Cidades

Especialistas discutem sobre MP que muda sistema fundiário no DF

Quem comprou terreno irregular até 22 de dezembro de 2016 vai poder ficar com ele sem participar de licitação, pagando pela área nua

postado em 04/05/2017 06:00
Derrubada em Vicente Pires: ocupantes de terrenos irregulares  pertencentes à União serão beneficiados

Nesta quinta-feira, o governador Rodrigo Rollemberg assina dois decretos voltados para situação fundiária do Distrito Federal. Um trata da regulamentação da venda direta de condomínios para lotes ocupados e outra regulamenta o Certificado de Regularização Fundiária no DF. A cerimônia ocorrerá no Salão Nobre do Palácio do Buriti.

O primeiro passo do processo de venda direta dos terrenos dos condomínios para moradores será o cadastramento. Os interessados deverão comprovar que ocupavam o lote até 22 de dezembro de 2016 e não podem ter outra propriedade residencial no Distrito Federal. Após isso, será feita a avaliação do imóvel e a venda direta.

A previsão é que até 1; de junho, o Congresso Nacional vote a proposta que deve remodelar o sistema de regularização fundiária urbana e rural. Ontem, a Comissão Mista responsável pela avaliação do projeto aprovou, por 16 votos a 4, o relatório do senador Romero Jucá (PMDB-RR) relativo às 722 emendas apresentadas à Medida Provisória, sancionada pelo presidente Michel Temer em dezembro de 2016. Algumas alterações previstas afetam diretamente o Distrito Federal, onde 22,15% dos domicílios estão em terrenos irregulares. Entre uma das medidas, a proposição permite que quem adquiriu, até 22 de dezembro do ano passado, lotes em condomínios irregulares, localizados áreas públicas, e os mantêm desocupados, também terá o direito de se tornar o legítimo detentor do terreno. A regularização dispensará o processo licitatório ; a negociação ocorrerá diretamente com a Agência de Desenvolvimento do DF (Terracap).

Em aspectos financeiros, se aprovado, o projeto de lei de conversão determina que, do cálculo da venda, abata-se o montante relativo à valorização das terras decorrente de benfeitorias. Ou seja, será avaliado como a disposição de esgoto, o asfaltamento das vias e demais serviços de infraestrutura afetam a cotação do terreno, por exemplo. Ademais, fica vedado ao GDF o repasse de terras por valores superiores àqueles cobrados pela Secretaria de Patrimônio da União. Assim, se a Terracap recebe uma área pelo custeio de R$ 100 mil, não poderá vendê-la por R$ 250 mil.

A proposta ainda garante que os ocupantes de terrenos irregulares do DF que pertencem à União possam apresentar à Secretaria de Patrimônio uma Proposta de Manifestação de Aquisição, para formalizar o interesse pelo imóvel. O documento deverá conter, junto à identificação do terreno e do dono, a comprovação do período de ocupação; comprovantes de pagamentos de taxas; avaliação da casa e das benfeitorias e proposta da quitação. A regulamentação também permite que mais de uma unidade habitacional seja construída no mesmo terreno. Portanto, quem mora no primeiro andar teria um registro e quem mora no segundo, outro. Por fim, o dono das terras poderá vender a outra pessoa o direito de construção de uma laje no imóvel, desde que a legislação urbanística da cidade e o projeto do imóvel prevejam e permitam a construção.

Para o professor de direito privado da Universidade de Brasília (UnB) Frederico Henrique Viegas, a nova legislação trará benefícios para a situação de terrenos irregulares na capital. ;Em termos de regularização fundiária, o projeto apresenta situações adversas que, se não foram desenhadas para o DF, adequam-se perfeitamente ao cenário local;, destaca. Ele classifica a regulamentação como positiva, pois permite a áreas já consolidadas, como condomínios, a total regularização. ;Se, de fato, o governo colocá-la em prática, vai conseguir atingir bons resultados.; Viegas ressalta ainda que a medida pode regularizar 85% dos imóveis em áreas públicas no DF. ;Continuam impossibilitados aqueles localizados em áreas de preservação ambiental ou em locais que nunca poderiam ser ocupados;, explica.

Planejamento


O Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-DF) pensa diferente. ;É uma matéria que vem sendo motivo de lutas de movimentos sociais, de litígios, com duração de, no mínimo, 46 anos de trabalhos. O primeiro ponto que se pode enfatizar é que uma MP que trata de temas tão sensíveis e revoga uma legislação existente de toda uma década de trabalhos não foi debatida com o tempo suficiente;, aponta o presidente da instituição, Célio Melis Júnior. Para ele, a medida não só interfere na questão urbana como no agronegócio. ;Quando se promete a regularização fundiária baseada na titulação, isso vem contra o planejamento urbano. Não se pensa na formação de cidades;.

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios também é contra a MP. De acordo com nota técnica emitida pelo órgão, a norma não exclui dos beneficiários pessoas que tomaram os terrenos de forma violenta, clandestina, precária ou de má-fé. ;A nova regra premia indivíduos que infringiram a lei e alimenta a cultura da regularização, que tolera e incentiva situações ilegais;, destaca o texto. Já a Terracap respondeu, por meio da assessoria de imprensa, que não se manifestará sobre o assunto até que a votação seja concluída no Congresso Nacional.

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