postado em 11/09/2015 06:03
Morar em casas precárias e parar de trabalhar para cuidar dos filhos são consequências diretas para quem vive na extrema pobreza no Distrito Federal. Segundo o Índice Multidimensional da Pobreza, divulgado ontem pela Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), mesmo com a ajuda do governo, essa fatia, a mais carente da população, tem dificuldade para estudar e necessita de programas de moradia e de creches. O estudo analisou 117 mil núcleos familiares em Brasília e nas regiões administrativas.
A pesquisa ouviu apenas quem faz parte de algum programa social do governo e tem o Cadastro Único. Foram levados em conta 31 quesitos, envolvendo aspectos de moradia, educação, renda, estrutura familiar, inserção no mercado de trabalho e acesso a esgoto e a energia elétrica. De acordo com o chefe da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Dipos/Codeplan), Flávio de Oliveira,;as famílias analisadas são as mais pobres entre as mais pobres;. As mais desabonadas, cerca de 5 mil pessoas, vivem na Estrutural, em Ceilândia, no Fercal, em Samambaia e em Taguatinga, e passam o mês com até R$ 154 ; a maior parte dos rendimentos repassados por programas sociais do governo, entre os quais o Bolsa Família, a Carteira do Idoso e a Tarifa Social de Energia Elétrica.
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O problema mais gritante são as péssimas condições de moradia, que atingem 5 mil pessoas. Nem todos têm casas de cimento ou pavimentadas. Alguns, nem sequer endereço. ;A solução seria criar programas voltados para a melhoria dessas residências;, sugere Oliveira. Faltam abastecimento de água, escoamento sanitário, coleta de lixo e energia elétrica. As residências que contam com esse sistema apresentam condições precárias. A situação se repete em Planaltina, São Sebastião, Taguatinga, Gama e Brasília ; Plano Piloto.
As dificuldades de moradia fazem parte do cotidiano de Janecleide da Silva, 36 anos. ;Aqui a água é de um poço e vem cheia de barro. E temos que usá-la para tomar banho, lavar as roupas, as louças. Energia é de gambiarra;, conta a dona de casa, que mora na Chácara Santa Luzia, na Estrutural, com o marido e sete filhos, entre 1 e 13 anos. Para ela, o problema habitacional leva a diversos outros riscos. ;As paredes de madeira vivem mofadas e o cheiro forte piora a asma e a bronquite das minhas meninas menores. E, quando está seco, tem o perigo de incêndio.;, desabafa. Para ela, as condições afetam também a saúde dos moradores. ;Como não tem esgoto e as crianças brincam na rua, vivem doentes, com lombriga;, completa Janecleide, que recebe em torno de R$ 340 do Bolsa Família para complementar a renda.
O vizinho dela, Martinho Moreira da Silva, 33, também acredita que as crianças são as mais afetadas. ;Com uma moradia melhor, eles poderiam brincar melhor, teriam menos problema de saúde;, pondera o fiscal de acesso, que mora com a mulher, Sueli Araújo, e quatro filhos. ;Se tivéssemos pelo menos uma terra assegurada, dava para, devagarzinho, comprar material e fazer uma casinha de tijolo;, completa, referindo-se à irregularidade das moradias na região da Estrutural.
Infância
Outra questão que dificulta a vida da população mais pobre do DF é a dependência infantil ; quando um adulto é impossibilitado de trabalhar para cuidar de crianças pequenas. Assim, nem todos os chefes de família têm condições de arrumar emprego e complementar a renda. ;Metade dos entrevistados não dispõe de ajuda para criar os filhos. Por isso, eles perdem a possibilidade de fazer dinheiro;, afirma Flávio de Oliveira.
A situação é vista, tanto na casa de Janecleide, quanto na de Martinho. Na primeira, a dona de casa tem de passar o dia em casa para cuidar dos filhos, enquanto o marido trabalha no aterro sanitário. ;Não temos parentes aqui, então não tem com quem deixar os meninos.; O mesmo caso ocorre com Martinho, que sai para trabalhar e deixa a esposa em casa. ;Minha mulher não tem como trabalhar, pois as crianças são muito pequenas. O mais novo tem apenas 18 dias.;
Enquanto muitos adultos são impossibilitados de trabalhar, jovens em idade escolar têm dificuldade para completar os estudos, principalmente no ensino médio. Quando completam 15 anos, a maioria se vê pressionada a ingressar no mercado de trabalho para, assim, tentar aliviar a situação financeira de casa. ;Eles são inseridos muito cedo na vida adulta, o que retarda os estudos. Assim, nem todo mundo se forma ou se qualifica corretamente. No momento e na realidade em que eles vivem, a prioridade é imediata;, completou Oliveira. A defasagem educacional se torna um problema maior no longo prazo, pois, com menor qualificação, a chance de empregos com boa remuneração se torna bem menor.