Augusto Fernandes, Luiz Calcagno
postado em 11/04/2018 06:00
O aumento na procura, principalmente em função de doenças respiratórias provocadas por causa da mudança climática com o início do outono, evidenciou a falta de pediatras na rede pública de saúde do Distrito Federal, ontem. Os hospitais regionais de Taguatinga (HRT) e de Ceilândia (HRC) só atenderam casos emergenciais e pacientes internados. No segundo, não havia médico para crianças. No Guará (HRG), profissionais deram alta para pacientes menos graves para internar quem estava em situação pior. Os atendimentos no pronto-socorro do Hospital Regional da Asa Norte (Hran) só começaram por volta das 9h40.
[SAIBAMAIS]A Secretaria de Saúde não soube informar o deficit de pediatras, mas a subsecretária de Atenção integral à saúde, da Secretaria de Saúde do DF, Marta Vieira, admitiu a carência. O Hospital Regional do Paranoá (HRP) era o único com dois pediatras atendendo a população. De acordo com o Sindicato dos Médicos do DF, só 30% dos pediatras da capital atuam na rede pública e esse número cai a cada ano. A Sociedade de Pediatria confirma a saída.
Peregrinação
No Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib), que concentrou grande parte da demanda ontem, Neuza Maria dos Santos, 57 anos, gritou para conseguir o atendimento do neto. ;Tive que fazer um escândalo;, admitiu. Em outro caso, Miguel Beserra, 3 anos, passou horas na fila de espera, mesmo tendo sofrido, segundo a mãe, Renata Silva, 29, duas convulsões provocadas pela febre. ;Ele chegou a ter 40;C. Mesmo assim, não fui atendida. Mandaram eu esperar o meu filho ter outra convulsão para ele ser medicado;, contou Renata.
Andrea Carolina de Melo, 26 anos, também não conseguiu atendimento para os filhos, Maria Eduarda Pereira, 9, e Lucas Antônio de Melo, 4. A família esteve no Hmib e no HRT. Na primeira unidade de saúde, esperou por quatro horas, até ouvir a negativa. ;Os meus filhos estão perdendo aula. Os professores me pediram para levá-los ao hospital. Mas o que eu encontro é essa situação de menosprezo. Ninguém se importa. Nós temos que nos virar, peregrinando de hospital em hospital. É muito humilhante;, lamentou Andrea, com os filhos, em frente ao HRT.
Desestimulados
De acordo com Adriana Graziano, diretora do Sindicato dos Médicos do DF, faltam leitos, medicamentos e equipamentos. ;O médico é o profissional na linha de frente, fazendo o que pode, e é quem encara o desespero. Quem sofre agressões verbais e até físicas. A população está desesperada. Os médicos estão se formando e não têm interesse em ficar na rede pública, e os hospitais privados não conseguem absorvê-los;, comentou.
Integrante da diretoria da Sociedade de Pediatria do DF, Andrea Duarte Nascimento Jácomo concorda. ;Você, muitas vezes, se vê em uma situação que não consegue ajudar o paciente. A secretaria (de Saúde) tenta se organizar, mas há uma carência em todas as áreas, o que contribui com esse caos. Os médicos estão desestimulados;, afirma.
Sazonalidade
Marta Vieira atribuiu a demora no atendimento nos prontos-socorros pediátricos dos hospitais públicos ao começo do outono, com dias mais frios ; o Inmet registrou 18;C ontem. ;Está começando o período de sazonalidade e infecções respiratórias em crianças. No ano passado, nesse período, o número de atendimentos no Hmib passou de cerca de 6 mil ao mês para 12 mil. Há, ainda, uma procura grande de pais que vão ao pronto-socorro sem procurar a unidade básica. Uma tosse, uma febre, casos iniciais, mais leves, devem ser atendidos na unidade básica;, ponderou a subsecretária de Atenção integral à saúde, da Secretaria de Saúde do DF.
Marta admitiu a carência de pediatras, mesmo com a realização recente de um concurso público, que não deve suprir o deficit. ;Realizamos um concurso em janeiro e foram chamados 108 profissionais;, contou. Eles devem tomar posse em maio. Marta afirmou, também, que o GDF está comprando medicamentos e renovando equipamentos nas unidades hospitalares. A subsecretária defendeu o programa Saúde da Família. ;É um modelo preconizado no Ministério da Saúde e no mundo inteiro. A assistência geral à saúde da criança, que inclui doenças respiratórias mais leves, é feita pelo médico de família. É um modelo reconhecido como mais eficiente no mundo.;