Walder Galvão*
postado em 26/07/2017 06:00
Pelo menos 18 mil condutores terão a carteira de motorista cassada ou suspensa. Os processos tramitam no Departamento de Trânsito (Detran) e reúnem infratores contumazes ou que cometeram infrações muito graves no trânsito. Entre eles está uma mulher de 66 anos, moradora do Lago Sul. Nos últimos 12 meses, ela acumulou 433 pontos na habilitação. Ela faz parte da lista dos 10 piores condutores da capital federal (veja ilustração).
Para dar conta de analisar todos esses milhares de casos e aplicar a penalidade, os servidores do Detran levarão pelo menos um ano e meio. Isso se não entrar mais nenhum caso em que esse tipo de penalidade é aplicada. Há cerca de três meses, a fiscalização apertou ainda mais o cerco ao motorista que, mesmo com a CNH suspensa ou cassada, continua a assumir o volante. O cumprimento da norma prevista no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) há quase 20 anos tem levado essas pessoas para a delegacia.
Somente no primeiro semestre, 603 condutores impedidos de guiar sofreram autuações. O total aumentou 225% na comparação com o mesmo período do ano passado, com 185 infratores. O último levantamento do Detran também registrou a suspensão de 2.053 motoristas nos primeiros seis meses de 2017 (leia Para saber mais). Além deles, 422 tiveram o direito de dirigir cassado neste ano. Em 2016, 5.050 foram suspensos e 719, cassados. Ainda no ano passado, nove condutores com o direito de dirigir suspenso envolveram-se em acidentes de trânsito com mortes.
Há duas semanas, a professora Aline Camargo, 32 anos, recebeu uma carta do Detran informando que ela não poderia mais dirigir. Em 2011, ela foi parada em uma blitz e acabou autuada. ;Respondi por não realizar o teste do bafômetro. Paguei a multa e recorri três vezes. Peguei um ano de suspensão e vou precisar fazer a escolinha de reciclagem;, conta. Sem habilitação, a rotina da professora mudou completamente. Para dar aulas, ela depende totalmente do veículo. Porém, ela garante que ficará longe do volante até cumprir o prazo. ;Vou precisar parar. É um risco muito grande que a gente corre. Vou deixar o carro com o meu irmão e utilizar o transporte público ou privado para trabalhar;, afirma.
Aqueles que tiveram a CNH suspensa, como no caso da professora, têm amplo direito de defesa. Assim que o processo for iniciado, o condutor recebe uma carta com o aviso de abertura da ação e poderá entrar com os recursos legais. Caso o infrator não recorra, o Detran comunicará a decisão ao motorista, que deverá entregar a habilitação. Em seguida, o processo de penalidade começa. Com o término, o curso de reciclagem deve ser realizado para reaver a CNH. Assim, o procedimento pode demorar mais de um ano para ser concluído. No entanto, a Lei n; 13.281, de 2016, altera a análise. Os processos posteriores a 1; de novembro de 2016 avaliarão, simultaneamente, o recurso da multa e a aplicação da penalidade do direito de dirigir. Isso reduzirá o período para a aplicação da suspensão.
O diretor-geral do Detran, Silvain Fonseca, destaca que o objetivo é modificar o CTB para que as penalidades sejam mais efetivas. ;Desde 2006, o código sofre grandes modificações para melhor. Queremos que mude ainda mais;, ressalta. Para ele, o ideal é acabar com a sensação de impunidade dos motoristas. ;Muitos insistem e apostam na falta de punição ou no próprio texto estabelecido na legislação. Queremos desmotivar essas pessoas que estão impedidas de conduzir veículos a ficarem dirigindo;, reforça.
[SAIBAMAIS]O Detran intensificou a fiscalização contra motoristas com a CNH suspensa ou cassada. Em abril, o órgão criou a Operação Pontos Para a Vida, que monitora e retira das ruas esse tipo de condutor. Após três meses de operação, foram flagrados 139 condutores com habilitação suspensa e cinco com o documento cassado. No total, somam 4.957 pontos relativos a infrações de trânsito. Além disso, durante a ação, 21 pessoas foram encaminhadas à Polícia Civil e responderão a processo criminal. Levantamento da Diretoria de Policiamento e Fiscalização de Trânsito aponta que cerca de 1,5 mil condutores devem dirigir sem a carteira no DF.
Consciência
Além do aumento de autuações, o número de motoristas com pontos registrados na habilitação também assusta. ;As pessoas aprendem pela experiência. Elas notam que não há penalidade imediata e continuam praticando as infrações. Até que um dia ganham consciência de que não há mais. Existe uma sensação de impunidade;, explica o professor Hartmut Gunther, do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho da Universidade de Brasília (UnB).
O especialista em psicologia do trânsito ressalta que o perfil do motorista brasiliense piora por causa da lentidão judicial. ;Se eu vou ser o milésimo sujeito a ser penalizado, por que vou me preocupar até que chegue a mim?;, questiona. Gunther também aponta que os mais ricos, muitas vezes, não ligam para penalidade. ;Em alguns casos, pessoas de classe alta se sentem protegidas e no direito de não serem processadas;, avalia.
Processo
Segundo o artigo 307 do Código de Trânsito Brasileiro, violar a suspensão ou a cassação da CNH é crime. O motorista que infringir a lei pode receber detenção de seis meses a 1 ano. O caso é enviado para a Justiça, e ele responde a processo judicial. Caso seja condenado, pode pegar de 6 meses a 1 ano de detenção.
Para saber mais
Afastados do volante
A CNH é suspensa quando há cometimento de alguma infração prevista no Código de Trânsito Brasileiro, como dirigir alcoolizado, excesso de velocidade, falta do uso do capacete, executar manobras perigosas ou quando se atinge 20 pontos na habilitação no período de 12 meses. O processo de cassação ocorre quando o motorista suspenso é flagrado dirigindo ou se, dentro de um ano, o condutor reincidir em infrações gravíssimas, como conduzir veículo diferente da categoria da habilitação, dirigir sob efeito de álcool ou promover competição, eventos ou exibições de perícia em manobra de veículos. Além disso, quem for autuado nesta situação recebe multa de R$ 880,41.
* Estagiário sob supervisão de Guilherme Goulart