Cidades

Mãe que jogou bebê no lago conversa com o Correio: "não quero ver ninguém"

Elisângela Cruz dos Santos Carvalho, 36 anos, prestou depoimento à polícia nesta quarta-feira (12/4); ela deve responder em liberdade

Adriana Bernardes, Paula Pires - Especial para o Correio , Isa Stacciarini
postado em 13/04/2017 06:00

Elisângela Cruz dos Santos Carvalho, 36 anos, mãe do bebê Gabriel, 5 meses, encontrado morto no Lago ParanoáOs olhos inchados de choro, gestos lentos e distanciamento da realidade. Assim foi o encontro do Correio com Elisângela Cruz dos Santos Carvalho, 36 anos, mãe do bebê Gabriel, 5 meses, encontrado morto no Lago Paranoá, no último domingo (9/4). Elisângela estava em choque, não encontrava explicação ou motivo para ter jogado Miguel da Ponte JK na noite da última sexta-feira. ;Eu fui covarde de não ter ido junto;, lamentava, como se estivesse anestesiada.

O depoimento de Elisângela à polícia demorou cerca de três horas. Pelo estado psicológico em que foi encontrada, o delegado-chefe da 10; Delegacia de Polícia (Asa Sul), Plácido Rocha, achou melhor interrogá-la na presença de uma psicóloga da Polícia Civil. ;Vou pedir a prisão preventiva dela. Com o pedido, vou anexar um laudo da psicóloga e um vídeo de Elisângela para que o juiz possa avaliar o caso;, detalhou o investigador.

Elisângela não foi presa em flagrante, não tem antecedentes criminais e há registro de residência fixa. Esses são alguns requisitos para que ela responda pelo crime em liberdade. ;O juiz tem três caminhos em casos como esse: mandá-la para internação, negar o pedido de prisão ou determinar que ela seja recolhida ao presídio feminino;, afirmou o delegado.

Seja qual for o destino de Elisângela, para ela, a vida, de agora em diante, se resume a uma palavra: solidão. ;Não quero ver ninguém, não quero falar com ninguém. Não tenho coragem de ver a minha família. Só queria conversar com a minha filha (a mais velha);, diz. Nesse momento, a mulher de cabelos e olhos negros e pele morena se emociona: ;Na hora, eu ia dizer (para a menina)... Não quero falar agora;, disse, praticamente sussurrando, com os olhos fixos no chão e esfregando uma mão na outra.

Nos 13 minutos em que a reportagem conversou com Elisângela, ela permaneceu na mesma posição. Na mesa da sala onde prestou depoimento, havia um pacote de bolacha de água e sal e um copo d;água, oferecidos pelos agentes. Perguntada sobre o que pensou nos últimos cinco dias, ela resumiu: ;Eu não pensei em nada, a minha cabeça estava ;vazinhiinha;. É como se eu olhasse para essa parede, visse esse tijolo e ele parasse dentro da minha cabeça. Eu não pensava em nada nem em ninguém. Eu só acordava e dormia;.

O editor de vídeo Ferdinand foi à QL 26 do Lago Sul para fazer fotos e viu Elisângela em uma árvore:

Desequilíbrio

Foi o editor de vídeo Ferdinand André Sousa da Silva, 40 anos, quem encontrou Elisângela e comunicou às autoridades. Ele tinha ido à QL 26 do Lago Sul, à beira do lago, para fotografar, ainda pela manhã, quando percebeu que havia uma pessoa em cima de uma árvore. ;Eu me aproximei e perguntei de onde ela era. Ela disse que era do Maranhão e não soube explicar como chegou até lá em cima, mas falou que não queria descer de lá. Ela não falava coisa com coisa;, contou.

Ferdinand pensou que se tratava de uma moradora de rua, mas estranhou a situação. À tarde, após providenciar um lanche para a mulher, ele ligou para a polícia. Até então, o editor de vídeo não imaginava que Elisângela poderia ser a mãe do bebê que morreu no Lago Paranoá. ;Não fiquei assustado, mas estranhei. Achei que podia ser uma moradora de rua com medo de dormir embaixo por causa dos animais. Aparentava estar bem cansada e faminta;, destacou.

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Elisângela estava no terreno de uma casa desocupada, na QL 26 do Lago Sul, havia pelo menos cinco dias. O imóvel está à venda. A sede do partido Pros é vizinha à residência. Acredita-se que ela teve acesso ao terreno pela orla do espelho d;água. No momento em que os policiais militares chegaram ao local, Elisângela vestia jeans e blusa vermelha. Sob a árvore, havia uma bolsa. Dentro dela, os PMs encontraram uma carteira preta, um cartão telefônico, R$ 3 em moedas e um sutiã. Como não havia documentos, é prematuro dizer que tudo pertencia a Elisângela, segundo os policiais.

Os policiais, então, chamaram o Corpo de Bombeiros para recolhê-la, pois, além de abatida, dava sinais de desorientação. A mulher soube apenas informar o primeiro nome. Afirmava não saber quem era a mãe dela nem que tinha filhos. Em seguida, levaram-na para a 10; DP, onde prestou depoimento. A família contratou um advogado para defender Elisângela. Para ele, a cliente está em estado de desequilíbrio. ;A princípio, trata-se de um crime de infanticídio, quando a mãe mata o filho no parto ou durante o estado puerperal;, argumentou Onildo Gomes.

O corpo de Miguel foi necropsiado e liberado. Ontem pela manhã, um parente esteve no Instituto de Medicina Legal (IML) para pegar o atestado de óbito. A previsão é de que o enterro ocorra hoje pela manhã, no Cemitério do Gama. As investigações continuam hoje com o depoimento do ex-marido de Elisângela Iturialdi da Silva na 10; DP. Até o fechamento desta edição, a decisão da Justiça sobre o futuro da mulher não havia sido divulgada.

Lili

Uma mulher pacata, de poucas palavras e tranquila. É assim que os vizinhos de Elisângela Cruz traduzem o comportamento da mãe do pequeno Miguel, chamada carinhosamente de Lili pelos mais próximos. Ela mora em uma sobreloja, ao lado de uma barbearia, na área comercial de Santa Maria, com o ex-marido Iturialdi da Silva, os ex-sogros e mais dois filhos, um menino, de 4 anos, e uma menina, de 11 anos.


Linha do tempo


7 de abril

Às 12h ; Elisângela Cruz dos Santos sai de casa, em Santa Maria, com dois dos três filhos: Miguel,
5 meses, e Pedro (nome fictício),
4 anos.

8 de abril
Às 14h ; A família registra ocorrência sobre o desaparecimento de Elisângela. No mesmo dia, Pedro aparece na porta de casa, sozinho e não sabe dizer o que aconteceu nem onde esteve.

Entre 7 e 9 de abril

Elisângela manda uma mensagem por WhatsApp para o grupo de família dizendo que fará ;uma viagem sem volta; e pede perdão.
9 de abril

Às 17h30 ; O empresário André Bello, 35 anos, pilota um jet ski, vê o corpo
de um bebê boiando no Lago Paranoá e avisa o Corpo de Bombeiros. Uma equipe resgata o corpo de Miguel da água e encaminha para o Instituto de Medicina Legal (IML).

10 de abril
Com a repercussão do caso, a família procura a Polícia Civil e reconhece o corpo de Miguel.

11 de abril
Familiares prestam depoimento na 10; DP (Lago Sul).

12 de abril

Às 15h10 ; A denúncia de que uma mulher está no terreno de uma casa em construção, na QL 26 do Lago Sul, chega à Ciade. A PM vai ao local e identifica Elisângela. Ela está em choque, em cima de uma árvore e há vários dias no local.

Às 15h50 ; Elisângela é encaminhada para a 10; DP (Lago Sul), onde presta depoimento.

Às 19h15 ; Termina o depoimento de Elisângela. Ela confessa que matou o filho, jogando-o da Ponte JK. O delegado pede à Justiça a prisão preventiva da mulher.

Às 20h ; O advogado contratado pela família chega à delegacia e se reúne com o delegado da unidade.

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