Cidades

Mudança na imunização contra a febre amarela gera dúvidas

Ao seguir a recomendação da OMS e fornecer apenas uma dose da vacina contra a febre amarela, governo brasileiro gerou dúvidas. Na capital federal, 188 mil pessoas foram protegidas desde janeiro

Otávio Augusto
postado em 22/04/2017 10:02
Já imunizada, Gislaine foi ao posto de saúde em busca da segunda dose As placas improvisadas em alguns postos de saúde alertam: a vacinação contra a febre amarela mudou. Apesar do aviso, muita gente não compreendeu o novo protocolo de imunização. Agora, o Ministério da Saúde disponibiliza apenas uma dose da vacina. A regra é a mesma que a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda desde 2014. Na capital federal, 188 mil pessoas foram protegidas desde janeiro. Após ser notificada pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI), a Secretaria de Saúde divulgou uma nota técnica detalhando as alterações. Na capital federal, este ano, houve a notificação de 41 suspeitas ; em 2016 ocorreram 21. A morte de 37 macacos é investigada.

Nas salas de vacinação, muitos pacientes buscam explicações. Um dos casos é do auxiliar administrativo José Carlos Silva de Arantes, 56 anos, que procurou o Centro de Saúde n; 14 do Cruzeiro. Ele é do tempo em que, quando se visitava Brasília, a imunização ocorria nos ônibus e aviões. ;A enfermeira abordava os viajantes com uma caixa de isopor;, lembra. Na caderneta, José Carlos tem uma dose da vacina contra a febre amarela aplicada há oito anos. ;Estou imune, mas só fiquei tranquilo quando a enfermeira me explicou.;

Seguro

Pela nova regra, crianças e adultos tomam uma dose e não precisam se vacinar mais contra a doença ao longo da vida. Antes, era aplicado um reforço após 10 anos em adultos ou aos 4 anos em crianças. Entretanto, a mudança repentina gerou revolta em alguns pacientes. Uma mulher chegou a ameaçar de chamar a polícia para garantir a segunda dose da vacina. O caso ocorreu em Taguatinga. Para controlar a situação, uma enfermeira vacinou a paciente, mesmo sem necessidade.

Apesar da apreensão das pessoas e das dúvidas nos postos de saúde, especialistas descartam qualquer risco com a redução das doses. O motivo é que a vacina contra febre amarela é produzida com o vírus vivo, o que faz com que a produção de anticorpos permaneça ativa ao longo da vida. A imunização é a medida mais importante para prevenção e controle da doença e apresenta eficácia de 95% a 99%, além de ser cientificamente eficaz e segura.

Marta Pereira de Carvalho, especialista em doenças imunopreveníveis atua no setor há mais de 20 anos. Ela explica que a tecnologia da vacina, ou seja, como ela é produzida, não mudou, mas que rotineiramente passa por atualizações. ;Hoje, temos mais estudos e base científica para observamos o comportamento do vírus e da vacina. Os virologistas e epidemiologistas estão seguros de que somente uma dose é suficiente para a proteção;, conclui.

O recado de Pedro Tauil, especialista em controle de doenças do Núcleo de Medicina Tropical da Universidade Brasília (UnB), é ainda mais enfático. ;As pessoas podem ficar tranquilas. A OMS não seria irresponsável de pôr em prática no mundo inteiro um protocolo que colocaria a população em risco;, pondera. Há mais de quatro décadas o professor acompanha a evolução da doença. Para ele, os transtornos tendem a diminuir nas próximas semanas. ;Com informações mais claras, o paciente fica descansado;, acredita.

Busca de informação

Mesmo sem se conhecerem, a cabeleireira Gislaine de Moura, 57, e a estudante de enfermagem Leopodina Chacon, 51, carregam as mesmas dúvidas. A primeira está vacinada, a outra não tem certeza. ;Ia tomar a segunda dose, mas, com a mudança, não precisa mais;, conta Gislaine, vacinada há nove anos. O olhar desconfiado de Leopoldina não engana. Além de não saber do protocolo de imunização, não tem certeza se já tomou alguma dose. ;Vou procurar o posto de saúde para me orientar;, disse.

A mudança ocorre no momento em que a série histórica da doença atinge níveis jamais alcançados. O ministro da Saúde, Ricardo Barros, garantiu durante o anúncio da mudança, na semana passada, que opção pela dose única não tem ligação com o aumento da procura pela vacina. ;Isso nos permitirá atender mais rapidamente aqueles que nunca se vacinaram;, ressalta.

A Secretaria de Saúde do DF tem, no estoque, 7,5 mil doses e deve receber nova remessa nos próximos dias. Na capital federal, o serviço terá adequações particulares. ;Crianças entre 6 e 8 meses de idade não receberão dose única. Nessa faixa etária, a imunidade é curta, por isso, a criança que já se vacinou vai receber um reforço aos nove meses de idade;, adianta a gerente de Vigilância Epidemiológica e Imunização, Olga Maíra Machado Rodrigues.

Para saber mais

Fracionamento das doses

O Ministério da Saúde está preparando a rede pública para um possível fracionamento das doses da vacina contra a febre amarela. Se adotada, a medida servirá para conter a expansão da doença nas regiões metropolitanas que precisarem de bloqueio. O fracionamento tem caráter preventivo e é adotado quando há aumento de casos de febre amarela silvestre de forma intensa, com risco de expansão em cidades com elevado índice populacional, como no caso de Salvador, São Paulo e Rio de Janeiro, que não têm recomendação permanente para vacinação. O Ministério da Saúde reforça que a dose fracionada é tão eficaz quanto a vacina na dose-padrão, mas o tempo de proteção é de um ano. Atualmente, o Ministério da Saúde usa a dose feita com 0,5ml. A dose fracionada conta com um quinto desse volume. Um frasco com cinco doses do imunizante, por exemplo, pode vacinar 25 pessoas.

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