Isa Stacciarini
postado em 03/06/2017 08:00
O mesmo grupo de procuradores à frente da Operação Panatenaico, que investiga fraudes licitatórias nas obras do Estádio Nacional Mané Garrincha, investigará as supostas irregularidades cometidas nas construções do Centro Administrativo de Brasília (Centrad), em Taguatinga, e do Jardins Mangueiral, em São Sebastião. O Ministério Público Federal (MPF) no DF recebeu, nesta semana, as delações dos ex-executivos da Odebrecht, que serão cruzadas com os depoimentos da Andrade Gutierrez. Na prática, a partir de agora, as provas levantadas serão usadas em todas as denúncias de recebimento de propina, desvio de dinheiro público e corrupção nos principais empreendimentos da capital federal nos últimos anos.
As informações reunidas a partir da investigação sobre o Mané Garrincha estão nas mãos dos procuradores da República Francisco Guilherme Bastos e Ivan Marx. Aquelas relacionadas ao Centrad foram entregues para Frederico de Carvalho Paiva, integrante do mesmo grupo de trabalho da Panatenaico ; ele aguarda as do Mangueiral. Além disso, haverá novas oitivas, pois os procuradores pretendem preencher as lacunas abertas com as primeiras delações homologadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Esses dados serão utilizados na edição da possível ação penal contra os ex-governadores José Roberto Arruda (PR) e Agnelo Queiroz (PT), além do ex-vice-governador Tadeu Filippelli (PMDB).
Nesse meio tempo, em relação à Panatenaico, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal consideram pedir a prisão preventiva de alguns dos alvos da operação, principalmente dos apontados como ;caciques; do suposto esquema de corrupção. A requisição, contudo, depende dos materiais apreendidos, na última quinta-feira, na Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap). Por força da Panatenaico, além de Arruda, Agnelo e Filippelli, acabaram presos por agentes federais mais sete investigados por supostas fraudes nas obras do Estádio Nacional Mané Garrincha. São ex-presidentes de estatais, suspeitos de agir como emissários de propina e diretores de empreiteiras.
Na primeira etapa da ação, os policiais apreenderam dinheiro supostamente ilícito, tabelas de rateio de propina e documentos relativos a pagamentos suspeitos. Também foram recolhidos celulares, computadores e pendrives nas casas dos acusados. Além da arena esportiva, do Centrad e do Jardins Mangueiral, estão na mira do órgão a construção do BRT Sul e o legado urbanístico em torno do estádio.
Sob suspeita
A gestão de Rodrigo Rollemberg (PSB) também investiga as irregularidades. A Controladoria-Geral do DF criou, em abril, o Grupo de Ações Integradas de Controle (Gaic) para identificar os envolvidos e responsabilizá-los. Após um mês de averiguações, o órgão instaurou 26 processos administrativos contra fornecedores e instalou um procedimento de investigação preliminar (PIP), que segue sob sigilo (leia Memória). O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) também apura as supostas ilegalidades cometidas no Mané Garrincha ; a suspeita é de que a arena de R$ 1,5 bilhão foi superfaturada em R$ 900 milhões e provocou prejuízos de R$ 1,3 bilhão à Terracap.
Os ;modelos de operação; relativos às supostas fraudes são similares. De acordo com as delações dos ex-executivos da Andrade Gutierrez e da Odebrecht, Arruda teria arquitetado um cartel entre as empreiteiras: grandes construções da capital seriam divididas de forma igualitária, em troca do recebimento de um percentual de propina sobre o valor das obras. Na gestão seguinte, de Agnelo e Filippelli, manteve-se o esquema, e os valores indevidos eram repassados conforme houvesse avanço nas tratativas.
Elefante branco
Com capacidade para receber 15 mil funcionários, o Centrad, construído pelas empresas Odebrecht e Via Engenharia, custou cerca de R$ 1 bilhão ; o governo, contudo, não realizou o pagamento ao consórcio, em razão da suspensão do habite-se pela Justiça. Segundo a delação do ex-diretor da Odebrecht João Antônio Pacífico, a empreiteira negociou com Agnelo e Filippelli R$ 15 milhões durante a corrida eleitoral de 2014. A quitação ocorreria conforme avançasse o cumprimento de exigências por parte do governo, como a liberação de aditivos e de habite-se.
Desse montante, chegaram a ser repassados R$ 2,5 milhões ao governador e ao vice, à época das candidaturas. No último dia à frente do Executivo local, Agnelo liberou o habite-se do Centrad, mas a autorização para a ocupação foi, mais tarde, questionada pelo MPDFT e suspensa pela Justiça. Ainda segundo o depoimento de João Antônio, em 2010, a construtora autorizou a doação de R$ 1 milhão à campanha do petista em troca da continuação das obras do Centro Administrativo e do Jardins Mangueiral.
As investigações sobre o setor habitacional também citam o ex-secretário de Habitação Geraldo Magela. De acordo com a delação do ex-presidente da Odebrecht Realizações Imobiliárias, Paul Elie, o petista recebeu R$ 1,4 milhão em doações de campanha em troca de favorecimentos nas obras.
Memória
Grupo de controle
Em 19 de abril, o Governo do Distrito Federal (GDF) anunciou a criação de um comitê para avaliar e propor ações relativas ao Estádio Nacional Mané Garrincha, ao Centro Administrativo do DF (Centrad), ao BRT Sul e ao Setor Jardins Mangueiral. Como publicou o Correio à época (veja fac-símile), todas as quatro construções estão sob suspeita, uma vez que foram mencionadas nas delações da Odebrecht. Elas custaram, no total, R$ 4,5 bilhões. O Grupo de Ações Integradas de Controle vai apresentar cronograma das ações de controle, além de montar um plano com todas as atividades que serão desenvolvidas. Auditorias apontaram indícios de irregularidades e superfaturamento nas obras. O trabalho é conduzido pela Controladoria-Geral do Distrito Federal, que vai apurar e punir condutas ilegais de servidores, com penas que vão de advertência à demissão. O órgão também promete quantificar os prejuízos gerados aos cofres públicos e apontar empresários envolvidos nas supostas condutas irregulares. Todas as conclusões serão encaminhadas ao Tribunal de Contas do DF (TCDF) e ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), que também abriram procedimentos de investigação para verificar a regularidade das quatro grandes empreitadas. As iniciativas foram tomadas agora por causa dos fatos novos trazidos pelas delações da Odebrecht.
Suspeitos se defendem
A defesa do ex-governador José Roberto Arruda (PR) destacou que aguarda a abertura dos inquéritos policiais para prestar informações aos investigadores da Operação Panatenaico. ;Tínhamos conhecimento dessa delação (da Odebrecht) e antecipamos algumas informações para prestar no momento correto ao próprio inquérito. Mas esses fatos não são verdadeiros. É preciso ressaltar que a delação não tem força probatória. A própria lei diz que a palavra de um delator é digna de desconfiança. Por isso, aguardamos abertura do inquérito policial para conhecer o que foi oferecido e rebater ponto a ponto;, ressaltou o advogado de Arruda, Paulo Emílio Catta Preta.
Por telefone, um dos advogados de Agnelo Queiroz (PT), Daniel Gerber, se limitou a dizer que as alegações da Odebrecht são ;fantasiosas, e isso será demonstrado dentro dos autos do processo;. Em nota pública divulgada na última quinta-feira, o ex-governador afirmou que ;confia inteiramente que, ao fim das investigações, ficará provado que todos os atos como candidato e como governador foram praticados com obediência aos preceitos legais;. ;Não tenho nada a esconder e nada a temer em relação aos atos praticados nas campanhas eleitorais de que participei e em razão dos cargos públicos que ocupei, como agente político;, completou.
Caixa 1
O ex-secretário de Habitação Geraldo Magela argumentou que todas as doações feitas pela Odebrecht à campanha dele para o Senado Federal deram-se via caixa 1, pelo Diretório Nacional do PT. O Correio ligou sucessivas vezes para o advogado do ex-vice-governador Tadeu Filippelli, Alexandre Queiroz, entre as 14h e as 18h40 de ontem. Além disso, enviou mensagens por meio do WhatsApp. O defensor visualizou as conversas, mas não respondeu à reportagem.
"É preciso ressaltar que a delação não tem força probatória. A própria lei diz que a palavra de um delator é digna de desconfiança. Por isso, aguardamos abertura do inquérito policial para conhecer o que foi oferecido e rebater ponto a ponto;
Paulo Emílio Catta Preta, advogado de Arruda