Carolina Gama - Especial para o Correio
postado em 14/03/2017 10:10
No mesmo dia em que Luís Guilherme Coelho Caxias, 6 anos, recebeu alta após a terceira internação, os pais da criança ficaram cientes de uma derrota na Justiça. O nome do policial civil acusado de ferir, com um tiro, o menino, em janeiro deste ano, na BR-070, foi retirado como réu da ação civil por perdas e danos proposta pela família. O entendimento foi do juiz Jansen Fialho, da 3; Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal. De acordo com o despacho, como o autor do crime, Silvio Moreira Rosa, 54 anos, é lotado na Polícia Civil do DF, cabe ao Estado a responsabilidade por reparar o dano causado à família.
A decisão foi tomada na última segunda-feira e tornada pública ontem, pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). Foi negado, ainda, o pedido de antecipação de tutela ; requerido quando a parte alega não poder esperar o tempo de execução da sentença por motivos de urgência. Dessa forma, a família não receberá de imediato dinheiro para arcar com os custos do tratamento da criança. O juiz alegou que, nesse caso, não é cabível liminar contra ato do Poder Público.
Segundo a advogada Karolyne Guimarães, a família entrará com recurso hoje para reverter a decisão. ;No momento em que o juiz tira o Silvio do polo passivo, ele está negando o direito de a família de conseguir justiça com o autor do crime em todas as esferas. O que aconteceu foi uma tentativa de homicídio que os três sofreram ; pai, mãe e a criança. E somente o Luís Guilherme foi atingido. Em relação aos gastos, fizemos os cálculos de quanto será despendido mensalmente, e o valor chega a cerca de R$ 8,5 mil para continuar o tratamento;, argumenta a defensora.
A mãe do menino, Paula Caxias, também advogada, revoltou-se com a decisão. ;Como é que eu estudei direito para ver o cara que quase matou meu filho sair impune? Eu passei cinco anos estudando, trabalhando e praticando a justiça e, quando chega a minha vez, eu não tenho?;, questiona. Na esfera penal, Silvio Moreira Rosa responderá por tripla tentativa de homicídio duplamente qualificado. Ele permanece preso em Goiânia.
Para arcar com os custos do tratamento, cirurgias e internação, os pais de Luís Guilherme usam o dinheiro da venda da casa onde moravam e que seria usado para comprar outro imóvel. Hoje, moram em um apartamento alugado em Valparaíso. ;O dinheiro já foi quase todo embora. Mas o que eu vou fazer? Vou deixar o meu filho morrer porque o Estado acha que está muito caro?;, indigna-se Paula, que está afastada do trabalho para se dedicar aos cuidados com o filho.
De acordo com o jurista Rui Celso Reali Fragoso, a decisão do juiz é passível de discussão. ;De qualquer maneira, o Estado é responsável. A figura do Estado é justificada pelo fato de o homem estar fardado e ter utilizado a arma da corporação para o crime. Já a figura do policial nesse processo é facultativa;, analisa. Sobre o pedido de antecipação de tutela, o especialista argumenta que talvez o magistrado precise de mais informações para julgar. ;O âmbito da indenização seria mais no aspecto moral e de reembolsar o dinheiro gasto com o tratamento. Ainda que não tenha sido dado agora, pode ser concedido com a sentença;, complementa.
Amigão
Apesar do revés na Justiça, Luís Guilherme comemorou a volta para a casa, depois de se recuperar de uma pneumonia e ficar internado por uma semana. Apesar de ainda debilitado, esteve animado, brincou e conversou. Diante de uma almofada com uma foto em que aparece abraçado ao pai, abriu um sorriso e mostrou para o Correio: ;É o meu melhor amigão;. Brincou com a espada e jogou Angry Birds no computador.
Em virtude do trauma decorrente do tiro que atingiu o pulmão, Luís inspira cuidados constantes. O pai do menino, Erlon Caxias, 29, comenta que, durante esse período, o filho perdeu cerca de 7kg. ;Você sabe o que é ir em casa buscar roupa para seu filho e, quando for colocar, a roupa cair?;, indaga. A família se mantém receosa, com medo de que, a qualquer momento, precise voltar ao hospital. ;Estou em casa com o coração apreensivo, porque não sei quantos dias vai durar essa alta. Da primeira vez, ficamos somente 24 horas no nosso lar;, aflige-se a mãe.