Ana Carolina Fonseca - Especial para o Correio
postado em 31/05/2018 19:03
Nas últimas semanas, a casa de Adriele Ribeiro e Will Robson Rios, em Formosa (GO), é só preocupação. Os nove meses de gestação da mulher, à espera do primeiro filho do casal, eram só expectativa, mas viraram ansiedade. O que era para ser um sonho virou aflição, assim que a pequena Alice nasceu, em 9 de maio. Logo quando veio ao mundo, a recém-nascida foi diagnosticada com tetralogia de Fallot, uma condição responsável por quatro anomalias no coração. No laudo, a médica fala da necessidade de cirurgia cardíaca urgente com risco de morte. Apesar disso, e de uma decisão conquistada na Justiça do Distrito Federal, a bebê segue na fila de espera por uma cirurgia.
Alice está internada no Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib) enquanto aguarda autorização para a cirurgia de emergência que pode salvar a sua vida. Embora não haja vaga imediata para internação do Instituto do Coração do Distrito Federal (ICDF), único centro de saúde da capital capaz de realizar o procedimento, a família conseguiu na Justiça o direito ao atendimento imediato. A decisão é de 23 de maio, quarta-feira da semana passada, mas até agora, nada aconteceu.
"Eu não sou a única, são tantas mães...;, lamenta Adriele, 22 anos. A balconista, que trabalha em uma farmácia do município goiano, conta que, atualmente, a fila de espera para cirurgia neonatal tem 36 pacientes. Desses, 15, contando com Alice, são casos considerados graves por especialistas. Ainda sem previsão de quando a cirurgia vai acontecer, Adriele acredita que, sem entrar na Justiça, demoraria ainda mais para salvar a filha. "A fila é tão grande que precisa uma criança morrer para surgir vaga para outra;, explica com pesar.
Na decisão do dia 23 de maio, a juíza Francisca Danielle Vieira Rolim Mesquita determinou ao GDF a internação imediata de Alice no ICDF, bem como a realização do procedimento cirúrgico. Se mesmo assim o procedimento não puder ser realizado, o DF deverá pagar pela cirurgia no sistema privado de saúde, segundo o documento. "Caso não haja vagas nas unidades hospitalares da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, deverá o réu providenciar a internação da postulante em hospital particular;, escreveu a juíza na decisão.
No entanto, a decisão ainda não foi cumprida. Na tarde da última quarta-feira (30/5), a juíza Mara Silda Nunes de Almeida tornou a arbitrar a favor de Alice e pediu novamente o imediato cumprimento das medidas de saúde. Agora, o que falta é a intimação da Secretaria de Estado de Saúde do DF para que a cirurgia possa acontecer.
Desde que foi internada no Hmib, Alice já sofreu duas paradas cardiorrespiratórias. Inicialmente, os médicos da maternidade em Formosa afirmaram que ela tinha um sopro no coração e que, por isso, a família deveria procurar um cardiologista. Somente depois, já em Brasília, o diagnóstico de tetralogia de Fallot foi dado.
Avó da criança, Celma Ribeiro teme pelo pior. Segundo os laudos médicos, quanto antes for feita a cirurgia, maiores são as garantias de sucesso na recuperação da pequena. "A Alice não pode esperar e a gente não pode pagar", lamenta ela, que, hoje, se apega ao cumprimento da decisão judicial, para que possa ver a neta crescer com saúde.
Em nota, a Secretaria de Saúde do DF afirmou que o tempo de espera leva em consideração a disponibilidade de vagas nos leitos e que, no momento, todas estão ocupadas: Alice "aguarda vaga em leito de UTI para o pós operatório dessas cirurgias". Além disso, explica que, mesmo em caso de judicialização, pacientes de maior gravidade têm precedência. Confira a nota na íntegra:
"A recém-nascida A.R.R. está internada no Hospital Materno Infantil de Brasília, recebendo todos os cuidados necessários e seu quadro clínico é estável.
A paciente já está inserida na fila de regulação para realização de cirurgia no Instituto de Cardiologia do DF (ICDF). No momento, aguarda vaga em leito de UTI para o pós operatório dessas cirurgias. Todas as vagas do ICDF estão ocupadas.
As crianças que aguardam leitos em UTI para cirurgia cardíaca são portadoras de cardiopatias congênitas. A grande maioria dos casos é de pacientes que necessitam de leito de UTI de retaguarda, para ocupação após o procedimento cirúrgico.
Os leitos de UTI são regulados, em função da gravidade de cada caso. Pacientes em situação de maior gravidade têm prioridade, mesmo para pacientes judicializados, como dispõem as próprias decisões judiciais. Enquanto aguardam por um leito de UTI, esses pacientes ficam nas salas vermelhas da rede pública de saúde, com suporte de cuidado intensivo.
A Secretaria de Saúde destaca que realiza todos os esforços para cumprir as ordens provenientes do Judiciário."