postado em 18/05/2014 15:34
Quem nunca abriu um pacote de figurinhas e esperou por aquela que finalmente iria completar o álbum, não sabe descrever a emoção. Esse é o sentimento de todo colecionador, novo ou antigo, que trabalha para completar o álbum de figurinhas da Copa do Mundo do Brasil. E dá trabalho mesmo. Já não é possível contar os pontos de troca que se formaram em várias cidades desde que o álbum foi lançado em 4 de abril pela Panini, editora que detém os direitos exclusivos de produzir e vender o álbum oficial da Copa
A empresa não divulga as metas de venda, tiragem ou faturamento, mas informa que realizou investimentos superiores a R$ 2,5 milhões para ampliar a capacidade produtiva da fábrica no Brasil e distribuiu, inicialmente, 8,5 milhões de exemplares em todo o país, com previsão de reimpressão. O álbum também foi lançado em mais de 110 países.
Segundo a Panini, as peças principais dessa cadeia são as bancas de jornais, que correspondem a 94% das vendas dos livros ilustrados e das figurinhas. São nesses locais que os colecionadores interagirem e trocam os cromos repetidos.
No Distrito Federal, um dos pontos que ficam lotados aos finais de semana é a Banca Magazine, em Águas Claras, a cerca de 20 quilômetros da área central de Brasília. Lá, é possível encontrar o capitão reformado do Exército, Nei da Silva Faria, conhecido como seu Nei. O militar, de 66 anos, frequenta a banca todos os domingos, desde 2006, e organizou ali um ponto fixo de troca de figurinhas. Seu Nei, torcedor do Bangu, do Rio de Janeiro, não tem preferência por tema. ;Independente de Copa, estou aqui. Os álbuns são variados, do tema que me agradar. Tem do Campeonato Brasileiro, tenho o do Rio, que é para crianças, do Harry Potter, tenho de princesas, que troco com as meninas. Mas essa movimentação aumenta muito mesmo na Copa do Mundo;, disse ele, contando que já tem três álbuns completos do Mundial e está terminando o quarto.
Seu Nei explica ainda que ajuda as pessoas a completarem seus álbuns. Ele anota numa caderneta o nome delas e quantas figuras cada uma precisa para completar o livro e, assim, cruza as informações. ;É gostosa a satisfação de saber que a pessoa completou o álbum."
Ali, ao lado do militar, Mayara Barros, de 11 anos, também troca seus cromos, supervisionada pelo pai, que cuida pessoalmente da figurinha com a estampa do jogador Neymar Jr. A menina conta que seu primeiro álbum foi o da Copa de 2010 e que só coleciona mesmo as figurinhas do Mundial. ;É bom trocar, você conhece pessoas novas, e serve para guardar de recordação. Meu pai também falou que se completar tudo, guardar e depois vender, fico milionária;, projeta Mayara, dizendo que, em 2010, a maioria dos colecionadores era formada por meninos e que, este ano, há várias meninas para trocar em sua sala de aula.
A Panini aproveita essa grande aceitação para criar uma nova geração de colecionadores. ;Será algo inesquecível para essa geração e também para os adultos que viveram isso um dia. Afinal, depois de 64 anos, a Copa volta para o Brasil e nada melhor para recordar do que assistir aos jogos e completar o álbum de figurinhas;, informa a editora, em nota.
Na capital paulista, um dos pontos de trocas é o Vão-Livre do Museu de Arte de São Paulo (Masp). Aos sábados e domingos, é possível encontrar colecionadores ao longo dos dias dispostos a completar o álbum de figurinhas. Adultos, crianças, idosos, homens, mulheres, o público é heterogêneo. ;É um público bem diverso e ajuda a integrar as pessoas. É diferente do que a gente costuma ter normalmente;, disse a analista financeiro Eliane Azevedo, que tem um álbum junto com o filho Matheus, de 13 anos. Ela destaca que um dos valores positivos estimulados pelo troca-troca é a solidariedade. ;As pessoas ajudam umas as outras, mesmo que tenham que ficar com uma figurinha repetida. Isso é muito bacana.;
A mãe de João Victor, de 9 anos, Cristiane Shiraishi, também acha que o movimento trouxe mais desenvoltura ao filho. ;Ele é muito introvertido. Aqui, ele tem que chegar, conversar e isso ajudou bastante;, avaliou, ao destacar como positivo o fato de o menino deixar o computador para interagir com outras crianças. No álbum do João Victor ainda faltam mais de 100 espaços em branco para ter toda a escalação das seleções mundiais.
A psicóloga e professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Ilana Pinsky destaca o uso pedagógico dos álbuns de figurinha. ;Os meus filhos ensinam para mim coisas que eu não conhecia. As escolas tinham que usar isso muito mais do que usam, é uma maneira muito interessante de ensinar várias matérias para eles, inclusive geografia. Por meio desse interesse pelo álbum, os meus filhos conhecem não só diversos países e suas capitais, mas também cidades específicas, porque sabem de onde cada jogador veio.;
Ela ressalta ainda que as trocas de figurinhas acabaram incentivando as crianças a ser afastar por um tempo dos eletrônicos. ;Eu também tenho percebido, como mãe e como psicóloga clínica, que as crianças têm se interessado de fato em tal nível que têm deixado de lado, mesmo que momentaneamente, seus aparelhos [eletrônicos], o que é uma delícia. Eles estão usando os mesmos tipos de brincadeiras ; essa coisa de virar figurinha ; que eu brincava e que, às vezes, até nossos pais brincavam. Então tem sido um momento muito gostoso e eu acho extremamente positivo."