O Conselho Tutelar de Santa Maria I acompanha, desde 2014, a situação de uma menina de 14 anos que foi flagrada nua com um homem de 38 anos dentro de um carro em Santa Maria na quarta-feira (15/3). Segundo a Polícia Militar, a garota gritava por socorro e, por isso, o homem foi levado à 20; Delegacia de Polícia (Gama), suspeito de estuprar a menor. No entanto, ao ouvir o testemunho da suposta vítima e de uma tia dela, o delegado decidiu encerrar o caso, pois se tratava de sexo consentido. A menina confirmou, segundo a Polícia Civil, que fazia um programa por R$ 20.
De acordo com a Polícia Civil, como a menina tem 14 anos e concordou com a relação sexual em troca de dinheiro, o caso não pode ser considerado estupro de vulnerável (quando alguém faz sexo com menores de 14 anos ou sem possibilidade de consentir na relação). Assim, o suspeito, que tem passagem pela polícia, por episódio enquadrado na Lei Maria da Penha, foi liberado.
O Conselho Tutelar vai apurar se houve negligência da delegacia, por não ter encaminhado a adolescente ao exame de corpo de delito. Wesley Santos, conselheiro tutelar responsável pela pasta da menina, afirmou que ela tem histórico de exploração sexual e vulnerabilidade social. "Elá já recebeu várias medidas de proteção desde que vem sendo acompanhada, o que acontece desde maio de 2014", comenta. A Divisão de Comunicação da Polícia Civil informou que, como o delegado entendeu que não houve crime, não foi feito registro de ocorrência.
Crime de estupro
O presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas do Distrito Federal (Abracrim-DF), Michel Saliba, confirma a avaliação do delegado. Segundo ele, o caso da menina de Santa Maria foi baseado no Artigo 213 do Código Penal e, de fato, não se qualifica como estupro. "Nesse caso há o testemunho da suposta vítima, que se coloca como partícipe do ato sexual, por isso, não há crime de estupro, nem mesmo de aliciamento, já que ela receberia por isso", explica o advogado. "No máximo, houve ato obsecno em público, já que estavam dentro de um carro", acrescenta.
[SAIBAMAIS]No entanto, Saliba lamenta que menores se submetam à prostituição e que não haja punição prevista. ;Existe uma crise educacional e social pela qual o país passa, que faz com que uma menina de 14 anos se prostitua por R$ 20;, diz. Ele defende que a evolução dos costumes dos jovens não deve ir na contramão da proteção de adolescentes, e que o crime de estupro de vulnerável deveria ter uma margem de idade mais ampla. ;Talvez a prostituição infantil seria coibida se a idade para caracterizar estupro presumido fosse maior que 14 anos;, opina.
O especialista esclarece que, até 2005, casos semelhantes eram qualificados como "crime de sedução", baseado no extinto artigo 217 do Código Penal. No entanto, a lei foi revogada sob a alegação de ter perdido sua objetividade jurídica. "Atualmente, entende-se que uma pessoa com 14 anos ou mais não é facilmente induzida ao erro para manter conjunção carnal", explica. "Por isso, o não indiciamento por estupro (no episódio de Santa Maria) está correto", avalia.
Considerado hediondo, o crime de estupro acontece quando o acusado obriga a vítima a manter relações sexuais sem seu consentimento. Uma mudança na redação do Código Penal, em 2009, passou a classificar como "crime de estupro de vulnerável" todo e qualquer ato sexual praticado por adultos com menores de 14 anos, independentemente da vítima ter supostamente "consentido". O crime é tipificado ainda que não tenha havido penetração.
A pena para quem comete esse crime varia entre 8 e 15 anos. Pode chegar a até 30 anos de detenção se a vítima morrer em decorrência do estupro. Nas ocorrências em que a vítima tem idade superior a 14 anos, a sentença é mais branda. Começa em 6 e vai até 10 anos de reclusão, aumentando para 8 a 12 anos se houver lesão corporal da vítima.
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