Desde o nascimento do filho, há dois anos, Caroline Dourado, 22, só pega transporte público na companhia de um amigo ou familiar. Subir e descer de ônibus ou entrar e sair de estações de metrô com carrinho de bebê passaram a exigir da jovem um esforço extra. Ela reclama que muitos motoristas de coletivos ignoram os sinais de parada ao avistarem a mãe e o equipamento. Nos terminais de trem, a dificuldade é a mesma, pois alguns não possuem rampas ou elevadores. ;Se não tiver companhia, nem saio de casa. Não consigo entender como gastam milhões para construir uma estação e não pensam na acessibilidade;, reclama Carolina.
Moradora do Guará, ela ainda ressalta a falta de padrão de estações, calçadas e paradas de ônibus. ;As duas estações do Guará são bem equipadas: têm elevadores ou escadas rolantes, mas você desembarca em Taguatinga ou em outra cidade e já sofre dificuldades para se locomover com uma criança. O mesmo acontece em calçadas. Algumas são bem conservadas e com rampas, mas você anda um pouco mais e não consegue passar porque está tudo quebrado, sem manutenção;, compara.
As dificuldades de locomoção em Brasília estão por todos os lados. Caminhar pelo comércio da Asa Norte ou atravessar o Eixo Rodoviário pelas passagens subterrâneas implicam em desafios para qualquer cidadão. Para quem tem algum tipo de limitação física, os problemas são ainda maiores. No DF, há mais de 14,6 mil pessoas com deficiência motora ou visual e, em 2015, entidades representativas de cadeirantes e deficientes visuais prometem pressionar o poder público.
A ideia é fazer com que o tema acessibilidade receba a mesma importância de projetos voltados para o trânsito, como a expansão de estacionamentos e de vias. Em alguns casos, as soluções dependem apenas de vontade política. Para os cegos, por exemplo, as caixas de correio, as lixeiras chumbadas nas grades das casas, os orelhões e a falta de poda de árvores são obstáculos perigosos. O presidente da Associação de Deficientes Visuais e Amigos (Adeva), Markiano Charan Filho, explica que o risco está em bater com o rosto nos equipamentos e galhos porque é impossível identificar a presença deles com as bengalas.
Para Charan, a falta de padronização dos equipamentos urbanos também torna o dia a dia mais complicado. ;Em um quarteirão, a banca do jornal está do lado esquerdo. No outro, do lado direito da calçada. Se fosse uniformizado, seria melhor;, disse. E, quando há soluções para facilitar o deslocamento do deficiente visual, falta educação. É o caso dos semáforos sonoros. ;É um equipamento que ajuda, sim. Mas um passo anterior à implantação deles seria a educação do motorista. Eu não tenho coragem de atravessar sozinho por medo de o motorista avançar o sinal;, conta.
Bicicletas
Quem anda de bicicleta também se sente desrespeitado, apesar de as bikes estarem presentes em quase 30% dos lares, segundo levantamento da Companhia de Planejamento (Codeplan). O atual governo chegou a construir 550km de ciclovias e ciclofaixas, mas os usuários reclamam de não serem consultados. Numa das principais vias do DF, a EPTG, por exemplo, não há um metro de asfalto seguro para ciclistas. O presidente da ONG Rodas da Paz, Jonas Bertucci, critica a forma como a política de ciclovias foi instituída.
A primeira delas é a falta de estudo para conhecer a real demanda de quem pedala. Além disso, não foi feita uma pesquisa pós-implantação a fim de avaliar o que mudou no comportamento das pessoas e a necessidade de adaptações do projeto. ;Não houve planejamento nem para verificar as regiões administrativam com maiores demandas. E também falta campanha educativa de incentivo ao uso da bike e de respeito ao ciclista;, aponta.
Jonas Bertucci cita que, no Plano Piloto, há quase 100km de ciclovia e, na EPTG, com extensão de 15km, não há um quilômetro sequer. ;O número de ciclistas mortos na EPTG em um ano corresponde ao mesmo número de vítimas mortas no Plano Piloto nos últimos 10 anos. Pela lógica, a EPTG deveria ser atendida primeiro;, exemplifica.
O que diz o governo
O Metrô-DF reconheceu a necessidade de adequações e informou que a licitação para a escolha da empresa responsável pelos projetos de readequação dos espaços físicos de 21 estações está na fase final. No caso específico da estação Praça do Relógio, em Taguatinga, mostrada na reportagem, a melhoria será feita com a obra do túnel rodoviário, que deve ficar para o próximo governo.
Entre os problemas já detectados, o Metrô-DF citou que as estações da 102, 108, 112 Sul e do Guará precisam de luminárias no piso e faixa direcional na área pública. As estações Centro Metropolitano, Ceilândia Sul, Ceilândia Centro, Ceilândia Norte, Guariroba e Terminal Ceilândia vão ter rebaixamento do meio-fio nas calçadas de acesso. Os terminais Central, Galeria, Asa Sul, Shopping, Feira, Águas Claras, Praça do Relógio, Taguatinga Sul, Furnas, Samambaia Sul e Terminal Samambaia precisam de corrimãos nas rampas e escadas, sinalização sob o extintor de incêndio, pisos táteis e rebaixamento de meio-fio.
Em relação às normas de construção das calçadas, a Novacap informou que executa o projeto de cada administração. A reportagem solicitou informações sobre os critérios na construção de calçadas à Secretaria de Desenvolvimento Urbano, Regularização e Habitação (Sedhab), que reúne as normas urbanísticas de Brasília, e à Secretaria de Obras. Nenhum dos dois órgãos respondeu as questões.