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Área de proteção do Descoberto sofre com excesso de perfuração subterrânea

Muitas dessas perfurações são clandestinas, o que agrava ainda mais o abastecimento no Distrito Federal



As perfurações subterrâneas ; como poços tubulares e cisternas ; na área de proteção do Rio Descoberto vêm contribuindo com a queda da vazão do reservatório. À retirada das águas profundas soma-se a falta de chuva e a demanda de uso da água além da capacidade da bacia. Todos esses elementos estão gerando um estresse hídrico responsável pelos sucessivos recordes históricos de diminuição do volume do espelho d;água e uma escassez no abastecimento jamais vista no Distrito Federal ; com possibilidade de dois dias de racionamento durante a semana.

Segundo especialistas, perfurações não planejadas podem prejudicar o ciclo hidrológico por anos e contribuir para a diminuição da quantidade de água nos rios, que são reabastecidos por lençóis freáticos. ;Se eu tiro a água subterrânea, isso não vai refletir dias depois, são meses e anos. Assim, se a crise hídrica fosse resolver com as próximas chuvas, os poços não seriam tão preocupantes. A crise deste ano pode ser resultado do que foi retirado no ano passado;, explica Sérgio Koide, professor da Universidade de Brasília (UnB).

[SAIBAMAIS]Existe uma dificuldade do poder público em controlar as águas abaixo do solo, porque o início da fiscalização é recente. Segundo informações da Agência Reguladora de Águas do Distrito Federal (Adasa), 900 outorgas foram liberadas para a perfuração e uso de poços na Bacia do Descoberto. Entretanto, existem 1,5 mil poços cadastrados na região e estima-se a existência de 1,8 mil unidades perfuradas. O que significa que metade dos poços não tem autorização para retirada de água, embora a própria agência reconheça que eles existam e estejam em operação. Além disso, pelo menos 300 poços são clandestinos. Somente este ano, a Polícia Militar do Distrito Federal encontrou e lacrou três poços irregulares. A pena para quem comete essa infração é detenção de seis meses a um ano e multa.

O coordenador de fiscalização da Adasa, Hudson Rocha de Oliveira, explica que a maioria dos poços foram perfurados antes da existência da instituição ; a reestruturação da forma como funciona hoje é de 2008. Ele comenta que há três anos a agência vem fazendo um trabalho de reconhecimento da região para mapear os poços. ;Desde 2015, nós estamos cadastrando esses poços porque a Adasa precisa ter o controle da água subterrânea que alimenta os nossos rios e nascentes;. Segundo Hudson, a quantidade de multas triplicou nos últimos anos. Ele explica que o aumento de multas não significa mais poços clandestinos, mas o acréscimo deve-se ao fato de que, primeiro a agência focou na conscientização e advertências antes da penalidade máxima.


Autorização

Entretanto, uma barreira regulatória está travando a legalização dos poços na região. Embora a Adasa tenha convocado os donos de poços para regularizarem a situação, uma resolução do fim de 2016 da própria agência proibiu a concessão de mais outorgas. Essa situação peculiar faz com que os poços continuem operando, com cadastro no órgão regulador, mas sem a autorização formal, que é a outorga. ;A fiscalização notifica para regularizar, os usuários se cadastram. Eles não estão irregulares, só não têm o papel de outorga. Eles continuam em operação, mas nós, como órgão regulador, temos uma estimativa de quanto eles estão tirando. Os poços clandestinos nos preocupa mais;, afirma Hudson.

Para o pesquisador da Embrapa Cerrados e presidente do Comitê da Bacia do Paranoá, Jorge Werneck, a situação é delicada. ;Em tempos de crise hídrica, as decisões não são fáceis. Oficializar algo em um período de restrição pode trazer muitos percalços. Tem que estudar quem pediu a outorga, ver o uso e encontrar um caminho para regularizar a situação;.

Hidrômetros

O professor da UnB Sérgio Koide defende que é preciso regularizar a situação; ;Como a gente pode gerenciar se a gente não conhece?;, questiona. Para Koide, a Adasa poderia fazer um monitoramento via drone. ;Pelas imagens será possível quantificar os poços, cruzar as coordenadas e ver quais são os regulares e se estão usando a quantidade de água permitida;. O especialista defende ainda que os poços tenham hidrômetros como os existentes nas casas para medir a quantidade de água usada. ;Se a pessoa tem dinheiro para furar um poço, que é caro, ela pode pagar pela água.;

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Para a promotora de Meio Ambiente do Ministério Público do DF, Marta Eliana, faltam elementos para uma fiscalização mais segura do uso da água. ;Não existe uma fiscalização efetiva de quanto se tira de água subterrânea. Não é porque a pessoa tem a outorga que significa que ela usa somente aquela quantidade;, destaca.


Glossário Cisterna

Poços de diâmetros de um metro ou mais, escavados manualmente e revestidos com tijolos ou anéis de concreto, captam o lençol freático e têm geralmente profundidades de até 20 metros.


Poço tubular

Obra de engenharia que dá acesso à água subterrânea, executada com sonda por perfuração vertical e profundidade de até 2 mil metros para captação de água.