Deborah Novais - Especial para o Correio
postado em 22/02/2018 06:00
Na equipe de Oscar Niemeyer que construiu a sonhada e moderna capital, havia um arquiteto cuja ligação com a cidade iria se eternizar ainda mais: Gladson da Rocha. A história do capixaba que se mudou para Brasília durante o período de obras e decidiu permanecer no Planalto Central até o fim da vida é uma das mais ricas do acervo do Arquivo Público do Distrito Federal.
São 2,5 metros lineares de documentos textuais, além de plantas, fotografias, slides, diplomas, recortes de jornais, relatórios, entre outros. Os documentos com tom amarelado em decorrência do tempo narram uma linda trajetória de amor pela nova capital da República. Em duas levas, uma recebida em 2013 e outra em 2015, os materiais chegaram ao Arquivo Público após doação de Marcelo Montiel, filho de Gladson.
Entre os documentos, há diversas cartas de universidades e outras instituições internacionais com agradecimentos pelas palestras que o capixaba ministrava. ;Como um grande entusiasta de Brasília, ele sempre era chamado para falar sobre o projeto arquitetônico e urbanístico;, enfatiza Tereza Eleutério, gerente de acesso e difusão da Diretoria de Pesquisa do Arquivo Público. Gladson da Rocha apresentou o sonho de Juscelino Kubitschek para os continentes, com exceção da Ásia.
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Apaixonado
Natural de Vitória, capital do Espírito Santo, Gladson se mudou para o Rio de Janeiro e começou a trabalhar como vendedor de livros de arte e arquitetura. Após morar alguns anos nos Estados Unidos, transformou a Cidade do México na nova casa. Lá, conheceu Luz Maria, com quem se casou. O trabalho de livreiro continuou enquanto fez curso de cinema ; atuou em alguns filmes brasileiros e norte-americanos.
[SAIBAMAIS]Durante a graduação em arquitetura, leu publicações a respeito da construção da nova capital brasileira e, de acordo com o filho Marcelo, ;na mesma hora cismou que ia morar lá;. Gladson conhecia Oscar Niemeyer, devido ao trabalho de livreiro. Recém-formado, recebeu um convite do arquiteto carioca para integrar a equipe do Departamento de Urbanismo e Arquitetura (DUA) da Novacap, participando do desenvolvimento de projetos como a área central do Gama.
Gladson da Rocha chegou a Brasília em 1957. ;Iniciava-se, para mim, uma vida plena e rica, no melhor nível e na melhor equipe do país;, confessou Pimentel no prefácio do livro Minha Opção por Brasília ; Planejamento Urbano e Arquitetura, lançado em 1997.
Se dependesse do arquiteto capixaba, a 211 Norte seria muito diferente. Plantas e imagens de maquetes mostram o projeto da quadra pensada por Gladson. ;Ele criou uma proposta de superquadra bem diferente das que temos hoje, pensando mais nos pedestres do que nos carros;, destaca Tereza Eleutério.
;Além de ocupar preciosa área da superfície, a circulação de carros no interior da Super Quadra expõe os seus usuários ao desconforto permanente da presença física do veículo motorizado;, analisou o arquiteto em um documento que consta no arquivo. Por esse e outros argumentos, ele sugeriu que os veículos trafegassem subterraneamente. O projeto foi produzido em parceria com o Banco do Brasil, mas acabou não sendo construído.
O legado
Estabelecido oficialmente em Brasília em 1958, Gladson só deixou a cidade após o golpe militar, em 1964, quando foi trabalhar em Londres. A saudade e a reabertura política trouxeram o capixaba de volta à cidade do coração. ;Ele tinha uma paixão especial pela capital. Era um pioneiro com coração e paixão total, que defendia a cidade em todos os níveis;, afirma Marcelo, que seguiu o caminho do pai na arquitetura. Gladson permaneceu na capital até a morte, em agosto de 2007.
Algumas obras dele não existem mais, como a pirâmide da CEB na L2 Norte, mas ainda é possível visitar outras. Ele participou de projetos como os das embaixadas da Bolívia e do Egito, da Delegação da União Europeia no Brasil e da Casa Redonda. O urbanista também acompanhou o assentamento de áreas habitacionais como o Cruzeiro Novo e a Octogonal.
Como consultar
Como os documentos ainda não estão digitalizados, para ter acesso ao acervo de Gladson da Rocha é preciso ir à sede do Arquivo Público (SGO Quadra 5) e fazer o pedido de consulta. Muitas das histórias também podem ser conferidas no livro Minha Opção por Brasília ; Planejamento Urbano e Arquitetura, de autoria do arquiteto, publicado em 1997 pela editora Thesaurus.
Para saber mais
Conjuntos particulares
O conjunto particular de Gladson da Rocha foi o sétimo entre os fundos privados do Arquivo Público do DF. Só em 2015, além do dele, foram entregues memórias do ex-prefeito de Brasília Paulo de Tarso Santos e do médico, militar e pioneiro Ernesto Silva. Também existem o da bióloga belga Yvone Jean, o do fotógrafo Juca Chaves, o da professora pioneira Ecilda Ramos de Souza e registros do Brasília Palace Hotel.