Após sete anos em vigor, a proibição de dirigir alcoolizado é sistematicamente ignorada. Na tentativa de escapar de uma punição mais severa, 95,5% dos motoristas flagrados na Lei Seca em 2014 se recusaram a fazer o teste. No primeiro trimestre deste ano, o percentual de negativas está em 46,7% dos autuados. Mesmo abstendo-se de assoprar o bafômetro ou de fazer o exame clínico, os infratores não saem totalmente impunes, pois a lei autoriza a multa com base em outras provas. Desta forma, os números não param de crescer.
Somente nos primeiros três meses do ano, houve um acréscimo de 17,2% nas prisões por alcoolemia no Distrito Federal. São 502 casos contra 428 no mesmo período do ano passado. As multas, nesses casos, seguem a mesma tendência. Em 2015, a fiscalização realizou 14.156 autuações, 19,2% a mais que em 2014, quando foram emitidas 11.867 multas. Entre janeiro e 5 de maio, houve 4,4 mil flagrantes. Para especialistas ouvidos pelo Correio, o crescimento dos números, em parte, é um reflexo de falhas na legislação e na atuação do Estado (leia ilustração).
Com a condição de ter o nome preservado, um comerciante de 43 anos, morador de Taguatinga, pego este ano alcoolizado, resumiu a experiência. ;Foi um constrangimento que vou levar para a vida toda. Se não estivesse com o meu filho de 10 anos no carro, talvez o impacto fosse menor;, contou. Ele havia saído de casa para buscar o menino na casa de um amigo e, na volta, acabou flagrado. O teste do bafômetro acusou nível acima de 0,29 miligrama de álcool expelido dos pulmões; por isso, o comerciante foi levado para a delegacia. ;Ele (o filho) não foi junto, claro, mas explicar a ele que o pai estava sendo preso porque dirigia depois de beber foi difícil;, relata. O comerciante chamou a mulher para buscar a criança.
O diretor de Fiscalização e Policiamento do Departamento de Trânsito (Detran), Silvain Fonseca, atribui o aumento dos flagrantes à intensificação das blitzes. ;Temos operações de segunda a segunda. A nossa meta é manter os acidentes em queda. E, em 95% dos casos, tiramos o condutor alcoolizado da rua antes de ele se envolver em alguma colisão;, afirma. Quanto às negativas em fazer o exame, Fonseca diz que é o medo do condutor de ser preso. ;Esclarecemos na abordagem que, se o índice for considerado crime, ele vai preso. Muita gente se recusa para não correr o risco. Prefere pagar a multa;, diz.
Na avaliação de Fonseca, o reajuste do valor das multas, publicado na quinta-feira, no Diário Oficial da União (DOU), deverá inibir esse tipo de conduta. Dirigir alcoolizado é infração gravíssima, e o valor da multa será multiplicado por 10. Hoje, o valor chega a R$ 1,9 mil. Mas, a partir de novembro, saltará para R$ 2,9 mil. ;Os legisladores reajustaram os valores com a intenção de inibir esse comportamento por meio da punição pecuniária. No caso da faixa exclusiva de ônibus, quando foi reclassificada para infração gravíssima (antes, era leve ou grave), houve redução da infração;, constata.
Cultura
O alto índice de recusa em soprar o bafômetro e o aumento dos flagrantes não surpreendem o consultor em segurança do trânsito Eduardo Biavati. Segundo ele, em Fortaleza, por exemplo, esse índice é de 80%. ;A cultura de não soprar o bafômetro ficou generalizada. E, na maioria das cidades, a sensação de que não tem fiscalização é real. Nelas, a estrutura de fiscalização é a mesma. Não evoluiu.;
Citando o chefe de policiamento de trânsito da Austrália, Biavati diz que o Brasil perde a oportunidade de divulgar a fiscalização realizada. ;Na maioria dos lugares, não montam uma grande estrutura para que todo mundo veja o que acontece. Já no Rio, fica-se sabendo quem é abordado e quem não é porque de longe o condutor vê a operação. Mesmo quem não é pego, é educado, porque sabe que acontece;, comenta.
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