Jornal Correio Braziliense

Cidades

Personagens da farsa terrorista em um hotel de Brasília contam os detalhes

O mensageiro feito refém e o homem responsável pelo sequestro falam sobre as sete horas de tensão no centro da cidade


Na casa simples de José Ailton de Sousa, 48 anos, no Jardim Lago Azul, no Novo Gama, a rotina tenta voltar ao normal após o sequestro no St. Peter Hotel. Funcionário há quase três anos, o mensageiro trabalha no ramo de hotelaria há 25 anos. Na sala da residência dele, e ao lado da mulher, a camareira de outro hotel Íris Maria Azevedo de Sousa, 48, Ailton contou detalhes dos momentos em que ficou sob o poder de Jac Souza dos Santos.

Ele explicou que, no início da manhã, antes das 8h, uma funcionária da lavanderia e o recepcionista Francisco Rogério tinham sido rendidos no quarto do suposto hóspede. Segundo Ailton, Jac solicitou o serviço de lavanderia e pediu que o recepcionista recebesse o pagamento das despesas do hotel, mas exigiu que o dinheiro fosse repassado no apartamento. ;A mando dele, o recepcionista ligou no hall, e eu atendi. Pediu que eu subisse para ser testemunha do pagamento. Quando bati à porta, o hóspede abriu com a arma em punho, perguntou o meu nome e disse que, dali em diante, eu seria o refém dele.;

Minutos depois, o acusado pediu que ele vestisse o colete com falsas dinamites. A situação abalou a funcionária de lavanderia, que chorava e tremia. ;Eu pedi para trocar de lugar com ela, e o homem a libertou. O recepcionista ficou responsável por entregar os CDs que ele queria enviar à imprensa com as reivindicações políticas. Coloquei a minha vida nas mãos de Deus e, naquela situação, pensava que podia viver ou morrer;, ressaltou José Ailton.

Sem equilíbrio

O mensageiro contou que Jac permanecia calmo, mas alternava momentos de nervosismo com os negociadores. Ailton suspeitou de a arma ser uma réplica em razão da cor e teve pelo menos três oportunidades de tomá-la. ;Pensei em jogar as armas para os policiais e tirar o colete com os explosivos, mas pensava que ele poderia ter dinamites no bolso, o que acabaria com tudo. Ele falava que era uma pessoa do bem, nunca havia matado ninguém e só queria resolver as coisas políticas boas para a sociedade;, relatou.

Ailton teve a chance de ligar para a mulher e os filhos, de 25 e 26 anos, três vezes. ;Não o tive ele como criminoso, achei que fosse loucura mesmo.; O mensageiro fez com que Jac telefonasse para a mãe, no Tocantins. Quando Jac revelou a fraude com os explosivos e a arma, Ailton teve vontade de reagir. ;Ele disse que eu era muito inteligente e corajoso. E eu respondi: ;Quem tem coragem é você de fazer o que fez;.;

Depoimento

;Foi a coisa mais terrível;

;Em nenhum momento, ele (Jac) me impediu de fazer nada. Eu bebia água, refrigerante e ia ao banheiro. Mas, a todo momento, eu pensava que poderia sair em paz daquela situação ou virar fumaça. No andar onde estávamos (13;), todas as portas dos quartos ficaram abertas. As que fecharam era por causa do vento. Ele saía do quarto onde estava comigo e ia até o outro da frente. Entrava e saía de um para o outro e até me disse que escolheu aquele hotel por ter a vista para o Eixo Monumental. Os negociadores estavam a mais ou menos 10m de distância da gente. O sequestrador pediu notebook e uma Bandeira do Brasil. Quando tudo acabou, os policiais mandaram que ele deixasse a arma de lado. Ele saiu comigo algemado, como se eu fosse um escudo. Ele foi preso, e o chão se abriu para mim. Dormi pouco essa noite. Foi a coisa mais terrível que eu vivi em toda a minha vida.;

José Ailton de Sousa, 48 anos,
mensageiro do St. Peter Hotel