Cidades

Abandonados, prédios no Plano são ocupados por moradores de rua

Segundo especialistas, é preciso recuperar esses locais, mas sem apelar para a especulação imobiliária

postado em 19/09/2015 08:00

O Hotel Torre Palace agora hospeda a população em situação de rua e consumidores de entorpecentes: paredes caídas e muito lixo

Como fantasmas urbanos, antigos edifícios na região central de Brasília amargam um fim melancólico. Os saguões badalados de áureos tempos se perderam no silêncio de vãos abandonados. Nos prédios do Setor Hoteleiro Norte e da Asa Sul, uma parte da trajetória da cidade fica nos pedaços do forro de gesso largados ao chão. Na maioria dos casos, os esqueletos de concreto são propriedades particulares que estão sob disputa judicial. Enquanto o imbróglio não se resolve, tornam-se pontos de consumo de drogas e abrigos improvisados para a população em situação de rua ; como ocorreu com o St Peter Hotel, ocupado desde o início da semana por integrantes do Movimento Resistência Popular (leia mais na página 24).

A deterioração dos espaços é processo comum a várias cidades (leia Para saber mais), explica a geógrafa Mônica Veríssimo. ;É natural e, embora Brasília seja nova, isso também ocorre aqui;, diz. A área em que isso ocorre com maior intensidade corresponde à escala gregária prevista por Lucio Costa. De acordo com a proposta original do urbanista, ali seriam agregadas diversas atividades. No papel e no concreto, equivalem aos setores hoteleiros Norte e Sul, aos setores bancários Norte e Sul, aos setores comerciais e aos setores de diversão. Compõem, então, o coração da cidade. ;São áreas nobres, que precisam ser revitalizadas para que as pessoas voltem a circular;, ressalta Mônica.

Um caso emblemático de deterioração é o do antigo Hotel Torre Palace, às margens do Eixo Monumental, no Setor Hoteleiro Norte. O local está largado desde agosto do ano passado e, desde então, segue em ruína. As janelas estão quebradas, assim como portas e paredes. O lixo é vasto e variado. São latas de refrigerante que improvisam cachimbos de crack, embalagens de alimentos, trapos de roupas e pedaços de reboco. Ali se abrigam pessoas de vida fragmentada, em geral, por vício de álcool e drogas.

O movimento é maior à noite, conta um dos moradores do local. ;O pessoal passa o dia no Setor Comercial Sul, no Setor Bancário e volta para dormir;, explica o rapaz de 19 anos, que pediu para não se identificado. Ele está ali há oito meses e considera o lugar mais seguro que as marquises sob as quais dormia antes. ;Ainda tem os quartos, aí a gente fica lá;, diz. No último sábado, a Polícia Militar realizou uma operação no local e encontrou bicicletas roubadas. Ninguém foi preso. Os proprietários do imóvel foram notificados, em fevereiro, pela Administração de Brasília. O órgão informou, por meio de nota, que, desde então, os donos têm sido multados pelo abandono do espaço.

Isolados
O Torre Palace representa a peculiaridade do Setor Hoteleiro, na avaliação do professor aposentado da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (FAU/UnB) Antonio Carlos Carpintero. ;Os setores hoteleiros ficaram desconectados do Setor de Diversões. Com isso, a área perdeu a função e os turistas do Setor Hoteleiro ficaram isolados;, avalia. Segundo ele, a reconstrução de estabelecimentos tradicionais, a exemplo do antigo Hotel das Nações, não colabora com a questão. ;Há um processo violento de especulação imobiliária. Os novos hotéis são mais altos, têm mais quartos e arquitetura inferior. A dimensão é um exagero;, avalia.

Tornar a área atrativa novamente é um desafio que se impõe, de acordo com Mônica Veríssimo. ;Revitalizar é trazer a vida de volta ao local. As pessoas têm que querer voltar a circular lá;, afirma. Para ela, a situação parece de abandono porque os empresários preferem investir em novos locais. ;Para revitalizar, o governo precisa pensar em um projeto que una a escala gregária à bucólica, fundamental para a área;, afirma. Há casos em que a demolição se tornou a única solução para que isso ocorresse (leia Memória).

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