Cidades

Para Brasília se consolidar como capital foi preciso abrir estradas

O ritmo alucinante das obras demonstrava a preocupação de que o sonho da nova capital não se dissipasse com as dificuldades

Flávia Maia, Adriana Bernardes
postado em 08/08/2016 11:27

Caminhões abriam o cerrado para a construção do asfalto que integrou o Brasil

As imagens registradas na época mostram o quão imperioso era abrir estradas de acesso à capital. O ritmo alucinante das obras demonstrava a preocupação de que o sonho da nova capital não se dissipasse com as dificuldades. Não havia tempo para pensar, era preciso fazer. E o trabalho era diuturno.

O administrador Fernando Carvalho Araújo, 74 anos, um dos seis filhos de Bernardo Sayão, viu de perto o surgimento da capital. ;Meu pai veio atrás de Juscelino porque queria unir o Brasil de Norte a Sul com a Belém-Brasília. Aí, o presidente disse que o deixaria fazer a rodovia, mas só depois que entregasse a pré-obra de Brasília;, relembra.

[SAIBAMAIS]E foi uma corrida contra o tempo. Sayão construiu a primeira pista de pouso para pequenos aviões. Ela ficava onde hoje é a Rodoferroviária e é citada no discurso de Israel Pinheiro, na ocasião de despedida de Juscelino Kubitschek, conforme consta o Diário de Brasília de 1961: ;Há quatro anos e quatro meses, descia V.Excia. na pista precária de ;Vera Cruz;, construída pelo arrojo de Bernardo Sayão;.

Fernando lembra que chegar aqui era tarefa das mais difíceis. ;De Goiânia para cá de jeep a gente demorava umas 4h se o tempo estavisse seco. Com chuva, ia para lá de 12h. Não tinha estrada direito. Eram caminhos estreitos e precários;, relembra. Ainda assim, o percurso era realizado por ele todos os fins de semana. ;Naquela época não imaginava que isso aqui ia ficar assim;, diz com o semblante de quem compara o poeirão vermelho com o concreto pálido da capital.

O documentário Caminhos de Brasília, aos cuidados do Arquivo Público do Distrito Federal, registra o traçado da rodovia Rio-Brasília. O trecho de Paraopeba passando por Sete Lagos já existia. O complemento teve início em Felixlândia, Três Marias, João Pinheiro e Paracatu, todas cidades mineiras. Depois, já em Goiás, seguia por Cristalina, Luziânia e Distrito Federal propriamente dito.

Personagem da notícia: Fernando Carvalho Araújo

Filho de Bernardo Sayão, Fernando Carvalho Araújo cresceu entre obras e estradas

Do nascimento até os 17 anos, Fernando Carvalho Araújo teve uma vida incomum, guiada pelos sonhos do pai, o engenheiro Bernardo Sayão Carvalho Araújo. Nascido em Anápolis (GO) em 10 de fevereiro de 1942, Fernando e a família seguiram rumo ao interior do estado à medida que o pai construía a estrada para a região onde fundaria a Colônia Agrícola Nacional de Goiás, atual Ceres, na chamada Marcha para o Oeste empreendida por Getúlio Vargas. ;Ele foi fazendo a estrada e fomos nascendo pelo caminho;, brinca Fernando.

A frase faz todo sentido. O irmão de Fernando, Bernardo, nasceu em Jaraguá. Lia e Lílian, em Ceres. A mãe é carioca de Niterói (RJ) e veio com Sayão para Goiás. As irmãs mais velhas por parte de pai, Laís e Leia, viviam em Belo Horizonte. Para o menino, a vida em Ceres foi tranquila. Da casa em cima de um morro avistava-se o Rio das Almas, onde logo o pai construiu uma ponte, usando tambores para escoar a produção da colônia.

Na adolescência, morou em Goiânia. Todo fim de semana embarcava num jeep ou num avião de pequeno porte e rumava para o canteiro de obras de Brasília. Algumas vezes, o então adolescente era portador de malas de dinheiro usado pelo pai para pagar os operários. Mudou-se definitivamente para Brasília aos 16. Um ano mais tarde, ficou órfão. Bernardo Sayão morreu ao ser atingindo pelo galho de uma árvore quando faltavam 150km para terminar a Belém-Brasília. Aos 33, Fernando conheceu Claudete, com quem se casou e teve três filhos: Paula, Luiz Fernando e Marcelo, todos Sayão. Fez questão do sobrenome do pai. ;Eu sempre quis ter Sayão no meu nome. Não sei porque ele não colocou. Acho que é porque ficava muito longo;, arrisca.

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