O acidente que matou mãe e filho na L4 Sul é resultado de um pega. Uma fonte da Polícia Civil confirmou ontem ao Correio que houve um ;racha improvisado;, no qual dois dos três veículos envolvidos na colisão ocorrida há oito dias ficaram emparelhados em um determinado trecho da pista para apostar corrida (leia Memória). ;É comum acontecer pegas em estradas de Goiás, em que os motoristas marcam horário, geralmente à noite. Mas, no caso do acidente da L4 Sul, os motoristas fizeram o pega não combinado e começaram a costurar pela via. O pior aconteceu, e o Fiesta acabou sendo atingido;, detalhou. Hoje, os sobreviventes da tragédia ; Osvaldo Clemente Cayres, 72, e Elberton Silva Quintão, 37 ; prestarão depoimento.
Segundo a fonte ouvida pela reportagem, o advogado Eraldo José Cavalcante Pereira, 34 anos, condutor do Jetta que atingiu a traseira do Fiesta; e Noé Albuquerque Oliveira, 42, sargento do Corpo de Bombeiros e enfermeiro da Secretaria de Saúde, que dirigia uma Range Rover Evoque, deverão ser indiciados por crime de racha, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro (CTB). A terceira motorista envolvida na investigação, a tenente do Exército Fabiana Albuquerque Oliveira, 37, irmã de Noé e condutora de um Cruze prata, não será denunciada.
Fabrícia de Oliveira Gouveia, viúva de Ricardo Clemente Cayres, uma das vítimas do acidente na L4 Sul, não se surpreendeu com a conclusão policial, principalmente por causa da destruição provocada no Fiesta ; a mãe de Ricardo, Cleuza Maria Cayres, 69, também morreu na colisão. ;Fico imensamente feliz por alguém ter confirmado. É uma luz no meio desse caos;, afirmou. ;Espero que o delegado agora tenha as provas que ele tanto buscava;, disse.
O laudo da perícia técnica será divulgado até o fim do mês, quando será revelada a velocidade máxima atingida pelos carros envolvidos na tragédia. ;Temos 30 dias para concluir o inquérito. Caso necessário, podemos solicitar a dilatação do prazo ao juiz. Quando concluído, será encaminhado ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), que pode pedir novas diligências, denunciar ou solicitar o arquivamento;, disse o delegado Ataliba Neto, responsável pelas investigações e adjunto da 1; Delegacia de Polícia (Asa Sul).
O advogado criminalista Alexandre Queiroz, que defende os motoristas Eraldo José Cavalcante Pereira e Noé Albuquerque Oliveira, argumentou que somente com o resultado da análise técnica será possível confirmar se houve o racha. Para ele, é um caso extremamente difícil de ser esclarecido apenas com provas testemunhais. Por telefone, ele comentou, ainda, que a polícia colheu ;muitas declarações frágeis;. ;Em nome dos meus clientes, não vou me pronunciar até o final das investigações;, concluiu.
Indiferença
De acordo com o Código Brasileiro de Trânsito, os responsáveis por dirigir e fazer pegas em vias públicas que resultem em morte podem pegar de 5 a 10 anos de detenção, além de multa e suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Segundo o advogado criminalista Cleber Lopes de Oliveira, no crime de racha que resulta em morte, há dolo na prática da conduta inicial e culpa no resultado. ;Chamamos isso de crime preterdoloso, ou seja, o motorista tem a vontade dirigida para a prática do racha, mas não admite a ocorrência do resultado mais grave. Claro que pode haver um caso em que, diante das circunstâncias, seja possível considerar que o motorista, além de prever o resultado mais grave, agiu com indiferença à sua ocorrência;, observou.
Para o advogado, ;como não houve prisão em flagrante, a regra é que os acusados respondam ao processo em liberdade;. Quanto à CNH, o especialista explicou que ;o juiz também pode suspender o direito de dirigir durante o processo, como uma medida cautelar. Em caso de condenação, poderá determinar a suspensão como pena. Nesse caso, haverá a detração do tempo da suspensão imposta como medida cautelar.;
Motoristas embriagados
Onze motoristas foram presos por embriaguez ao volante neste fim de semana. Em operação conjunta nas madrugadas de sábado e de domingo, o Departamento de Trânsito (Detran), o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) e a Polícia Militar autuaram 191 motoristas dirigindo depois de consumir bebida alcoólica. Somente nos três primeiros meses deste ano, 4.834 condutores foram autuados por dirigirem após ingestão de álcool. É o equivalente a cerca de 53 multas por dia. Os dados do Detran mostram, ainda, um crescimento de 36,5% na comparação com o mesmo período do ano passado, quando 3.068 infrações foram registradas.
Memória
Tragédia pós-festa
Na noite de 30 de abril, às 19h30, três veículos suspeitos de participarem de um racha provocaram um acidente na Avenida L4 Sul, próximo à Ponte das Garças. Os motoristas de um Cruze prata, um Jetta preto e uma Range Rover Evoque são acusados de envolvimento no possível pega. O Jetta se chocou contra a traseira do Fiesta da família Cayres, que retornava de um evento dominical. Com a batida, o Fiesta perdeu o controle, saiu da pista e capotou diversas vezes. Cleuza Maria Cayres, 69, e Ricardo Clemente Cayres, 46, morreram no local (fotos). Os motoristas de dois carros envolvidos foram ouvidos pela polícia no dia seguinte à tragédia. Noé Albuquerque Oliveira negou que estivesse fazendo racha e confirmou que os três voltavam de uma festa comemorada durante todo o dia em uma lancha no Lago Paranoá. No depoimento, ele disse ter ingerido uma lata de cerveja, mas não fez o teste do bafômetro. Eraldo Pereira fugiu sem prestar socorro. E também negou à polícia que estivesse participando de pega. Fabiana Oliveira foi a única a ficar no local do acidente, mas também evitou o teste do bafômetro.