Cidades

Polícia pode rever acusação de homem que atropelou e matou dois jovens

Um dia após amigos dos dois jovens atropelados no meio-fio protestarem em frente à DP, porta-voz da instituição diz não haver impedimento para o delegado alterar a tipificação de homicídio culposo para doloso

Ketheryne Mariz/Diário de Pernambuco, Otávio Augusto
postado em 02/05/2017 06:57
O corpo de Daniel foi velado ontem, em Brasília e será sepultado hoje no Rio de Janeiro, sua cidade natal
Acusado de furtar um carro, atropelar e matar dois amigos, sentados em um meio-fio, Fernando Salvador Souza Rodrigues, 18 anos, continuava preso até a noite de ontem. O acidente aconteceu na madrugada de sábado. Após se manifestarem em frente a delegacia responsável pelo caso, amigos das vítimas estão esperançosos que o delegado altere a tipificação do crime, que inicialmente foi considerado como homicídio culposo (quando não há a intenção de matar). Eles entendem que ficou claro o homicídio doloso (com culpa). A diferença maior está na pena. Caso seja condenado no segundo entendimento, o suspeito pode ficar até 30 anos preso, a pena máxima.

A explicação para a decisão do delegado da 6; Delegacia de Polícia (Paranoá), segundo o também delegado e diretor da Divisão de Comunicação da Polícia Civil do Distrito Federal, Miguel Lucena, seria a versão dada pela única testemunha ouvida na manhã de sábado. Após o depoimento do rapaz que conseguiu escapar do atropelamento, o delegado responsável pelo caso teria entendido que o crime era um homicídio culposo. ;A única pessoa que testemunhou no dia disse que o motorista estava em alta velocidade e teria tentado desviar dela (única pessoa em pé) e, nisso, acabou acertando em cheio os dois jovens sentados;, comentou Lucena.

No entanto, ainda de acordo com Lucena, não há nenhum impedimento para que o delegado, depois de ouvir outras testemunhas, altere a tipificação de homicídio culposo para doloso. ;O próprio delegado poderá alterar, assim como o Ministério Público poderá oferecer uma denúncia na ação penal;, ressaltou.
Amigos do comerciante Daniel Barreto Batista, 28 anos, um dos mortos, se despediram dele ontem. Cerca de 100 pessoas estiveram no velório, no Cemitério Campo da Esperança. Depois da cerimônia, o corpo foi levado para o Rio de Janeiro, a terra natal dele. ;A mãe e o irmão de Daniel ainda estão confusos com tudo que aconteceu. Ele era uma pessoa carismática. Estávamos juntos há quase quatro anos;, contou o companheiro da vítima e auditor fiscal Adriano Andrade, 45 anos. Na manhã de hoje, será realizado o enterro do comerciante, que também estudava direito na Unip, em Brasília.

Cavalo de pau

O acidente aconteceu por volta das 4h de sábado, na Avenida Principal do Jardins Mangueiral. O veículo, um Hyundai i30 preto, pertencia a Daniel. Ele e o amigo Douglas Araujo Silva, 21 anos, estavam sentados em calçada quando um terceiro rapaz, Fernando Salvador Souza Rodrigues, que dirigia o carro de Daniel, avançou com o veículo sobre as vítimas, que morreram na hora.

Segundo a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), o i30 teria sido roubado por Fernando minutos antes. Sargento da corporação, Wellington Godoy, que atendeu a ocorrência, a tragédia aconteceu após Daniel e Douglas saírem de uma festa, que ocorria na casa de um deles, na Quadra 12 do conjunto habitacional, na companhia de um terceiro jovem, identificado apenas como Lucas.

;O Daniel percebeu que o telefone havia sumido, pegou o carro com amigos e foi procurar um grupo de jovens, que deixou o local mais cedo e poderia ter pegado o aparelho;, comentou o sargento. Na sequência, o trio encontrou os suspeitos, desceu do carro, deixando o veículo ligado e aberto, e questionou o grupo sobre o telefone.

Após o questionamento, o grupo, formado por cerca de 10 pessoas, teria atacado os amigos. ;Acreditamos que, devido aos machucados da briga, eles sentaram no meio-fio. Foi aí que o Fernando pegou o veículo, deu cavalos de pau na via e acelerou na direção do Douglas e do Daniel;, completou o militar. O terceiro amigo, que estava mais afastado, não foi atingido.
Comoção e indignação

Além do clima de comoção, ontem, no velório de Daniel, os amigos mostraram indignação quanto à decisão do delegado responsável pelo caso. Para o amigo da vítima e colega de classe Eldes Lopes, 49, os demais amigos têm que se posicionar e não perder o foco para que haja a mudança de homicídio culposo para doloso. ;Quando acontece com alguém próximo a gente, percebemos que não é só acidente, é também irresponsabilidade. Ele (Fernando) estava alcoolizado e sem habilitação quando atropelou os dois;, desabafou.

Alguns amigos aproveitaram o momento para exaltar as qualidades do estudante de direito. ;Daniel era a pessoa mais boa e bem-humorada que eu já conheci. Ele tinha muito amor por cachorros, sempre ia a feiras de exposição de animais e guardava algumas rações para, na volta para casa, distribuir onde tinha cachorros de rua. Ele era tão bom que até meus vizinhos o conheciam e estão em choque. Daniel era muito sozinho aqui, o que, de certa forma, fez com que acabasse agregado às famílias de todos que viviam com ele;, contou Eldes.


Depoimento
Agressões, furto e mortes


;O Daniel desceu do carro e começou a conversar com os meninos. No meio da conversa, o Douglas conseguiu identificar o celular dele estava com um dos garotos, que começou a ir embora. O Daniel, então, jogou o carro um pouquinho mais para a frente e conseguiu conversar. Nesse momento, cerca de uns 10 meninos partiram para cima dele e do Douglas. Cheguei a tirar alguns de cima do Douglas e o coloquei de lado. Depois, vi que o Daniel também estava apanhando e tirei os agressores de cima dele e o coloquei sentado no meio-fio do canteiro central. Ele tinha deixado a chave do carro na ignição. Aí, o Fernando, o autor do crime, entrou no carro e começou a acelerar. Eu ainda falei: ;Daniel, estão levando o seu carro;. Ele respondeu: ;Deixa levar;. Quando a gente olhou, o carro estava vindo a toda velocidade para cima da gente. Consegui desviar, mas, quando olhei, o corpo do Douglas já estava no chão; o do Daniel, do outro lado do carro. Gritei para chamarem a ambulância, mas todos saíram correndo, não ficou ninguém. Quando a ambulância chegou, o Daniel ainda tinha pulso. Eles tentaram reanimar os dois, mas não conseguiram. O Fernando devia estar a 170km/h na hora que ele jogou o carro pra cima da gente. Nunca tínhamos visto esse menino. Ele nem estava na festa.;

Testemunha do atropelamento, que pediu para não ter o nome divulgado

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