A procura de Lucas Alexandre, 7 anos, por uma doação de medula óssea comoveu a capital federal. O drama do garoto ; começou com o diagnóstico de leucemia, em 2012 ; só teve fim após a descoberta de um doador perfeito, em 2015. A esperança de cura veio do município mineiro de Divinópolis, distante 900km de Brasília. Lucas e Matheus Júnio da Silva, 26 anos, o doador, demoraram 18 meses até ficarem frente a frente pela primeira vez. Juntos, eles cruzaram a história de duas famílias. Antes da cirurgia, a rotina do pequeno Lucas era pautada pelas internações constantes. Isso até Matheus mudar esse enredo.
;Viramos uma família de sangue, coração e alma. A generosidade do Matheus nos deu oportunidade de vivermos em paz;, comemora Fabíola Gomes de Freitas, 39, mãe de Lucas. Ela chorou, mas, diferentemente de outros momentos, as lágrimas eram de felicidade. ;É fácil ser solidário com quem se conhece, se ama. Ter a mesma atitude com um desconhecido é raro;, completa.
A primeira conversa, ainda tímida, aconteceu na Rodoviária Interestadual de Brasília, quando o ônibus encostou por volta das 8h30. Matheus saltou com um presente na mão e foi surpreendido por um abraço emocionado de Lucas. Não escondeu a emoção, apesar do cansaço das 12 horas de viagem. ;O Lucas virou um irmão;, resume o doador, enquanto o pequeno abria o embrulho de papel brilhante.
;Nós conversamos muito por telefone, escrevi cartas, mas nada é como abraçar alguém tão importante na nossa vida. Seremos eternamente gratos a esse rapaz;, explica Fabíola. A mulher estava tão contente quanto em 9 de setembro de 2015. Naquele dia, ela atendeu a reportagem por telefone para contar que finalmente Lucas havia encontrado o doador compatível.
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;Herói;
Generosidade, no dicionário, é definida como virtude daquele que se dispõe a sacrificar os próprios interesses em benefício dos outros. Para Matheus, um jovem servidor público que sonha em ser peão de rodeio, é filosofia de vida. ;Só eu sei como me sinto honrado por ter ajudado essa família. Todo esse carinho que estou recebendo mostra como a doação é um ato importante;, ressalta, com a voz embargada e um sotaque forte. Entre muitos beijos e abraços, Fabíola faz uma declaração inesperada. ;Ele é o nosso herói.;
Com o transplante de medula óssea, Lucas realizou um sonho: frequentar a escola. O menino durante muito tempo ficou isolado. Não saía de casa, não interagia com as visitas e não tinha amigos. Hoje, ainda estranha sair de casa após o almoço, mas se diverte bastante quando chega ao colégio. ;Às vezes tem um choro antes de entrar no carro, mas logo ele fica ambientado. Corre e brinca com todas as outras crianças;, conta o servidor público Ricardo Alexandre Pinheiro, 42, pai de Lucas.
Ricardo não se esquece dos dias e noites de aflição enfrentados em unidades de terapia intensiva (UTI). Qualquer febre já era motivo para alarde. Sem o funcionamento do sistema imunológico, um resfriado seria fatal para Lucas. Foi necessária uma fé inabalável para suportar as recaídas do menino, mas ele nunca deixou de acreditar na bondade alheia. ;A diferença entre a vida e a morte está no simples ato de se doar para alguém;, destaca o pai.
Unidos pelo amor
As identidades de doador e receptor são mantidas em sigilo. Só podem se conhecer 18 meses após o procedimento se ambos concordarem. Essa é uma regra do Registro Brasileiro de Doadores de Medula Óssea (Redome). Matheus, Lucas, Fabíola e Ricardo estiveram praticamente lado a lado no hospital, em São Paulo, onde o transplante ocorreu, mas não se conheceram. Fabíola, tempos depois, escreveu uma carta. Nela, Lucas desenhou formas geométricas. Ao reler a mensagem, todos se emocionaram. Matheus mostrava o papel dobrado em quatro partes com orgulho.
Até sábado, eles vão compartilhar momentos únicos. Ontem, já mostravam o entrosamento. Lucas apresentava vídeos e jogos no Ipad para Matheus. Passaram a manhã contando particularidades. A mãe de Matheus, a representante têxtil Solange Maria da Silva, 50, e o irmão caçula, Daniel da Silva Almeida, 17, também estão em Brasília. ;Nunca imaginei conhecer a cidade por um motivo como esse;, diz Solange. Fabíola emenda. ;Agora estamos unidos pelo amor;.
Matheus não é o único da família mineira a doar sangue e medula. Há nove anos, quando uma vizinha precisou de sangue, Solange doou pela primeira vez. Desde então, virou hábito entre eles. Daniel, ao completar a maioridade no fim do ano, também diz que vai doar. ;Temos que mostrar a importância desse ato. Todos nós podemos fazer a diferença na vida de alguém;, explica a matriarca.
Tratamento
As chances de encontrar um doador de medula óssea compatível são bastante raras, em média, uma a cada 100 mil. O transplante é indicado para pacientes com leucemia, linfomas, anemias graves, imunodeficiências e outras 70 doenças relacionadas ao sistema sanguíneo e imunológico. Quando um paciente necessita de transplante, e não possui um doador na família, é feita uma consulta ao Registro Brasileiro de Doadores de Medula Óssea (Redome). Se for encontrado um doador compatível, ele então será convidado a fazer exames complementares para realizar a doação. A medula óssea é uma estrutura que fica dentro dos ossos do corpo, responsável pela produção das células do sangue e das células de defesa. Entre as células sanguíneas produzidas na medula óssea estão os glóbulos brancos, os glóbulos vermelhos e as plaquetas, todas substâncias importantes para o transporte de oxigênio, hormônios e nutrientes para o organismo.
Como doar
; Qualquer pessoa entre 18 e 55 anos com boa saúde pode doar medula óssea
; É colhida uma pequena amostra de sangue (de 5ml a 10ml) e realizado um cadastro com os dados pessoais
; É muito importante que sejam mantidos atualizados os dados cadastrais para facilitar e agilizar a chamada do doador no momento exato
; Caso o seu DNA seja compatível com outro receptor, o doador é convidado a fazer uma breve avaliação de saúde e a realizar o procedimento
; A doação se faz em um centro cirúrgico, sob anestesia peridural ou geral, e requer internação por, no mínimo, 24 horas
; O transplante é feito por via endovenosa, onde as células migram pelo sangue até se fixarem na medula óssea do receptor e voltarem a se multiplicar e a cumprir suas funções fisiológicas.
Informe-se
Fundação Hemocentro de Brasília Setor Médico Hospitalar Norte, Quadra 3, Bloco A, 1; andar Telefones: 160 (opção 2) ou (61) 3327-4447.