Cidades

Operação Panatenaico: sistema de transporte está sob suspeita de fraude

Delação de ex-executivo da Andrade Gutierrez revela repasses supostamente irregulares para empresas indicadas pelo ex-vice-governador Tadeu Filippelli. Uma delas foi responsável pela licitação de 2011, questionada pelo MP

postado em 01/06/2017 06:00
Terminal do BRT Sul: consultora indicada por Filippelli aparece na elaboração dos sistemas expresso e básico do DF

Dois episódios relativos ao transporte público urbano, com supostas irregularidades, se cruzam na trajetória da última gestão do Distrito Federal encabeçada pelo ex-governador Agnelo Queiroz (PT) e pelo ex-vice-governador Tadeu Filippelli (PMDB). O acordo de leniência ; uma espécie de delação premiada das empresas ; da Andrade Gutierrez apresenta elementos que conectam as fraudes do BRT Sul à consultora Logit, integrante do consórcio responsável pela condução do processo licitatório de 2011 que dividiu a prestação do serviço rodoviário de Brasília em cinco bacias. As empresas Marechal, Piracicabana, Pioneira, Expresso São José e Urbi venceram o certame.
De acordo com o depoimento do ex-diretor da Andrade Gutierrez Rodrigo Ferreira Lopes, em meio às negociações do sistema de transporte expresso, a empreiteira firmou contrato simulado, no valor de R$ 900 mil, com a consultora Logit, a pedido de Filippelli ; o acordo serviria para ocultar a verdadeira destinação do montante, ainda em investigação do Ministério Público Federal (MPF).
[SAIBAMAIS]Sob a justificativa do recebimento de consultorias em engenharia de tráfego e mobilidade urbana, a Andrade Gutierrez realizou o repasse por meio de três boletos de R$ 300 mil, cada. Dois deles mencionam estudos relativos ao ;Arco do Tietê, em São Paulo;. A empresa, inclusive, é paulista e fica no bairro de Pinheiros. Firmado em 21 de outubro de 2013, o contrato é assinado pelo delator Rodrigo Ferreira e pelo sócio-proprietário da Logit Wagner Colombini Martins.
Segundo o ex-executivo da Andrade Gutierrez, os contratos simulados eram um dos formatos pelos quais Filippelli recebia propina da empreiteira ; os valores indevidos ainda seriam remetidos por meio de doações oficiais ou em espécie. A construtora também firmou acordo com a AB Produções ; Canto do cerrado filmes, por R$ 1,6 milhão, indicada pelo ex-vice-governador.

Honorários

A participação da Logit era frequente na gestão de Agnelo Queiroz e Tadeu Filippelli. A empresa, assim como a Logitrans, integrou o consórcio responsável pela consultoria necessária à elaboração da licitação do novo sistema de transporte rodoviário. Após a escolha das cinco concessionárias, o certame chegou a ser anulado pela 1; Vara da Fazenda Pública em razão de indícios de irregularidades. Mas, posteriormente, derrubou-se a decisão.
Era responsabilidade do consórcio Logit/Logitrans a definição dos termos da política tarifária e de integração do transporte; da estrutura financeira e operacional; além dos aspectos jurídicos e institucionais para a gestão, regulamentação e fiscalização do programa; entre outros. À frente do projeto, estava o advogado Sacha Reck, consultor jurídico do quadro técnico do consórcio. A Logitrans tinha, entre os sócios, o pai de Sacha, Garrone Reck, e o irmão, Alexis Reck. A Logit era de propriedade de Wagner Colombini Martins, o mesmo sócio que assinou o contrato entre a empresa e a Andrade Gutierrez, anos depois, no BRT Sul.
O problema era que, à época, Sacha, supostamente, também defendia os interesses da Viação Marechal, empresa para qual havia prestado serviços de advocacia. Além disso, fazia parte do Comissão Permanente de Licitação de Brasília. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) acredita que o advogado tenha, assim, ajustado o projeto básico da licitação com base nas necessidades da Marechal.
Na denúncia, o MPDFT detalha que, durante o cumprimento dos mandados de busca e apreensão, foram encontrados comprovantes de pagamentos de honorários advocatícios feitos pela Marechal ao escritório de Sacha. Além disso, o órgão especíifica que, na fase de habilitação, a concessionária teria apresentado documentos em desconformidade com o edital, como documento inidôneo fiscal, atestado de capacidade técnica viciado, balanço patrimonial e demonstração de resultados inidôneos. Ainda assim, a empresa ;contou com a ajuda de Sacha, integrante da comissão de licitação, para corrigir os erros;, destaca a petição.

Operação Riquixá

Alvo de 13 ações judiciais na Justiça local e de dois processos no Tribunal de Contas do DF, Reck garantiu aos promotores no Paraná, na Operação Riquixá, que cometeu vários ;erros; em sua carreira, mas em Brasília foi diferente (leia Memória). A alegação está descrita em delação premiada, na qual o advogado admite irregularidades em dezenas de estados, como Paraná, Santa Catarina e São Paulo. ;Eu não sou mentiroso. É porque lá (no DF) estão caçando um crime que não foi cometido;, afirmou no depoimento prestado aos promotores Vitor Hugo Nicastro Honesko e Leandra Flores, que atuam em Guarapuava (PR). As informações foram prestadas em 13 de julho de 2016.
A Justiça levantou o sigilo da delação depois que o Ministério Público do Paraná apresentou, em março deste ano, denúncia contra o advogado, na qual o aponta como integrante de uma organização criminosa que atuava em vários municípios para fraudar licitações de transporte
Segundo as investigações, Reck agia desde a formulação do edital direcionado até o julgamento das propostas apresentadas pelas concorrentes, garantindo a contratação da empresa que pagava pelos serviços do seu escritório. As acusações foram confirmadas pelo próprio advogado.
A reportagem não conseguiu contato com a defesa de Tadeu Filippelli. O Correio ligou para o advogado do ex-vice-governador, Alexandre Queiroz, entre as 8h e as 22h de ontem. No entanto, não obteve resposta. Mensagens via WhatsApp foram enviadas ao longo do dia, mas a defesa do peemedebista não retornou até o fechamento desta edição. A reportagem também não conseguiu contato com o advogado Sacha Reck.

Alvo de uma CPI

Em 2015, a CPI do Transporte indiciou o advogado Sacha Reck, o empresário Wagner Colombini Martins, sócio-diretor da empresa Logit, e outras 15 pessoas pelas irregularidades identificadas no processo licitatório relativo à prestação do serviço básico rodoviário, que dividiu o Distrito Federal em cinco bacias. A investigação da comissão começou após o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) pedir à Justiça a suspensão dos contratos com as empresas de ônibus vencedoras do certame. Entre outras medidas, o relatório final recomendou que o MPDFT ajuizasse ações de improbidade administrativa. A votação terminou em três votos favoráveis e dois contrários à aprovação do parecer.

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