postado em 23/09/2015 06:00
Passos acelerados cruzam as estações. Quase sempre, um bom dia ou boa tarde é engolido pela pressa de chegar mais rápido. São 150 mil usuários por dia no metrô. Milhares de pés apressados. Do outro lado, fazendo a engrenagem girar, há 1.050 mil funcionários divididos nas cidades onde chega o Metrô. A Estação Central da Rodoviária, normalmente cinza e sem espaço para pausas, ganhou cores especiais ao exibir fotos e relatos sobre funcionários da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal (Metrô-DF). Os cartazes fazem parte da exposição Retratos do Metrô, que busca mostrar à sociedade como é o dia a dia e a história de vida de quem trabalha no serviço metroviário. As fotos são de Paulo Barros, os textos são assinados pelo jornalista Marcelo Abreu e a produção ficou a cargo de Márcia Felícia.Até 5 de outubro, os passageiros poderão conferir testemunhos e imagens de 30 profissionais nesse espaço. Depois, a exposição segue para as outras 23 estações. A mostra é parte da programação da Semana Nacional de Trânsito ; comemorada entre 18 e 25 de setembro ; e do Dia Mundial sem Carro, celebrado ontem. Enquanto compravam bilhetes, esperavam o trem e torciam para arranjar um lugar, muitas pessoas interromperam a correria cotidiana para admirar as histórias de luta dos trabalhadores que tornam possível o transporte metroviário na capital federal. ;Achei interessante. A gente normalmente não pensa em quanta gente está por trás dos serviços, ainda mais com relatos assim;, comenta a funcionária pública Lilian Pereira, 46 anos. Nos corredores da Estação Central, os moradores da capital federal podem conhecer a trajetória de Inalba Maria Morais Galvão, 51 anos, a primeira piloto mulher do metrô. ;Eu me sinto privilegiada por representar meus colegas, fiquei orgulhosa em ser escolhida para aparecer na exposição, é uma forma de humanizar nosso trabalho. Nem no meu aniversário recebi tantas mensagens positivas;, diz. Ela espera que, com a exposição, as pessoas percebam o próprio potencial.
A primeira fase da exposição foi interna, apenas para os funcionários. Agora, é a vez de o público conhecer mais sobre quem trabalha por eles. ;Quem passava pelos corredores do prédio principal da administração do Metrô não tinha oportunidade de conhecer nada sobre o órgão ao andar por ali. Então, há três meses, tivemos a ideia de mostrar as histórias das pessoas que trabalham no metrô;, explica o presidente do Metrô-DF, Marcelo Dourado, 56 anos. Textos e fotos da mostra estão disponíveis em: www.metro.df.gov.br.
Artigo
Vidas itinerantes
Por Marcelo Abreu
Gente vem antes dos trilhos, dos carros e das estações. Não haveria nenhuma estação, se não houvesse gente. Nenhuma partida, se não tivesse a ação humana comandando a máquina. Não haveria qualquer viagem, se não tivesse o homem no comando de todo esse processo. Foi com esse objetivo, o de valorizar funcionários e usuários, que a Companhia do Metropolitano do Distrito Federal, por meio da Assessoria de Comunicação Social, desenvolveu um projeto especial cuja ideia principal foi engrandecer as gentes que trabalham dentro e fora dos trens. Por dois meses, histórias foram ouvidas, textos, escritos e fotos, produzidas.
E não poderia haver lugar melhor do que a Estação Central (Rodoviária do Plano Piloto) para que essas histórias fossem expostas. É ali que Brasília se reconhece e se encontra. É ali, bem no meio da cidade de JK, por onde passam diariamente cerca de 700 mil pessoas, que a exposição Retratos do Metrô ficará por 15 dias. Depois, segue para as estações de maior movimento do Metrô-DF. A exposição fará parte da programação da Semana Nacional de Trânsito e Dia Mundial Sem Carros.
E, para que tudo isso chegasse ali, uma equipe saiu pelos corredores, pelo pátio de manutenção e pelas estações, para ouvir os funcionários e suas histórias de vida. Todo mundo tem uma história para contar. O Metrô quis conhecer melhor essas pessoas. Quis saber mais do que está no crachá. E elas são muito, muito mais do que um número de matrícula. Histórias foram ouvidas. São verdadeiros depoimentos de luta, esperança, sonhos, conquistas. Vidas inteiras entrecortadas. Há engenheiros, mecânicos, técnicos, operadores, pilotos, agentes. Histórias como a da engenheira Inalba Maria Morais Galvão, a primeira piloto do país, nascida no sertão de Pernambuco, e que tinha um único sonho: chegar ao Recife, para entrar numa faculdade. Chegou e desbravou o mundo.
Histórias como a de Cláudio Irineu da Silva, que trabalha na Divisão de Serviços de Apoio, e, fora das cercanias do Metrô, se revelou ator do filme Branco sai; Preto fica, de Adirley Queiroz, premiado no 47; Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. Depois de perder uma perna, aos 20 anos, Cláudio refez a sua vida e escreveu a melhor de suas histórias. Durante a entrevista, emocionado, ele disse: ;Eu aprendi que todo mundo cai, tendo ou não duas pernas. O que importa é a intensidade dessa queda;.
Relatos emocionantes como o de Rodrigo da Cruz Pereira, o menino de Samambaia que viu amigos mortos ou presos pela criminalidade, e, a despeito de ter tudo para dar errado, transformou o seu destino. Fez da dança a sua melhor história. Hoje, é um exímio bailarino e tem dado oportunidade a tantas outras crianças. Há a emoção de Lair Lima de Brito, neto de índio, que deixou Belém, no Pará, para ser técnico em mecânica no Metrô. Aqui em Brasília nasceram os seus três filhos e hoje ele comemora a vitória de cada um deles. ;São dois engenheiros e uma jornalista;, diz, cheio de orgulho. Num lugar esparramado por 42 quilômetros de via ; num vaivém incessante de 24 trens que carregam aproximadamente 160 mil pessoas/dia ; as histórias de uma gente real viajam sem parar. Que a viagem seja leve. Que as gentes não se cansem de contá-las.