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Cidade limitada em transporte público faz saltar número de adeptos ao carro

Em 2017, mais de 60 mil veículos foram vendidos no Distrito Federal. Mesmo com o custo de manutenção e o alto preço do combustível, a população busca conforto e comodidade em uma cidade limitada em transporte público e ciclovias

Bruno Lima - Especial para o Correio, Augusto Fernandes
postado em 14/01/2018 08:00

Congestionamento na Estrada Parque Taguatinga: frota de 1,7 milhão obriga a cidade a criar alternativas de mobilidade, como ciclovias, metrô e transporte público

Cerca de 1,4 milhão de automóveis circulam diariamente pelas vias do Distrito Federal. No ano passado, a frota da capital ; somados carros, caminhões e motocicletas ; alcançou a marca de 1,7 milhão de veículos, média de um para cada dois habitantes. Essa quantidade colabora para problemas de mobilidade. O tráfego intenso resulta em retenções e congestionamentos nos horários de pico. Além disso, a utilização de um transporte próprio acarreta gastos com combustível, manutenção e documentação. Diante disso, fica a dúvida: vale a pena ter carro em Brasília?

Na prática, o brasiliense parece não estar disposto a abrir mão do veículo para usar outros meios de locomoção. De acordo com o Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos do DF (Sincodiv-DF), o número de emplacamentos em 2018 deve aumentar 10%, em relação a 2017. No ano passado 66 mil automóveis foram comercializados. ;A previsão é de que, neste ano, nós alcancemos pelo menos dois dígitos de crescimento nas vendas de carros e algo em torno de 5% de motocicletas. De forma geral, o ano passado apresentou uma melhora de 6% em relação a 2016. Nós estamos em uma constante de alta, e isso nos leva a crer, ao lado da recuperação da economia, que as vendas voltem a alcançar o patamar de 10 anos atrás;, opina a diretora administrativa do Sincodiv-DF, Magali Giocondo.

Segurança

[SAIBAMAIS]Aspectos como comodidade e agilidade pesam na hora de o brasiliense escolher entre o veículo próprio e o transporte público. É assim com o assistente administrativo Lucas Nickson, 22 anos. ;Desde que comprei o meu carro, sempre o uso para me locomover. É muito raro eu optar por metrô ou ônibus. O veículo está à minha disposição na hora em que eu precisar, enquanto, com o transporte público, teria de esperar um bom tempo;, justifica. Ele gasta, em média, R$ 500 por mês pelo conforto. ;Usar carro ajuda a melhorar a minha qualidade de vida. O tempo que eu perderia dentro de um coletivo,posso aproveitar em outras atividades;, explica.



A falta de pontualidade dos coletivos fizeram com que Luís Filipe Barreto, 22, deixasse de utilizar o serviço. ;Eu sempre andei de ônibus e gostaria de continuar usando, mas, devido a essa questão de horários, eu dou preferência para o meu carro. É muito ruim ficar esperando por um ônibus que eu nem tenho a certeza de que vai passar;, comenta. O tecnólogo em gestão pública diz que a segurança também é levada em conta. ;Não que eu esteja completamente a salvo, mas é cada vez mais comum o número de assaltos no transporte público;, conta.

De acordo com dados da Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social, em 2017 foram 2.681 roubos em transportes coletivos no Distrito Federal. O número é o segundo maior em comparação aos últimos quatro anos. Em 2016, ocorreram 3.130 crimes, contra 2.397 em 2015, e 2.254 em 2014.

No caso do comerciante Alisson Melo, 21, ter um automóvel é questão de necessidade. No início do ano, ele comprou um veículo para usá-lo no trabalho. ;Antes, eu precisava andar com as minhas mercadorias (guarda-chuvas) nos ônibus e no metrô e sofria preconceito. Incomodava, porque eu ficava esbarrando nas pessoas. Agora, com o carro, eu posso me organizar melhor;, comemora. Ele não pensa em voltar a utilizar os transportes coletivos. ;Eu continuaria a ter os mesmos problemas. Sem contar que não preciso mais esperar pelos horários dos ônibus ou do metrô. É mais confortável, porque eu tenho um espaço maior. Quando dependia do transporte público, eu ficava em pé ou sentava em cima das mercadorias;, acrescenta.

Medidas

Apesar do conforto que um carro pode oferecer, especialistas apontam que esse meio de transporte dificulta o trânsito na cidade. De acordo com o professor do Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Brasília (UnB), Paulo César Marques, o veículo auxilia de forma individual. ;Você pode ir para qualquer lugar, a qualquer hora e sem precisar de ninguém. Mas ele não é uma solução para a mobilidade urbana. O espaço que um ônibus com 40 passageiros ocupa é o mesmo de três carros com apenas uma pessoa dentro;, ressalta.

Para Paulo César, muitas pessoas escolhem o carro pelas condições do transporte coletivo de Brasília. ;É preciso mais investimento para o transporte público de forma a tornar esse serviço atrativo para a população. Porém, esse serviço não recebe a atenção devida, e as pessoas buscam formas de sair do sistema. Muitos decidem adquirir um automóvel;, avalia.

O secretário de Mobilidade do Governo do Distrito Federal, Fábio Ney Damasceno, destaca que o DF tem uma das maiores frotas do Brasil e a forma como Brasília foi planejada prioriza o uso de automóveis. ;As características da cidade são voltadas para se locomover de carro. As avenidas são largas, e as pessoas precisam percorrer longas distâncias;, explica. Segundo ele, a implementação do bilhete único, o sistema de bicicletas compartilhadas, a regularização de aplicativos de transporte particular e a integração entre ônibus e metrô são medidas que incentivam a reduzção do uso do carro. No primeiro semestre do ano, será disponibilizado aos passageiros um sistema para acompanhar os ônibus via GPS para saber o horário exato em que ele passará pelos pontos. ;Nós estamos promovendo um conjunto de ações para que a população do DF decida o que é melhor. As pessoas precisam refletir sobre alguns pontos, como conforto, rapidez e economia, para decidir qual transporte utilizar;, diz Fábio.

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