Cidades

'Ela chegou morta, com as encomendas cheias de sangue', diz filha de vítima

Uma das vítimas da batida entre um ônibus e uma carreta próximo a Formosa (GO), Terezinha Santos trazia biscoitos para matar desejo de grávida da filha

Gabriela Vinhal
postado em 16/02/2018 15:19
Terezinha (E), com uma parente, antes de embarcar no ônibus envolvido no acidente: prazer em viajar pelo país
"Ela queria chegar antes da neta nascer. E chegou. Mas, infelizmente, morta, com as encomendas e as malas cheias de sangue." O depoimento emocionado é de Tereza Cristina Souza, 38 anos, filha de Terezinha Felix dos Santos, moradora de Recanto das Emas e uma das nove vítimas do acidente envolvendo um ônibus e uma carreta, próximo a Formosa (GO). Tereza, que está grávida de nove meses de Késia, esteve no Instituto Médico Legal na manhã desta sexta-feira (16/2) para tentar liberar o corpo da mãe.

Com 69 anos completados em 12 de janeiro, a paraibana de Seridó era uma mulher de espírito livre, cujo hobby era viajar pelo país. Tinha gosto pelas estradas por onde passava e fazia questão de sempre ir de ônibus, para ter mais tempo de admirar as paisagens e os detalhes do trajeto. "Ela não ficava quieta. Chegava de uma viagem e já ia para outra. Gostava do ônibus, porque podia apreciar com mais tempo, aproveitar a viagem", lembra a filha.

Na quinta-feira (15/2), ela voltava de uma viagem que durou quase um mês e meio: começou em São Paulo, passou por cidades do interior da Paraíba e terminaria em Brasília. Mas foi interrompida na BR-020, com o acidente que matou seis pessoas no local e outras três em hospitais da cidade.

Na última conversa de Terezinha com Adriana, a filha caçula, ela havia marcado um almoço em família no domingo, na casa da nora, e avisado que havia trazido a encomenda de Tereza: biscoitos Sol da Preta, feitos de rapadura, típicos da Paraíba, para matar o desejo de grávida da filha. Ansiosa pelo nascimento da 33; neta, esperava chegar a tempo do parto.

"Foi difícil ver as coisinhas dela"


Tereza, filha de Terezinha: busca em diferentes hospitais até encontrar a mãeTereza conta que, após pegar as bagagens da aposentada em uma sala do galpão da Real Expresso, no Setor de Indústria e Abastecimento (SIA), encontrou os tais biscoitos. Mas todos sujos de sangue. "As malas de todos os passageiros estavam misturadas, com pedaços de vidro e muito sangue. Foi um momento muito difícil ver todas as coisinhas dela. Minha mãe era exemplar. Sempre querendo mimar a gente. Difícil entender o que está acontecendo."

Com nove filhos, 32 netos e 27 bisnetos, divididos entre o Distrito Federal, Goiás, Bahia e Paraíba, Terezinha, nascida em Seridó (PB), chegou a Brasília quase 25 anos atrás. Ficou casada por 55 anos e estava viúva havia dois meses, depois de cuidar do marido, vítima de um AVC, por três anos. Ela e o marido, Genivaldo Souza, decidiram deixar a Paraíba com os filhos na expectativa de que a capital do país oferecesse mais oportunidades. No Distrito Federal, a família construiu laços, o que fez Terezinha uma pessoa querida na rua onde morava.

Quando não estava viajando, gostava de ficar na casa dos filhos, cuidando dos netos. Segundo Tereza, a mãe estava sempre bem humorada, era feliz e amorosa. ;Foi uma mãezona e uma grande esposa. Antes do meu pai adoecer, ela era dona de casa. Depois disso, se aposentou e ficou por conta dele", lembrou.

Notícia chegou pela tevê


Tereza, Adriana e o restante da família de Terezinha souberam do acidente por meio da televisão. Eles reclamam que a empresa de ônibus sequer ligou para informar que a mãe era uma das passageiras no ônibus envolvido no desastre. Com o próprio carro, foram atrás da mãe. Foram ao Corpo de Bombeiros e ao Instituto Médico Legal de Formosa, depois passaram no Hospital de Planaltina, até que chegaram ao Hospital de Base de Brasília (HBB), aonde Terezinha chegou de helicóptero, em estado grave.

"Fizemos todo esse trajeto sem saber se a encontraríamos. Ninguém tinha notícia. Só sabíamos que havia ocorrido o acidente e ela não estava saudável, com os outros sobreviventes. A empresa nem sequer se preocupou em nos avisar e, sempre que ligávamos, evitavam dar respostas. A retirada do corpo e das bagagens partiram de nós. Procuramos a empresa e recebemos pouquíssimas informações", lamentou.

A família ainda não sabe quando vai ser o velório da vítima. Só o local está confirmado: o cemitério de Águas Lindas de Goiás. O corpo de Terezinha está sendo cuidado por uma funerária, que deve liberá-lo até o fim de sábado (17/2).

Nota da empresa


A empresa Expresso Guanabara informou, por meio de nota, que "quando tomou ciência do fato, enviou de imediato uma força-tarefa de Brasília para prestar a assistência necessária aos passageiros". "A Guanabara lamenta o ocorrido e ressalta que irá prestar assistência necessária às vítimas", acrescentou a viação, que disponibilizou o telefone do Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) 0800-7281992 para atendimento aos familiares dos passageiros. A Guanabara informou ainda que instaurou um procedimento interno para investigar as causas do acidente e está à disposição para prestar todas as informações necessárias aos órgãos competentes para a elucidação da ocorrência.

As nove vítimas do acidente:


Edson Lopes Lima
Pedro Nogueira de Araújo
Antônio Hilton Pereira Rodovalho
Nataiane Lopes dos Santos
Wigna Casimiro Gonçalves
Isac Maximiano de souza
Terezinha Felix dos Santos
Dorgival Lino da Silva
Criança ainda não identificada

Fonte: SSP/GO e PCDF.

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