Luiz Calcagno
postado em 11/03/2016 21:09
A derrubada dos quartos de santo da Comunidade Espírita Afro-brasileira Ilê Axé de Iemanja Ogum Té não foi um ataque. É o que afirma o representante da empresa Pró-Lote, Geovani Simão da Silva Júnior. Ele mostrou à reportagem a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que ordenou a reintegração de posse do terreno por falta de pagamento em 16 de março de 2015. A ordem foi enviada por carta-precatório para a Justiça goiana. Leia mais notícias em Cidades.
Geovani contou que um oficial de Justiça chegou a procurar a ialorixá Noêmi Ferreira, 65 anos, moradora e líder religiosa da comunidade, por quatro vezes. ;Ele chegou a deixar recados. Fez a reintegração de posse e nos comunicou. Nós tiramos os pertences de dentro do local e derrubamos as paredes. Ela é dona do lote dos fundos, ligado a ele por um portão. Nós também estamos com um processo para reaver este terreno na Justiça;, disse.
O representante explicou que a empresa faz contratos de compra e venda e que, algumas vezes, um comprador desiste e eles repassam o lote para outro interessado que assume a dívida. ;Quando alguém não paga, nós fazemos todo o processo. Notificamos a pessoa, negociamos. Depois, se não tiver resultado, entramos na Justiça. A reintegração de posse é a última coisa. E só é feita com ordem judicial, pelo oficial de justiça;, detalhou.
Geovani mostrou uma planilha do lote com algumas parcelas com mais de 3 mil dias de atraso. Ao todo, a comunhão devia 58 parcelas no valor de R$ 78.855,40. ;A reintegração só aconteceu na data limite. A casa estava vazia. Inventariamos o que tinha lá, para devolvermos. Deixamos um recado. O local estava aparentemente abandonado. Na terça, sem conseguir falar com ninguém, retiramos os bens e começamos a demolir;, contou.
Patrimônio cultural
A coordenadora do Núcleo de Proteção ao Patrimônio Afro-brasileiro da Fundação Palmares, Adna Santos de Araújo, também conhecida como Mãe Baiana se queixou da atitude do oficial de justiça e da empresa que, na visão dela, profanaram o templo religioso. Ela afirmou, no entanto, que a fundação não tomou conhecimento do processo.
Para Mãe baiana era necessário que a empresa aguardasse a chegada da Ialorixá Noême Ferreira, 65 anos, responsável pelo local e moradora de um dos cômodos destruídos. ;Ela não foi notificada. Não sabia. A filha dela também não. Ela estava viajando para a Bahia. A Justiça chega, não acha a pessoa, mas tem os objetos sagrados dentro do terreiro. O espaço sagrado é patrimônio, e isso a gente defende. É uma cultura que tem mais de mil anos. Não poderiam esperar? Eles entraram e fizeram uma esculhambação;, criticou.
A reportagem procurou Noême e a filha dela por celular e mensagens, mas elas não responderam as tentativas de entrar em contato.