No dia do casamento, Alessandra Lustosa estava de blusa social e gravata vermelha. Sua mulher, Yglessyanne Lustosa, de vestido branco com detalhes em renda e saia com camadas sobrepostas. A cerimônia ocorreu em um cartório de Taguatinga, com direito a marcha nupcial e bolo com bonecas no topo representando as noivas. ;Éramos o único casal do mesmo sexo no cartório naquele dia, e ela era a noiva mais bonita;, conta Alessandra.
O casamento das duas foi um dos 130 que ocorreram no DF, desde maio de 2013, quando a união homoafetiva passou a ser permitida no país. O levantamento foi feito pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg-Br) com dados dos 12 cartórios de Registro Civil do DF. Nesta quarta-feira (14/5), a Resolução 175 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que permitiu o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, completa um ano.
;Para mim, é uma conquista muito grande dos nossos direitos. A sociedade acha que nosso relacionamento é errado, a Igreja acha que é pecado. Se a gente pode trabalhar, se paga impostos, por que não pode ter esse direito como qualquer outra pessoa?;, questiona Alessandra.
Ela relata que as duas já moravam juntas há seis meses, mas que foi o casamento que tornou a relação pública. ;Trabalho há 14 anos na mesma empresa, todo mundo suspeitava, mas não tinha certeza, até eu me casar com a Yglessyanne. Graças a Deus, todos aceitaram numa boa;, diz Alessandra, que é supervisora comercial. Elas planejam ter um filho.
A possibilidade de ter um bebê também foi um dos motivos do casamento de Milena Ganzelevitch. Ela mora com a mulher, que pediu para não ser identificada, há 12 anos. As duas casaram-se no dia 31 de março deste ano e, em breve, terão um novo membro na família. Milena está grávida de 8 meses de Maria Luísa, nome escolhido em homenagem à avó materna. ;O que muda agora é a questão social. Para a sociedade, somos legalmente casadas;, diz. ;O casamento mesmo foi muito rapidinho, não deu tempo para organizar festa. No cartório, não tivemos problema nenhum de preconceito, só os olhares curiosos das pessoas que estavam ali;.
Os números divulgados pela Anoreg-Br correspondem ao total de casamentos realizados até essa terça-feira (13/5). No DF, o mês de maior procura foi maio de 2013, quando a resolução passou a vigorar. Ocorreram, então, 18 casamentos homoafetivos. Os demais meses registraram, no mínimo, seis casamentos.
A entidade diz que pretende fazer um levantamento nacional. Em março, a Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Estado de São Paulo (Arpen-SP) divulgou levantamento semelhante. Foram 701 uniões homossexuais realizadas em 58 cartórios da capital paulista.
Para o presidente da Anoreg-Br, Rogério Portugal Bacellar, a resolução do CNJ agiliza o processo do casamento e garante a cidadania, uma vez que passa para os cartórios algumas incumbências que eram restritas ao Judiciário. ;Há um ano, os casais homoafetivos, com a resolução, foram equiparados a qualquer outro casal formado por um homem e uma mulher. Com isso, acabou a discriminação.;
Ele também explica que união estável e o casamento civil garantem os mesmos direitos sobre os bens. A diferença é o status civil. Em uma união estável, não é possível mudar o status de solteiro para casado.
Para o servidor público Rodrigo Rodrigues, isso faz muita diferença. ;O casamento não é só um ato de amor entre duas pessoas, estarmos casados vira também um ato político;, diz Rodrigues, que é casado com o também servidor público Thiago Rodrigues desde setembro do ano passado. ;Quando as pessoas falam que ele é meu companheiro, eu corrijo: É meu marido.;