Juliana Andrade
postado em 07/01/2018 08:00
Chuteira no pé, bola em quadra, torcida preparada e, principalmente, tradição na cabeça. O Arimateia é um dos principais torneios de futsal de Brasília e, todo ano, a população de Taguatinga abre espaço entre as comemorações de fim de ano para receber os milhares de torcedores e os times de Brasília e das cidades do Distrito Federal (DF). Em sua 38; edição, o evento conta com público de mais de 100 mil pessoas.
Quem olha grandiosidade do torneio nem imagina que tudo começou com uma brincadeira entre jovens. Há 44 anos, José de Lamateia Lima, conhecido como Arimateia, organizador do campeonato, dava início a uma competição simples com os amigos na QNF, em Taguatinga. "O uniforme era uma camisa feita pela minha mãe com saco de pano de chão. Os números, eu desenhava com o dedo sujo de tinta. Lembro que o prêmio era pão com salame e refrigerante. Foram seis anos assim", conta.
Mas a brincadeira virou coisa séria e o apoio da administração da cidade, com o fornecimento de palanque e corpo de bombeiro, foi o empurrão de que Arimateia precisava para tornar a principal competição de futsal de Brasília. "O torneio é um pedaço da minha vida. É inexplicável. Eu jamais imaginaria que fosse chegar onde chegou. Hoje, o evento é conhecido nacionalmente", afirma.
No campo, há um verdadeiro encontro de gerações. Os times não têm limite de idade e a média entre os mais novos é de 10 anos. Já as equipes mais antigas seguem em campo enquanto tiverem fôlego para jogar. Os jogadores mais novos integram a categoria no sub 11, e os mais velhos jogam na master e adultos. O caráter eclético é marca do torneio. Este ano, são mais de 1.400 atletas divididos em 93 equipes e oito categorias. Os times estão em campo desde 17 de dezembro e os finalistas disputam o prêmio neste domingo. O público, que, antigamente, contava apenas com familiares dos jogadores, atingiu 100 mil pessoas .
O militar aposentado Luiciano Luiz de Andrade, 37, morador de Taguatinga, reuniu toda a família para assistir ao filho Luiciano Luiz , 11, em campo. "Tem muito tempo que a gente mora aqui perto e já tínha vontade de participar. É um evento muito bacana, muito conhecido, com um bom público. Acho que todo homem tem vontade de jogar. Como não tive tempo para isso, coloquei os meninos", diz.
O filho do militar abraçou a ideia do pai e, além de se divertir, encheu a família de orgulho fazendo o primeiro gol do jogo. "Eu treinei muito e foquei no meu objetivo", comenta Luiciano filho. A avó, Maria Cândida de Andrade, 82 anos, torceu incansavelmente na arquibancada. "Ele joga muito bem, me sinto muito orgulhosa. É a primeira vez que eu vejo meus netos jogarem assim. O primeiro gol foi dele e, nos outros jogos, ele fez dois gols", comemora.
Vontade de jogar
O músico Reinaldo Cordeiro, 47, participa da festa desde 1988. De torcedor passou a jogador e entrou em quadra pela primeira vez aos 15 anos. Hoje, não joga mais por problemas no joelho, mas não perde um torneio, principalmente os jogos do filho. "Eu vejo os meninos jogando e me lembro de mim na arquibancada com vontade jogar. Eu fui campeão por três vezes. Olho para o meu filho, vejo a vontade dele de entrar em quadra e me lembro de mim quando jovem", diz
Aos 10 anos, o filho de Reinaldo se diverte com o torneio. " Sei que meu pai jogou quando era mais novo e acho isso muito legal. Fico muito feliz de entrar em quadra;, ressalta Rafael Cordeiro. Para Reinaldo, o torneio Arimateia é muito mais do que uma competição esportiva. "É um reencontro de amigos, revelação de talentos e um encontro de geração. Acredito que o maior legado do Arimateia é justamente a amizade entre pessoas e gerações", garante.
Futuro
Que menino nunca sonhou em ser jogador de futebol? Assim como a brincadeira de Arimateia virou coisa séria, muitos jovens encaram o torneio como uma oportunidade de colocar em prática o talento com a bola. Rikelme de Souza que o diga. Aos 11 anos, já jogou no torneio duas vezes. "Sonho em ser jogador de futebol profissional. Isso aqui já é um começo, mas não é fácil, eu treino três vezes por semana", conta. Este ano, ele participou jogando no time da escola, inscrito no torneio pela professora de educação física, Juliana Miranda. ;Eles vêm se preparando ao longo do ano, são meninos de classe baixa e isso ajuda a tirá-los da rua para inseri-los no esporte;, frisa.
Wolney Giffoni, 54, é o treinador do time de Rikelme. Enquanto o estudante participa colocando seu talento em quadra pela 2; vez, Wolney se dedica a treinar os garotos há 25 anos. O treinador participa do torneio desde 1993 e não esconde a paixão pelo esporte e pelo evento. "É uma festa que envolve a família dá oportunidade de os jovens praticarem o esporte com brilhantismo. O torneio tem um público muito grande; essa arena fica pequena", comenta.
Sonho para os pequenos e meta para os jovens como Pedro Henrique Rodrigues, 14, que deixou as atrações das férias para se dedicar aos treinos. O jovem joga no torneio há 3 anos. "Pretendo seguir a carreira de jogador até o fim. Treino muito para alcançar o meu objetivo. Esse torneio é uma experiência muito boa para mim", afirma.
Arimateia se orgulha e destaca a mistura de gerações que o torneio proporciona, com a mistura de jogadores de várias idades. Ele encara as crianças e os jovens como o futuro do evento. "Quero que Deus me dê mais 20 anos para eu assistir a esses garotos."a Com lágrimas nos olhos, ele define o torneio com uma palavra: amor.