O Palácio do Buriti alega estar em uma sinuca de bico: ou paga, integralmente, os salários dos funcionários públicos em setembro e dá um novo calote no empresariado ou parcela as remunerações e quita parte da dívida, na faixa de R$ 800 milhões, com fornecedores e prestadores de serviço, com o intuito de prevenir a interrupção de operações. Honrar todos os compromissos seria possível apenas se mais recursos entrassem nos cofres. A decisão sobre o parcelamento será tomada na última semana do mês. Em qualquer um dos cenários, contudo, servidores da segurança estão a salvo e terão os contracheques pagos no quinto dia útil do mês, assegura a Casa Civil.
A garantia da remuneração total deve-se às regras do Fundo Constitucional do DF, que conta com R$ 13 bilhões por ano da União para cobrir os gastos do segmento com pessoal, investimentos e custeio. ;A legislação prevê que, primeiramente, esse montante deve arcar com os custos da segurança pública. Então, eles são os únicos servidores com a garantia de depósitos. Apenas o valor restante do Fundo pode ser aplicado na folha de pessoal da saúde e educação;, aponta o chefe da pasta, Sérgio Sampaio.
O GDF argumenta que as contas não fecham, uma vez que gasta, apenas com funcionários, 80% da receita ; a folha chega a R$ 2,2 bilhões. Os representantes do funcionalismo, porém, pontuam que a previsão de gastos com o setor é sempre similar e, portanto, não há justificativa para o parcelamento. ;É uma pressão do governo para, novamente, retirar direitos dos servidores. Como sabemos, as despesas não tiveram aumento. A arrecadação, por outro lado, apenas cresceu do início da gestão até hoje;, pontua o presidente do Sindicato dos Servidores e Empregados da Administração Pública (Sindser), André Luiz da Conceição.
À frente dos Servidores Públicos Civis da Administração Direta (Sindireta), Ibrahim Youssef condenou a possibilidade de parcelamento dos vencimentos e a falta de diálogo entre governo e funcionalismo. ;O governador nem sequer nos chamou para conversar. É uma notícia muito ruim para quem cumpre todas as obrigações e passa por poucas e boas com atrasos no 13;, férias e afins;, ataca.
Contas não fecham
A penúria dos cofres públicos não é de hoje ; o Palácio do Buriti atrasou a terceira parcela do reajuste do funcionalismo, concedido na gestão de Agnelo Queiroz (PT), e negou o acréscimo de 37% aos vencimentos da Polícia Civil, que garantiria a histórica isonomia salarial com a Polícia Federal (leia mais sobre o assunto na página 20). O último capítulo decorrente das dificuldades financeiras aconteceu neste mês, quando o Executivo local chegou a processar duas folhas de pagamento para os servidores: uma com o valor integral da remuneração e outra com 80% dos salários previstos para o quinto dia útil ; e os outros 20% para a semana seguinte.As contas também não fecham quando o assunto é pagar fornecedores e prestadores de serviço terceirizados. Segundo a Casa Civil, o GDF detém uma dívida de R$ 800 milhões com esses setores. O montante seria integrado por R$ 188 milhões de débitos do mandato de Rodrigo Rollemberg (PSB) e R$ 612 milhões da gestão anterior. O valor em aberto, aliás, levaria alguns empresários a ameaçarem a interrupção de operações básicas. A estimativa de deficit total da receita, até o fim do ano, é de R$ 1,5 bilhão.
;Deixamos de pagar, por dois ou três meses, aqueles que fazem a manutenção de hospitais, limpam as escolas, colocam óleo na caldeira e afins. Tudo isso para pagar o servidor em dia. Mas, se continuarmos assim, uma hora a corda vai romper. Ou seja, serviços essenciais à população deixarão de ser prestados;, analisa Sérgio Sampaio, enfatizando, porém, que o governo ainda busca saídas para arcar com todos os compromissos.
Agravantes
Outros agravantes prejudicam as contas do GDF, segundo o governador Rodrigo Rollemberg. Um deles é a dívida da União com o DF, referente à compensação previdenciária ; a cifra atinge R$ 780 milhões. ;Não é um privilégio, é nosso direito. O governo federal nos deve, reconhece isso, mas não transfere esse dinheiro tão importante para o DF;, diz o chefe do Executivo local.
Além disso, conforme destaca o secretário da Casa Civil, o valor repassado pela União ao Fundo Constitucional do DF é o mesmo desde 2011: R$ 13 bilhões. Enquanto isso, as contas inflam e o GDF tem de injetar mais R$ 8,3 bilhões, anualmente, para manter os setores de saúde, educação e segurança de pé. Com todas as contas em mão, o Palácio do Buriti deve bater o martelo sobre o parcelamento dos salários na última semana do mês.
Para saber mais
Derrota na JustiçaO Palácio do Buriti sofreu um revés no processo em que tentava unificar as decisões de ações sobre a não implementação da terceira parcela do reajuste salarial, concedido durante a gestão de Agnelo Queiroz (PT), ao contracheque do funcionalismo público ; a concessão está atrasada desde 2015. A Câmara de Uniformização de Jurisprudência do TJDFT negou o pedido, sob o entendimento de que o GDF não comprovou, nos autos, a existência de divergências entre as sentenças das varas da Corte que trataram do tema. Segundo a Procuradoria-Geral do DF, são mais de 1,5 mil ações individuais, além de 11 coletivas, movidas por funcionários públicos que exigem o repasse.
Os desembargadores ainda rejeitaram a justificativa do Executivo local de não deter dinheiro em caixa para quitar o débito, com base em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) relativa a um processo do estado de Roraima, com idêntica fundamentação. De acordo com estimativas da Secretaria de Fazenda, os aumentos custariam R$ 120 milhões por mês aos cofres públicos. O Palácio do Buriti pode recorrer do veredito em tribunais superiores.