Jornal Correio Braziliense

Cidades

Máfia dos concursos também oferecia vaga em cursos de medicina

Criminosos cobravam até R$ 220 mil por uma vaga; grupo também agia fora do DF


Como consta no termo de declaração, a abordagem aconteceu por meio de um representante de medicamentos conhecido como ;o cabra;. Miguel contou que, em março de 2016, comentou, no consultório onde trabalha, sobre a preocupação da filha com a dificuldade em conseguir a aprovação no curso ; a moça tentava uma vaga desde 2015 em diversas universidades e, ao todo, prestou 10 vestibulares. ;O cabra;, então, disse que ;conhecia uma pessoa que poderia resolver seu problema;.

No mês seguinte, o mediador o apresentou a Bruno Ortiz, em uma padaria do Guará. À época, o filho de Helio Ortiz informou que ;seu trabalho seria somente em vestibulares da universidade pública do DF;. O integrante da organização criminosa ainda explicou que, no dia da prova, a moça teria de realizar o exame com uma caneta de tinta apagável. Posteriormente, o grupo remarcaria o gabarito, com as respostas corretas.

[SAIBAMAIS]Bruno Ortiz acrescentou que, se a filha de Miguel desejasse a escrita da redação, uma terceira pessoa responderia a prova no lugar dela ; neste caso, seria cobrado um adicional de R$ 800. À Deco, Miguel disse tê-lo questionado sobre o que aconteceria se a aprovação não fosse concretizada. Ele recebeu uma resposta sucinta: ;Não seria exigido pagamento;, disse Ortiz.
A ideia despertou a reprovação de parte da família. A filha de 21 anos ressaltou que ;aquilo seria desonesto e que, caso anuísse, estaria retirando a vaga de outra pessoa;. A esposa de Miguel também mostrou-se contrária à estratégia. ;Não é certo;, disse a companheira.

Ainda assim, ele fechou negócio e pagou uma entrada de R$ 45 mil a Bruno Ortiz. O restante seria dividido em outros dois repasses: metade a partir da publicação do nome da moça na lista de aprovação e o restante, após a matrícula. A jovem de 21 anos realizou as provas, mas não passou no vestibular.

Bruno ainda havia oferecido a Miguel vagas em outras duas faculdades particulares do DF e em outra, no estado de Goiás. Nesse caso, indicou a mediadora Alda Maria de Oliveira Gomes, ex-funcionária pública e alvo de condução coercitiva na Operação Panoptes. Em dois encontros, durante o ano passado, a mulher teria cobrado R$ 170 mil pela aprovação no curso de medicina nessas universidades privadas.


Punições

O delegado adjunto da Deco, Adriano Valente, confirmou que as investigações alcançam também fraudes em vestibulares. ;Ainda não é possível precisar o número de certames fraudados. Possivelmente, será deflagrada uma nova fase da Operação Panoptes, voltada especificamente a essa modalidade criminosa;.

Os candidatos que pagam por vagas em universidades públicas ou privadas podem ser enquadrados no crime de fraude à certame de interesse público. Caso os pais realizem o repasse pelos postos e os concorrentes sejam menores de idade, há, ainda, incidência de corrupção de menores. Além disso, a depender do número de envolvidos e do grau de proximidade, o grupo classifica-se como organização criminosa.

Alda Maria prestou esclarecimentos à Deco sobre a suposta participação no esquema de fraudes. Procurado pelo Correio, o advogado de Bruno Ortiz afirmou que não teve acesso aos autos e, portanto, não poderia comentar as acusações.