Adriana Bernardes
postado em 22/04/2014 06:00
;Dificuldade em expressar sentimentos e emoções.; A frase escrita numa folha de papel em branco tem apenas 41 letras e representa a tentativa de um adolescente de 14 anos de explicar à mãe, Laura*, o porquê de ele cortar os próprios braços. As palavras do garoto não aplacaram a angústia dela, mas deram a dimensão da tristeza do menino e serviram para Laura buscar ajuda especializada. Esse é mais um entre tantos casos de cutting, patologia que afeta um em cada cinco jovens no mundo, segundo pesquisas americanas, europeias e japonesas.
O rascunho foi deixado por ele em cima da bancada da cozinha de casa. Somente após chegar do trabalho, Laura leu as palavras do filho. Isso foi há três semanas, quando ela estranhou as blusas de manga longa e, por um descuido dele, viu as marcas nos braços. ;Nas primeiras vezes, ele deu uma desculpa qualquer; que tinha se arranhado acidentalmente. Mas eu percebi que os ferimentos persistiam. Nós sentamos para conversar e ele não conseguia falar;, lembra. Laura desconfia que a dor psicológica do filho se deve a dois fatores. ;O pai é alcoólatra e sofremos muito com isso. Eu tive câncer há dois anos, fiz uma cirurgia e agora monitoro a doença. Eu sei que a minha saúde o preocupa demais. Acho que é isso o motivo de tanta angústia;, diz, com um fio de voz. Quem conhece a família relata que o garoto é louco pela mãe.
O cutting é tema de reportagem no Correio, desde domingo, com grande repercussão nas redes sociais. A divulgação de que grupos de estudantes de, pelo menos, duas escolas da região norte do DF praticam a automutilação gerou reações de espanto. Alguns leitores consideram um modismo. Outros alertam para a gravidade da doença. Houve quem relatasse enfrentar a situação dentro de casa e até quem oferecesse ajuda para enfrentar o problema.
Os relatos que praticantes de cutting fizeram ao Correio revelam que o distúrbio pode ter diferentes causas: depressão, dificuldade de relacionamento com a família, término de namoro, bullying e dificuldade de se aceitar. No caso da estudante de biomedicina Águida Maiara, 23, o bullying desencadeou a autoflagelação e ela acabou descobrindo que era depressiva e sofria de síndrome do pânico. Ela conta que o problema teve início na faculdade. ;O professor dizia para a turma que não dava aula para burros, e eu tomava as dores para mim. No auge, cogitei seriamente me matar. Se não fosse pelo apoio dos meus pais, não estaria mais aqui;, afirma. Ao relembrar a história, ela quase não contém as lágrimas.
Ao saber dos registros em escolas públicas do DF, o secretário de Educação anunciou que, em parceria com a Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan), vai fazer uma pesquisa para descobrir se o problema ocorre em outras instituições do DF. Mesmo não fazendo parte do rol de atendimentos da pasta, a subsecretária de Proteção às Vítimas de Violência (Pró-vítima), Valéria de Velasco, já realizou uma reunião na primeira escola que detectou o problema e elabora uma oficina específica para os estudantes praticantes de cutting. ;É só o começo. Precisamos tirar esses jovens dessa situação. Alguma coisa está fora do lugar com eles;, defende Valéria.
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