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Último texto de Vera para o Correio Braziliense falava sobre o Aeroporto JK

"Voltei pensando na alegria do meu amigo Juscelino, se pudesse imaginar que, um dia, aquele aeroporto extraordinariamente belo teria o seu nome", disse Vera



Um dos últimos textos escritos pela pioneira Vera Brant para o Correio Braziliense tratava do Aeroporto JK, que havia sido reformardo. "Voltei pensando na alegria do meu amigo Juscelino, se pudesse imaginar que, um dia, aquele aeroporto extraordinariamente belo teria o seu nome", disse Vera.

Confira na íntegra o último texto de Vera para o Correio.


Aeroporto JK

; Vera Brant

Estive visitando o Aeroporto JK, devidamente reformado. Majestoso! Imenso! Todo envidraçado, permitindo a visão da cidade e do céu exageradamente lindo.

Voltei pensando na alegria do meu amigo Juscelino, se pudesse imaginar que, um dia, aquele aeroporto extraordinariamente belo teria o seu nome.

Lembrei-me daquela última vez em que fui lá com o Carlos Murilo, levar JK para uma viagem que faria a Belo Horizonte, para o enterro do amigo Geraldo Vasconcelos. Foi em agosto de 1976, poucos dias antes de sua morte.

Houve o boato da morte, num acidente na estrada São Paulo-Rio; e eu pedi aos jornalistas que me ligavam para dar a notícia que não a levassem ao rádio nem à televisão, eu tinha certeza de que o Juscelino estava na fazendinha, ia confirmar e ligar para eles.

Confirmei e fui para lá, com o Jofre Lellis.

Já era mais de meia-noite, foram todos dormir e ficamos, Déa, Juscelino e eu, na varanda. Ele me perguntou: ;O que você acha que aconteceu para espalharem esse boato de forma tão violenta?;.

Eu respondi: ;Quer saber, mesmo o que eu penso? Acho que fizeram um teste para verificar se haveria uma comoção no país se matassem você. Não houve porque eu não deixei que a notícia fosse para as rádios e as televisões. O pior de tudo é que eles vão pensar que ninguém se incomodou e, não sei não, estou preocupada;. Ele, talvez para me tranquilizar: ;Eu hoje estou convencido que serei muito mais útil ao meu país morto, do que vivo. Comigo vivo, eles não vão abrir nem uma fresta;.

Quinze dias depois, ele morreu na estrada São Paulo-Rio. No carro em que o Juscelino morreu, foi encontrado um diário que passou por diversas mãos, até chegar às mãos da Sarah. Pelas anotações, dá para sentir o seu estado de espírito, dias antes de ser assassinado, em 22 de agosto de 1976. Em determinado trecho, ele escreveu:

;14.8.76 ; Sábado. Vou às 7,30 para o aeroporto. Sigo para Brasília. De lá, para a fazenda. Até quando? Viajo com o Colassuono. Obriga-me, quando chegamos a Brasília, ir à sua casa para conhecer os filhos e a esposa. Estive lá alguns momentos, tomamos café. Déa e Carlos Murilo comigo. Seguimos para a inauguração de meu escritório novo no Edifício Oscar Niemeyer, 10; andar. Modesto, porém, simpático. Fico imaginando as voltas que o mundo dá. Ontem, nos palácios de Brasília por mim construídos. Hoje, num modesto escritório.

Descemos para o 3; andar, onde Vera Brant está instalada. Aperitivos com os convidados que trouxe de São Paulo ; dois engenheiros austríacos e senhoras, e o Rosauro. Viemos todos para a casa do Carlos Murilo e almoçamos. Oramos na Ermida, ao crepúsculo. Jantamos. No momento do jantar, chegaram Aloísio [engenheiro diretor da CEB], Dr. Areno e mais cinco pessoas. Ao todo, 13 na mesa.

Uma hora da manhã, na cama.

15.8.76 ; Domingo. Pela manhã, passeamos pela fazenda. Às dez horas, os austríacos regressaram. Arrumei as coisas. Preciso passar uns dias fora da fazenda.

16.8.76 ; Fui com o Prates para Brasília, direto para o meu novo escritório, que hoje inauguro, no Ed. Oscar Niemeyer. Muito bom. Duas salas amplas e duas instalações. No primeiro dia, já recebi, sem parar, várias pessoas. Um grupo de estudantes de Bauru, que me convidou para fazer uma conferência na escola de direito daquela cidade. Um representante do Imex que me quer vender os bois alemães, Fleshwick (aconselhado pelo Renato Costa Lima), Rosauro, duas moças. Às 13,30 fui almoçar. Voltei, trabalhei até as 18 horas.

18.8.76 ; Passei pelo escritório da Vera (Brant). Saímos, juntos, para a novela na casa do Carlos Murilo. Olavo Drummond veio jantar conosco. Às 11 horas fomos levá-lo. Entramos no scoth bar do hotel, no último andar. Vista linda sobre Brasília. Tomamos uísque até 3,30 da manhã, Gilberto Amaral, Fortes (Heráclito) e Eron estiveram lá;.

Naquela noite, sentado no bar do hotel, o Olavo Drummond e eu conseguimos animá-lo um pouco, fizemos até plano para comemorar o seu aniversário, em 12 de setembro, chamando o Milton Nascimento para cantar para ele. Quando o Gilberto chegou com o Heráclito e o Eron, descemos para conhecer o salão de festas.

O Eron havia mandado colocar o disco Peixe vivo, cantado em espanhol. O Juscelino me abraçou e saímos dançando, e ele dizendo: ;Peixe vivo em espanhol eu não resisto, não;.