Otávio Augusto
postado em 08/12/2016 06:00
O esquema de possível fraude envolvendo atestados falsos na Secretaria de Saúde ganhou novos desdobramentos. O Sindicato dos Médicos (Sindmédico) defende que o licenciamento de 53,7% dos profissionais em um ano e meio está intimamente ligado às %u201Cpéssimas%u201D condições de trabalho. No início da noite, o Conselho Regional de Medicina (CRM-DF) informou que os servidores envolvidos serão investigados %u201Cdo ponto de vista ético-profissional%u201D. A Subsecretaria de Segurança e Saúde no Trabalho (SubSaúde) adiantou ao Correio que estuda quebrar o sigilo de algumas informações para dar celeridade à apuração. O Ministério Público (MPDFT) também deve adotar medidas judiciais mais incisivas para obter informações.
[SAIBAMAIS]Ontem, o Correio publicou reportagem exclusiva mostrando que entre junho de 2015 e setembro de 2016, 2.578 médicos pediram licença do trabalho. Uma parcela desses médicos, porém, ausenta-se dos afazeres nos hospitais públicos e continua a atuar na rede privada. Com a fraude, recebem os dois salários, mas trabalham efetivamente em apenas um local %u2014 normalmente clínicas particulares ou próprias. A Corregedoria da Saúde estima que até 40% dos atestados podem ser fraudulentos.
Apuração
Gutemberg Fialho, presidente do Sindmédico, garante que pedirá acesso às investigações. Ele diz que o sindicato nunca recebeu denúncias sobre o assunto e que se a fraude acontece é de maneira pontual. %u201CO governo não consegue contratar servidor suficiente e fica arranjando desculpas. Agora, o que a Corregedoria está dizendo é que a SubSaúde é incompetente e não consegue fazer a gestão.%u201D Gutemberg afirma que há um deficit de 3,5 mil médicos.
Clínicos gerais, pediatras e ginecologistas são os especialistas que mais registram casos de afastamento. Apesar das movimentações, o corregedor da Saúde, Rogério Batista Seixas, ressalta que as pressões da classe não atrapalham as investigações. %u201CTem uma coisa que não está certa. Não é colocar a sociedade contra o médico. A função da Corregedoria é investigar. São dados que precisam ser apurados%u201D, argumenta. Caso seja comprovada a fraude, os servidores envolvidos podem responder por infração grave. A punição varia de advertência a demissão, sob a acusação de abandono de cargo.
Para as investigações continuarem, o MPDFT e a Corregedoria precisam da Classificação Internacional de Doença (CID). Sem o dado, não é possível saber a causa do afastamento e se a licença é válida. A SubSaúde discute a possibilidade de abrir a confidencialidade da informação %u2014 um código que indica cada patologia por uma sequência numérica, usada pelos médicos na emissão dos afastamentos. %u201CHá, no momento, a discussão jurídica acerca do sigilo profissional e da proteção dos direitos do paciente. A análise criteriosa se faz necessária, já que não há regulamentação específica sobre o tema para a administração pública%u201D, destaca o órgão, em nota.
Para o CRM-DF, cabe à Secretaria da Saúde a apuração das denúncias no âmbito administrativo, sendo que os casos concretos devem ser encaminhados à entidade para apuração do %u201Cponto de vista ético-profissional%u201D. %u201CAs eventuais denúncias ou suspeitas devem ser apuradas com rigor, com amplo direito de defesa e ao contraditório, evitando-se generalizações que prejudicam a relação médico-paciente e não trazem benefícios à assistência oferecida%u201D, conclui o texto.
Memória
Problema antigo
Em novembro de 2014, a então secretária de Saúde, Marília Cunha, anunciou que a Corregedoria da pasta começaria a investigar os atestados entregues por médicos escalados para plantões na rede pública. Uma equipe chegou a ir ao Hospital Regional da Asa Norte (Hran) para buscar os atestados. A escala de um fim de semana ficou sem nenhum médico para trabalhar. Naquele ano, a Secretaria de Saúde recebeu 4,5 atestados médicos por hora. Os números tomam como base a quantidade de documentos entregues ao longo dos 273 dias, entre 1; de janeiro e 30 de setembro de 2014.