Isa Stacciarini
postado em 01/02/2017 06:34
As regalias concedidas ao empresário e ex-senador Luiz Estevão derrubaram a direção do Centro de Detenção Provisória (CDP), no Complexo Penitenciário da Papuda. Além disso, agentes de atividades penitenciárias são suspeitos de receber propina para permitir a entrada de produtos proibidos no local onde está o detento. A fraude foi descoberta após uma vistoria da Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe), em 26 de janeiro, que encontrou chocolate, cápsulas de café, cafeteira elétrica e massa de macarrão importada na cela do ex-parlamentar, transferido para a solitária por 10 dias. Os servidores também identificaram alimentos e objetos não permitidos na cantina frequentada por ele. Agora, a Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social, o Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e a Polícia Civil investigam quem facilitou a entrada dos itens.
[SAIBAMAIS]A Sesipe instaurou na segunda-feira sindicância administrativa para apurar o caso. Além disso, pediu a exoneração de todos os integrantes da cúpula do CDP, inclusive do diretor da unidade, Diogo Ernesto de Jesus, agente de atividades penitenciárias. O CDP é o local onde ficam presos provisórios, sendo, ainda, o presídio de entrada e de classificação para as demais unidades do sistema penitenciário. Com capacidade para 1.646 detentos, está superlotada. Hoje, há 4.033 internos no CDP. Nos bastidores, circula a informação de que quem assumirá a direção do centro é o gestor da Penitenciária 1 do DF, delegado Johnson Kennedy Monteiro. Ele assumiu a direção após a fuga de 10 presos perigosos em fevereiro de 2016.
O ato para o afastamento dos servidores está sendo finalizado para ser publicado no Diário Oficial do Distrito Federal. A expectativa é que a perda dos cargos de chefia ocorra hoje. Um inquérito sigiloso também foi aberto na Divisão Especial de Repressão ao Crime Organizado (Deco) e no MPDFT.
Os privilégios de Luiz Estevão foram descobertos após denúncia ao Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) durante o recesso de fim de ano do Judiciário. Segundo consta nos autos do processo, o diretor adjunto do CDP, Vitor Espíndola, teria ido ao presídio em um sábado, fora do horário de expediente, na companhia do presidente do Sindicato dos Agentes de Atividades Penitenciárias (Sindpen-DF), Leandro Allan Vieira, e permanecido na cela do ex-senador por mais de uma hora.
Para a juíza da Vara de Execuções Penais (VEP), Leila Cury, ;desde então, o mesmo (Luiz Estevão) estaria sendo privilegiado em relação ao recebimento de alimentos diferenciados, além de outros ainda em investigação, havendo indícios de prática de crimes envolvendo referidas pessoas e outros agentes lotados na mesma Casa Penal.; Após a volta do recesso, a magistrada encaminhou um ofício sobre o caso à Sesipe e ao MPDFT para que apurassem o caso.
Isolamento
Desde que os benefícios proibidos foram descobertos, Estevão foi transferido da Ala B para uma solitária na Ala C, ambas do Bloco 5 do CDP. Segundo a Justiça do DF, ele desrespeitou normas do sistema e desacatou o coordenador-geral da Sesipe, Guilherme Nogueira, ao ser questionado sobre a presença de itens na cela. Como punição, seguiu para o Pavilhão Disciplinar, uma espécie de isolamento preventivo, como é feito com qualquer interno que descumpre ordens no sistema penitenciário brasiliense.
Estevão está agora no mesmo setor de Osmarinho Cardoso da Silva Filho. Ex-tenente da Polícia Militar, ele cumpre pena por ter sequestrado a filha do ex-senador, em setembro de 1997. Advogados do empresário entraram com um pedido, em 26 de janeiro, requerendo o retorno do detento ao local de origem, mas o Judiciário negou no dia seguinte. Na decisão, a juíza Leila esclareceu que ;tal providência (cumprimento de medida disciplinar) não se mostra adequada nos estabelecimentos que possuam alojamento coletivo, como se observa no presente caso, tendo em vista que ele dividia a cela com outro apenado.;
Estevão tinha a companhia de dois condenados pelo mensalão, Ramon Rollerbach e Henrique Pizzolato. Este último, Lúcio Funaro, preso na Operação Lava-Jato, e Adriano Oliveira, ex-servidor do TJDFT, também foram transferidos para a solitária por regalias no CDP.
A magistrada ressalta, ainda, que ;a alocação do interno faltoso em cela diversa visa contribuir para a melhor averiguação dos fatos, na medida em que os mesmos ocorreram justamente na cela em que ele anteriormente ocupava.; No entanto, o Judiciário determinou que cabe à Sesipe zelar pela integridade física dos dois internos (Estevão e Osmarinho), para evitar qualquer contato entre eles. Este é o segundo incidente envolvendo o ex-senador na Papuda (veja Memória). O advogado dele, Marcelo Bessa, disse ao Correio que só dará explicações à Justiça.
Agentes
Em nota, o Sindicato dos Agentes de Atividades Penitenciárias (Sindpen-DF) defendeu que as denúncias sobre a existência de uma suposta organização criminosa no âmbito da administração do CDP, imputando a agentes de atividades penitenciárias crimes de prevaricação, por exemplo, são caluniosas e inverídicas. O presidente da entidade, Leandro Allan Vieira, alegou que, em agosto de 2016, a direção do CDP soube dos privilégios de Luiz Estevão e os comunicou à Sesipe e à Gerência de Inteligência.
Também em nota, o Sindpen-DF negou que Leandro tenha visitado a cela de Luiz Estevão em um sábado, ;uma vez que suas condutas, no desenvolvimento de suas atividades, quer sejam sindicais ou administrativas, sempre se pautaram pela legalidade e em obediência estrita e restrita às normas administrativas prisionais.;
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social, órgão ao qual a Sesipe faz parte, esclareceu que a Sesipe instaurou uma sindicância, publicada no Diário Oficial do DF na segunda-feira, e comunicou o caso à Polícia Civil, que abriu inquérito para investigar a possível participação de agentes públicos. ;A SSP-DF informa, ainda, que os servidores envolvidos serão afastados dos cargos que ocupam no CDP. Cabe frisar que todas as providencias adotadas estão sendo acompanhadas pelo Ministério Público e pela Vara de Execuções Penais;, acrescentou.
Patrimônio bilionário
Preso em uma solitária da Papuda, Luiz Estevão é apontado como o homem mais rico do Distrito Federal e um dos mais abonados do país. Ele já declarou ter patrimônio de US$ 12 bilhões. A riqueza do ex-senador nunca foi tratada com discrição: antes de ser detido, ele circulava pela cidade em uma Ferrari e dava festas nababescas em sua mansão, no Lago Sul. Estevão também é o maior proprietário de terras no DF, dono do portal de notícias Metrópoles e comanda o time Brasiliense.
Crime
Osmarinho foi condenado a 22 anos de prisão pelo sequestro de Cleucy Meirelles. À época, a vítima tinha 12 anos e chegava à Escola Americana. Por uma semana, ela ficou sob o poder de sequestradores. A polícia desvendou o crime depois que Osmarinho ligou para Estevão de um orelhão na 115 Sul. Foram 58 minutos de conversa, tempo para que a polícia rastreasse a ligação e o prendesse. No carro de Osmarinho, havia o contrato de locação do imóvel que serviu como cativeiro.
Três perguntas para
Anderson Espíndola, subsecretário do Sistema Penitenciário do DF
De que forma o isolamento de Luiz Estevão pode interferir na pena dele?
Somente a Vara de Execuções Penais poderá responder essa questão. O nosso procedimento foi apenas fazer o isolamento preventivo do interno por ter cometido uma falta disciplinar, procedimento normal para qualquer custodiado que infrinja as normas disciplinares.
Quais servidores estão sendo investigados e por quais crimes?
Ainda é cedo para afirmar quem são os investigados, tampouco a responsabilidade de cada um no processo.
O que vai acontecer com Luiz Estevão?
Ele permanecerá isolado por 10 dias, continuando a cumprir a pena a que foi condenado.