Otimismo é um adjetivo que poucas vezes o senso comum relaciona aos professores. Fala-se bastante em dedicação e comprometimento como pilares da docência. A habilidade de acreditar que mudanças são possíveis é o que move muitos deles, mesmo quando o momento por que passa a classe aponta para o contrário. Problemas de infraestrutura, de sobrecarga de horários e de suspensão dos reajustes salariais são faces duras da profissão e poderiam suscitar neles questionamentos sobre o que comemorar nesta data.
A escolha da maioria, no entanto, foi usar o dia para mostrar que melhorias na educação podem e devem ocorrer. Professores da rede pública realizam ato público, a partir das 10h, na Praça do Relógi,o em Taguatinga. A atividade faz parte da greve geral, deflagrada hoje e sem previsão de término. O movimento cobra o pagamento dos reajustes concedidos na gestão anterior e suspensos pela gestão atual. As justificativas são o rombo nos cofres públicos e a incapacidade de fechar as contas.
A situação se torna ainda mais delicada com a publicação de uma auditoria operacional realizada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF). O documento Auditoria da Gestão da oferta de profissionais de magistério da rede pública de ensino do Distrito Federal aponta para carência relevante de professores e orientadores educacionais, não realização de aulas e comprometimento da qualidade de ensino. De acordo com o TCDF, o deficit de profissionais era de 2.641 vagas até o ano passado. Além disso, há carência de 164 mil dias/aula — não suprida por falta de profissionais ou deficiência no processo de contratação.
Apesar dos percalços, o sorriso com que contam a trajetória em sala revela a paixão pela profissão que escolheram. Conheça, abaixo, a história de quatro professores que acreditam no trabalho que desempenham.
Profissão professor
A mudança para a educação inclusiva renovou a confiança de Maria Goretti Oliveira Cunha, 52 anos. Professora há 34 e com mais de 20 deles na rede pública do Distrito Federal, ela vinha se cansando da rotina como professora regente. Goretti começou como professora de português em Campo Maior, no Piauí. Ainda na graduação, pegava carona em caminhões para frequentar a escola. “Chegava com o cabelo todo bagunçado”, lembra. Em 1981, entrou para a educação pública daquele estado e, em 2003, pediu transferência para o DF. A rotina exigente passou a desgastá-la. “Em 2006, descobri a educação inclusiva. Comecei a trabalhar em sala de recursos e voltei a sentir prazer na profissão”, explica. Desde então, ela usa dança e jogos lúdicos para estimular o desenvolvimento dos estudantes com deficiência física e intelectual do Centro Educacional 416, em Santa Maria. “É motivante ver como eles crescem. Nosso trabalho é ouvi-los, escutá-los. Isso porque, muitas vezes, a própria família não os ouve, pensa que são incapazes.” O trabalho de estímulo à independência gera resultados em várias esferas. “Eles conseguem se desenvolver na vida pessoal. Alguns entram para o mercado de trabalho”, afirma. A conquista pode parecer trivial, mas significa muito para Goretti. “Não me vejo em outra profissão. Sinto meu trabalho útil.”
Ajudando o jovem a pensar
A ideia de que o conhecimento é um processo de construção, em que professor e alunos participam dele, orienta a atuação de Pedro Caixeta Cabral, 31 anos. Professor de matemática do Elefante Branco, na Asa Sul, ele batalha para aproximar os estudantes da disciplina. “Procuro fazer com que os meninos melhorem a percepção da matemática e da escola. Faço educação com viés mais popular e acredito que a atuação dos professores pode fazer a diferença na vida dos alunos”, afirma. Cabral aproveita a sala de aula para estimular a consciência dos estudantes. “Gosto de trabalhar com jovens, por causa dos diálogos que podemos ter. Eles são bastante conscientes e questionadores”, diz. A proposta do educador é aplicar exercícios de raciocínio lógico para situações do cotidiano. “São atividades que os estimulam a procurar soluções e respostas”, diz. A vocação para ajudar a construir caminhos se manifestou em Pedro desde muito jovem. “Eu costumava brincar que era professor, que dava aulas. Esse era meu método de aprendizado, inclusive”, lembra. No ensino fundamental, um professor de matemática fortaleceu esse ímpeto. “Tive um professor da 5ª à 7ª série que reforçou em mim o interesse.”
Acreditando na educação
O amor da professora de artes Verônica da Silva de Oliveira, 49 anos, é tamanho que inspirou a filha mais jovem a seguir a profissão. A garota estuda educação física e pretende atuar como docente. “Ela me disse que quer ser professora, como eu”, conta Verônica, com largo sorriso. Há 30 anos na rede pública e com tempo para se aposentar, ela nem pensa em abandonar a sala de aula, no Centro de Ensino Médio 12 de Ceilândia. “Acredito que é por meio da educação que a gente sai de onde está. Vejo a educação como um caminho libertador”, defende. Segundo ela, a escolha pela disciplina artes é a possibilidade de tornar mais suave o processo de aprendizado. “A sensibilidade fica aflorada. Percebo que os alunos adquirem um olhar mais crítico e mais atento.” Os resultados são um incentivo importante para ela. “Tenho sede de que meu aluno vá adiante. Ser professor é um grande desafio. Não é sacerdócio, a gente fica porque acredita”, explica. Por isso, ela defende a greve como um pedido de socorro. “Há uma falta de investimento, as turmas estão muito cheias. Essa situação, como um todo, traz insegurança, ansiedade”, diz. Segundo ela, ninguém ganha com a suspensão das atividades. “Temos alunos que vão prestar o PAS e o Enem e não poderiam ficar sem as aulas.”
Aprendendo mais que ensinando
O encanto pelo convívio com jovens exige muito equilíbrio emocional, na avaliação do professor de gramática e redação do Sigma Fernando César Ventura Lima, 53 anos. Em 25 anos de docência, ele aprendeu que a persuasão ensina mais que a pressão. “Gosto muito de trabalhar com jovens. Há quem diga que eles são sem educação, mas eu discordo. Eles são educados, elegantes. Se não fosse professor, seria jogador de futebol”, brinca. Ele já atuou como coordenador, mas prefere lidar diretamente com os estudantes. “É importante estar próximo deles, eles precisam disso. Ainda acontece de a família deixar a educação a cargo apenas da escola”, diz. E, com o passar das gerações, percebe que mudam as turmas, mas ser aluno não se altera tanto. “A mudança maior, nesses anos, foi em mim. Aprendi que elegância e convencimento são mais efetivos que a força”, destaca. Assim como os colegas, a motivação de estar em sala de aula é poder presenciar o crescimento dos adolescentes. “É uma terapia estar aqui, a gente esquece os problemas. Eles são muito felizes e passam isso para a gente.”