Ailim Cabral
postado em 21/12/2014 19:04
Em Barreiras, na Bahia, um garoto de 12 anos descobriu um novo mundo ao ver uma equipe de uma TV local gravando uma reportagem. Ele nunca tinha visto uma câmera ao vivo e muito menos um repórter. Nesse momento, um sonho nasceu no coração do menino, que não mediu esforços para realizá-lo.
Ronaldo Rocha, hoje com 20 anos, conta que quando viu a equipe de jornalismo decidiu que gostaria de ser repórter e no dia seguinte correu para uma lan house para pesquisar sobre as câmeras usadas nas reportagens. Ao aprender um pouco mais sobre o assunto, percebeu que sua paixão se concentrava mais nas câmeras do que na reportagem em si e hoje está às vésperas de lançar o seu segundo filme amador, nos qual trabalhou como diretor, roteirista, câmera e produtor.
No mesmo ano em que descobriu a vocação de sua vida, Ronaldo começou a trabalhar vendendo salgados na rua. Parte do dinheiro ficava guardado e a outra ele usava para ir para a lan house, aprender mais sobre câmeras e edições de vídeo por meio de vídeos e de cursos online. Aos 13 anos, o jovem conseguiu comprar sua primeira câmera digital, que ele usava para fazer filmagens na escola. ;Era o maior sucesso no colégio, até os professores participavam. Eu inventava umas histórias malucas e chamava todo mundo para participar;, conta Ronaldo.
Assim que comprou a câmera, todos os trabalhos de escola eram feitos com vídeos, fotos e entrevistas e o gosto de Ronaldo pelo mundo das câmeras foi só aumentando. Em casa, se divertia fazendo filmes e fingindo ser o apresentador de um jornal. ;Eu fazia um cenário, tirava o sofá do lugar, colocava um pano na frente da TV. Eu usava até um terno quando brincava de apresentar um jornal;, diz, rindo.
Ele explica que os sonhos se misturam, o jornalismo e o cinema fazem parte de toda a sua adolescência e ele não esquece que o momento em que despertou para esse mundo foi assistindo a gravação de uma reportagem. Hoje, está mais decidido, quer fazer uma faculdade de Comunicação Social, se especializando em audiovisual e promete que não vai abrir mão das suas produções. ;Só vou dar um tempo, esse segundo filme me deu muito trabalho e agora eu vou descansar um pouco. Mas com certeza vou fazer um terceiro e muitos outros;, completa.
Para conquistar seus objetivos, o jovem saiu de casa, em Barreiras, aos 17 anos e se mudou para Brasília escondido do pai. ;Eu disse para ele que só estava vindo visitar um primo, mas eu já estava com todas as minhas roupas na mala. Depois que cheguei, liguei para ele, contei a verdade e disse que já tinha conseguido um trabalho com carteira assinada e não podia voltar;, lembra. Ele conta também que muitos amigos o acharam louco e duvidaram que ele um dia conseguiria fazer filmes.
Na capital, Ronaldo foi morar com um primo na Estrutural, terminou os estudos e ainda não começou a faculdade por falta de recursos. Atualmente trabalha como auxiliar de limpeza em uma escola da cidade, faz bicos como fotógrafo em eventos, além, é claro, de produzir os seus filmes. Aos poucos o jovem aumenta os recursos para os filmes, comprou uma câmera semi-profissional, um tripé e um microfone. ;O dinheiro que sobra eu gosto de investir na produção. O pessoal todo ajuda, as meninas com a maquiagem, os brechós da cidade com o figurino, e aí eu posso comprar equipamentos para melhorar os filmes;, conta.
Os filmes
O primeiro filme nasceu de uma necessidade que o jovem percebeu de mostrar a realidade da cidade e de alertar os jovens sobre as consequências do mundo das drogas. ;Queria mostrar o que acontece aqui, percebi que o tráfico era muito forte. Mas ao mesmo tempo, queria mostrar para os jovens que eles podem mudar esse caminho se fizerem as escolhas certas;, comenta.
Intitulado de ;Agindo sem pensar;, a primeira produção tem cerca de uma hora de duração. O sucesso do filme fez com que as pessoas procurassem Ronaldo, pedindo por uma nova obra. ;Fiquei famoso, quando voltei para minha cidade, descobri que tinha dvd pirata do meu filme e as pessoas me pediam autógrafos.Alguns pediram até desculpas por terem duvidado de mim;, conta.
Na segunda produção, ;Marcas da Dor;, Ronaldo mantém o foco social, trata sobre a violência doméstica e mais uma vez traz à tona o mundo das drogas e as suas consequências para as famílias. ;É muito importante que a gente possa ajudar as pessoas, incentivar as mulheres a denunciarem as agressões e mostrar como as drogas podem acabar com uma família;, ressalta o jovem.
A estreia do filme ;Marcas da Dor; será na próxima segunda-feira, 22 de dezembro. Dessa vez, Ronaldo lamenta ter que cobrar as entradas. Uma pessoa havia se comprometido a arcar com os custos da divulgação feita por meio de panfletos, cartazes e até mesmo um banner, mas na hora de pagar pelo material desistiu e deixou Ronaldo na mão. ;Fiquei muito chateado e agora preciso pagar essa dívida, por isso vamos cobrar a entrada da estreia;, conta.
O preço é simbólico, cada convidado paga R$ 5,00 e ganha o direito de levar dois acompanhantes. Para ajudar a pagar os custos e também conseguir algum lucro para a próxima produção, Ronaldo vai vender DVDs do filmes por R$ 10,00.
Todos os envolvidos nos filmes, atores, figurantes e maquiadores, são voluntários da comunidade que se envolveram nos projetos de Ronaldo, para ajudar o amigo ou para realizar os próprios sonhos. Branco Paulino, 28 anos, é uma dessas pessoas. O motorista de van escolar tinha um amigo em comum com Ronaldo e descobriu que ele faria um filme, Branco se voluntariou para atuar e viveu o papel do chefe do tráfico. ;Meu sonho é ser ator e esse filme é um começo. Ajudando o Ronaldo e sendo voluntário, eu estou fazendo o que eu mais gosto, que é atuar;, afirma. Ansioso para a estreia, Branco acrescenta ainda que essa é a sua primeira oportunidade e que está disposto a ;cair para dentro; em qualquer outra chance que aparecer.
Serviço
Estreia do filme Marcas da Dor
Data: 22/12
Horário: 19h30
Local: Galpão Múltiplas Funções - Quadra 03 Setor Norte
Preço: R$ 5,00