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18 anos da faixa: Conheça cidades que também são modelos de cidadania

O respeito ao pedestre orgulha o brasiliense, mas ainda há muito a ser feito. O sinal de vida nem sempre é garantia de que o motorista vai parar, como ocorre nos países onde a faixa é um direito consolidado

Aos 17 anos, João Pedro Medeiros Barbosa tem as preocupações comuns aos garotos de sua idade: concluir o ensino médio, ingressar na faculdade e tirar a carteira de motorista. O primeiro contato dele com as normas de trânsito foi aos 5 anos, no jardim de infância de uma escola em Berna, a capital da Suíça, onde ele nasceu e viveu até os 6 anos de vida. ;A professora colocava um colete amarelo fluorescente e a gente passeava pela cidade com um especialista em trânsito. Aprendíamos na rua a importância de ter atenção ao atravessar a via, o respeito e o significado das cores do semáforo;, conta.

Chegando a Brasília, ele lembra-se de ter sido orientado sobre trânsito ainda no jardim de infância. Depois, nunca mais. ;Quando a gente vai ficando mais velho, a escola acha que é obrigação dos pais ensinar sobre trânsito. Aparecem mais disciplinas e eles não focam tanto nesses aspectos de cidadania voltados para o trânsito;, acredita o jovem.

Nos últimos 10 anos, João Pedro voltou à cidade natal algumas vezes. E apesar de em Brasília o respeito à faixa existir, ele conta que a diferença em relação aos hábitos em Berna é gritante. E o relato mostra que o brasiliense pode avançar muito mais. ;Em Berna, você não precisa acenar com o braço para atravessar a rua. Se o motorista vê alguém parado na calçada, ele já para o carro para você atravessar. Não precisa nem sequer de faixa;, conta.



A mãe do jovem, a dona de casa Maria Luísa Barbosa Medeiros, 60 anos, conta que viveu um choque cultural ao chegar a Berna. ;O respeito está acima de tudo. O motorista para com ou sem faixa. É uma gentileza, é como se ele tirasse o chapéu e acenasse para você passar. O pedestre também respeita os carros. É um gesto mútuo;, conta Maria Luísa.

Quando voltou para o Brasil, em 2003, a família foi surpreendida com a cordialidade entre motoristas e pedestres, mas ainda ficou chocada com a necessidade de o pedestre sinalizar. Para ela, o respeito à faixa é igual a educar um filho. ;Tem que ser no dia a dia, com divulgação de campanhas na mídia. A Suíça não é o que é hoje de repente. Foram anos e anos de muita batalha. A gente não pode comparar a idade do país nem a nossa cultura com a deles. Mas, nas coisas mais importantes, como a educação do povo, isso tem que ser meta constante.;

Para Henrique Luduvice, diretor do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) no ano de implantação da faixa e atual comandante da autarquia, o modelo deu certo porque houve uma mobilização social em torno do projeto. A maioria das famílias perderam parentes ou conheciam alguma vítima de trânsito. ;Acidentes fatais eram comuns, as perdas familiares também. A sociedade se harmonizou em prol da paz no trânsito;, conta. A faixa, porém, só encontrou ambiente favorável à sua implantação após o governo reduzir a velocidade das vias por meio da fiscalização eletrônica. Em um primeiro momento, a medida causou reação dos opositores e foi parar na Justiça. Mas, com a redução significativa das tragédias, os processos judiciais foram arquivados, e quem acelerava mais do que devia era multado, assim como ocorre até hoje.

Bons exemplos

A cidadania brasiliense marcada pelo respeito no trânsito, tema da série de reportagens ;Maioridade da faixa de pedestres;, inspirou outras cidades brasileiras. Os moradores de Paracatu, cidade mineira distante cerca de 200km de Brasília, seguiram o exemplo da capital e, até hoje, os motoristas dão prioridade para quem está na faixa. O Correio apurou que o pedestre também tem vez em Maringá (PR), Boa Vista (RO), Palmas (TO) e Macapá (AP). Mas a história mais forte é a de Ijuí (RS). Lá, o respeito ao pedestre vem desde meados de 1940 e se acentuou no fim da década de19 70. E não tem isso de acenar com a mão. O pedestre colocou o pé na faixa, o motorista para.

A exemplo de Brasília, a efetividade do respeito a quem anda a pé se deu após a sociedade civil organizada se engajar na campanha promovida pelo município gaúcho. Na época, foi preciso pintar uma faixa em formato de T. E era necessário educar bem os cidadãos para evitar tragédias. ;Se o povo acreditar que será viável, ele participa e acaba dando certo;, afirma Ubiratan Machado Erth, secretário de Desenvolvimento Urbano, Obras e Trânsito de Ijuí.

Mas nem tudo foram flores. Em 2009, a cidade de cerca de 87 mil habitantes figurava entre as mais violentas do Rio Grande do Sul e isso se devia às mortes no trânsito. O município é cortado por uma rodovia federal e três estaduais. ;Ocupávamos a 26; posição no ranking. De 2009 para cá, implantamos medidas mitigantes, como o programa de humanização do trânsito, o plano de mobilidade e a criação de um comitê municipal de prevenção de acidentes, segurança pública, educação, saúde e sociedade civil organizada;, explica Ubiratan.

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