo e a irmã de Felipe, Priscila Dourado, 26 anos, chegaram ao local. ;Ao ver o irmão, a menina começou a chorar e a tremer. Até chorei junto;, relatou. Priscila nada falou ao irmão. Apenas o abraçou. Felipe pediu para ir para casa. Mas os parentes o levaram ao Hospital Regional do Guará (HRGu). Vestia a mesma roupa com a qual desapareceu. A família pediu que não fosse divulgado detalhes sobre o estado de saúde do jovem. Ele deixou o hospital por volta das 18h30, e foi levado para a casa de parentes.

Reconhecimento

No início da noite de quinta-feira, em casa, Priscila recebia parentes e amigos. ;Quando o vi, nossa; só queria abraçá-lo, levá-lo para casa e cuidar dele;, ressaltou ela. Nesse momento, o professor aposentado Ulde Dourado, tio de Felipe, estacionou o carro. Nele, estavam Adeílson e algumas sacolas de compras. ;Vamos levá-lo para tomar um banho e fazer um lanche. A família já o adotou e vai fazer de tudo para tirá-lo das ruas. Se hoje vamos dormir em paz, devemos isso a ele;, comentou Dourado.

De poucas palavras, Adeílson disse apenas que não sabia o que ia acontecer com ele. Maranhense, o ex-marceneiro chegou em Brasília há dois meses. Desempregado, veio em busca de uma vida melhor. Deixou os dois filhos, Pedro Henrique, 8 e João Paulo, 6 anos, no Pará. Na capital, sobrevive dos trocados que ganha descarregando caminhões na Ceasa.

Mobilização

Felipe havia sido visto por amigos e parentes pela última vez em seu primeiro dia de aula no UniCeub, há duas semanas. Câmeras de segurança da universidade filmaram o estudante deixando o pátio da instituição de ensino. Na época, o advogado da família informou que ele sofre de transtornos psicológicos e usa remédios controlados. Sem os medicamentos, poderia ficar desorientado. Desde então, a família de Felipe distribuiu, por todo o DF, milhares de cartazes com fotos, dados do estudante e telefones de contatos. No fim de semana, fez um mutirão de buscas pela capital. Houve intensa mobilização nas redes sociais. Após diversas pistas falsas, ontem de manhã surgiu a mais forte de todas.

Francisca Vanusa Lopes da Costa, 37, reconheceu Felipe por volta das 10h30, quando ele andava pela Quadra 8 do Cruzeiro Velho, onde ela mora. A dona de casa correu atrás do jovem e chegou a chamá-lo pelo nome. ;Perguntei se ele era o rapaz desaparecido. Ele respondeu: ;Será?; e foi embora;, relatou. A mulher pediu ajuda a um vizinho, que, de moto, começou a procurar o jovem pelo bairro, sem sucesso. Sabendo disso, familiares do garoto seguiram para o Cruzeiro. Também o procuraram no Sudoeste. Mas ninguém seguiu para a Rodoferroviária, onde, àquela altura, Adeílson tinha ajudado a escrever o final feliz.

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