postado em 14/05/2015 11:16
;Ele foi o Pedro Álvares Cabral de Brasília.; O primeiro diretor da Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap), Ernesto Silva, não poderia ter sido mais bem definido. As palavras são da viúva dele, a aposentada Sônia Souto Silva, 77 anos, com quem ficou casado por 15 anos. A trajetória do pioneiro ; morto em 2010, aos 94 anos ; está entrelaçada à cidade sonhada por Juscelino Kubitschek, desde antes da inauguração. No início da década de 1950, Silva participou do grupo que planejou a construção de Brasília e, depois de se mudar para o Distrito Federal, dedicou a vida ao progresso e ao crescimento da capital, deixando sua marca do Plano Piloto ao Entorno. A partir deste ano, um pouco dessa história passará a fazer parte do acervo do Arquivo Público do DF (ARPDF). A família do médico e militar se dispôs a doar diversas peças do acervo de Ernesto, como documentos, fotos, diplomas, condecorações e correspondências. A ideia é ajudar a preservar a memória do pioneiro e, com ele, a da cidade. Parte do material também fará parte de uma exposição em comemoração aos 60 anos da Novacap, em 2016.Ernesto Silva nasceu em 1914, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro. Em 1933, formou-se em ciências e letras. Três anos depois, tornou-se oficial do Exército, chegando ao posto de coronel em 1961. Quando era militar, ingressou na Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro e, em 1946, realizou o sonho de ser pediatra. Com tanta versatilidade e talento, era de se esperar que o jovem tivesse um futuro brilhante. ;Ele sempre quis ser médico, mas, como veio de uma família de oito filhos, não foi fácil. No entanto, ele era um ótimo aluno. Chegou a ser até ajudante de professor;, diz Sônia.
Na década de 1950, o caminho de Ernesto se cruzaria, pela primeira vez, com o de Brasília. Entre 1953 e 1955 foi secretário da Comissão de Localização da Nova Capital do Brasil e presidente da Comissão de Planejamento da Construção e da Mudança da Capital Federal, em 1956 ; ele visitaria a região antes mesmo que JK, fato que o fez ficar conhecido como ;o pioneiro do antes;. Talvez ele não soubesse então, mas era o começo de um amor que carregaria pelo resto da vida.
;Ele era completamente apaixonado por Brasília. Podia falar sobre ela por horas. Acreditava muito no futuro da cidade;, lembra a viúva. Durante a construção da cidade, ocupou diversas funções. Nos anos em que foi diretor da Novacap, levou adiante diversas obras ligadas às áreas de saúde, urbanização e cultura. Foi ele quem, em 1956, assinou o Edital do Concurso do Plano Piloto, vencido por Lucio Costa. ;Uma das coisas mais importantes para ele durante toda a trajetória na capital foi que o planejamento de Costa fosse respeitado. Ele sempre dizia: ;Em que cidade do mundo cada apartamento pode ter acesso a todo esse verde como é aqui?;;, acrescenta Sônia.
Entre os feitos de Ernesto estão a criação da Fundação Hospitalar do DF, do primeiro Rotary Club e da Aliança Francesa, além da construção do Hospital de Base do DF, na época Hospital Distrital de Brasília (HDB). Ele também implementou a Escola Parque da 308 Sul, projeto do qual sentia especial orgulho. O esforço que dedicava à capital, aliado à personalidade efervescente, fez com que ganhasse a admiração e o carinho de todos que o rodeavam. ;Ele foi o homem mais intransigente na defesa de Brasília. Tinha uma cultura humanística muito grande, era alegre e comunicativo. Não bastassem todas essas qualidades, ainda gostava de cantar. Quando fez 90 anos, organizamos uma seresta e o fizemos entoar vários sambas;, lembra Jarbas Marques, ex-diretor de Patrimônio Histórico do DF e amigo próximo de Ernesto.
Contribuição histórica
Para a superintendente do Arquivo Público, Marta Célia Vale, os bens doados pela família são uma grande contribuição para o órgão. Ela explica que as peças cedidas pela viúva serão levadas para o órgão em até dois meses, devido aos outros processos de doação em andamento. ;A partir de então, faremos o inventário, levaremos adiante o resto da burocracia para elaborar o novo acervo privado de Ernesto Silva, que complementará o fundo da Novacap do ARPDF;, completa.
O atual diretor-presidente da Novacap, Hermes de Paula, também comemorou a nova aquisição. ;A história de Brasília se confunde com a da Novacap, e a primeira pessoa que atuou no órgão foi Ernesto Silva. Ele é uma das memória mais antigas que temos da capital;, defende. Ele explica que parte do material doado pela viúva do pioneiro será usado em uma série de exposições previstas para celebrar o aniversário de 60 anos da Novacap, em 2016. ;Estamos planejando um evento grande, com uma mostra bem ampla sobre a construção da cidade, e as peças de Ernesto Silva também farão parte;, detalha. Hermes afirma, ainda, que está sendo estudada a possibilidade de alguns quadros artísticos adquiridos pelo pioneiro ao longo da vida serem incorporadas ao acervo do Museu Nacional.