Luiz Calcagno, Renata Nagashima*, Marlene Gomes - Especial para o Correio
postado em 23/06/2018 07:00
A maior parcela dos torcedores brasilienses levantou cedo ontem, vestiu o verde-amarelo e vibrou pelo time Canarinho. Mas uma minoria não teve a oportunidade de assistir à dramática vitória. Bombeiros, policiais, garçons, churrasqueiros, entre outros profissionais, tiveram de se concentrar no trabalho para garantir a diversão dos demais. E só depois puderam ver os gols da Seleção.
Em todos os jogos da Copa do Mundo, o segurança Marcos Antonio da Silva Correia, 45 anos, pouco consegue ver o que acontece em campo. Ontem saiu da cama às 6h30 para trabalhar. Enquanto controlava o fluxo de torcedores do Primeiro Bar, no Setor de Indústrias Gráficas (SIG), acompanhava o jogo pela emoção das pessoas. ;Não dá para assistir, mas deu para perceber que foi difícil. Copa do Mundo é assim;, destacou o morador de Taguatinga, sem reclamar. Ele estava desempregado até o início do Mundial.
Quem trabalha na cozinha de bares e restaurantes sofre em dobro durante os jogos do Brasil. Esse é um espaço em que distração com a tevê pode ajudar a desandar o prato. Ciente das limitações do trabalho, que não perdoa nem jogo do Brasil durante Copa, o chefe de cozinha Jorge Siqueira de Oliveira se acostumou com o ;isolamento; da cozinha e o ritmo frenético para atender os clientes.
Jorge saiu de casa às 3h40, na Cidade Ocidental (GO). Por volta das 4h30, estava no Primeiro Bar, onde trabalha. Antes de o sol nascer, ele tinha preparado o café da manhã para recepcionar os clientes, que começaram a chegar às 7h. ;A gente não para. Nem bem termina o coffee break estamos preparando as comidas que serão servidas no buffet do almoço;, detalhou.
No Toretto, restaurante de cozinha italiana, o gerente do estabelecimento, Francisco Gomes, comemorou o movimento enquanto se dividia entre atender os clientes, resolver problemas de última hora e assistir ao jogo. ;O movimento surpreendeu. Tivemos mais reservas até que no domingo (quando o Brasil empatou em 1 x 1 com a Suíça). Não esperávamos esse público. Agora, assistir mesmo a Seleção, só entre um atendimento e outro;, sorriu. Lá, mais de 150 pessoas acompanharam a partida.
Também com um olho no jogo e outro na clientela, um dos donos do bar Amsterdam, na Rua das Paineiras, em Águas Claras, Marco Antônio de Melo acompanhou com aflição o desempenho do Brasil. Lotado, o estabelecimento funcionou o dia inteiro. ;Entre um atendimento e outro, corremos o olho para o telão. Temos que torcer para chegar até a final. Vai gerar mais lucro, mais movimento e mais empregos;, destacou. Os garçons não paravam um minuto sequer. Com bandejas cheias de cerveja e petiscos, eles perambulavam sem parar pelo estabelecimento. Não havia como fazer pausa nem para a entrevista. ;Abrir o bar com o Brasil jogando é muito bom. Não esperava que teríamos toda essa movimentação;, comentou um dos garçons, pouco antes de sair apressadamente entre as mesas.
"Entre um atendimento e outro, corremos o olho para o telão. Temos que torcer para chegar até a final. Vai gerar mais lucro, mais movimento e mais empregos;
Francisco das Chagas de Araújo, churrasqueiro
Sem espaço para o vacilo
O churrasqueiro Francisco das Chagas de Araújo chegou mais cedo à Adega da Cachaça, em Taguatinga, e adiantou o tempero da carne. Uma tentativa de ter uma brecha para assistir ao jogo. ;Até coloquei a carne no fogo mais cedo. É delicado. Não posso perder a atenção para não queimar nada, por isso é difícil espiar a tevê;, comentou.
Com partidas marcadas para o horário do expediente, alguns trabalhadores são liberados, enquanto outros, como o sargento Bittencourt, do 15; Grupamento de Bombeiros Militar, precisam garantir a segurança pública. Apesar de estar de plantão ontem, ele conseguiu acompanhar parte do jogo. ;Felizmente não houve nenhuma ocorrência durante a partida e consegui assistir a metade do primeiro tempo e o segundo;, comemorou.
O vigilante Adejan Alves e o sargento Nicácio, da Polícia Militar do DF, também estavam de plantão. ;Não me incomodo de trabalhar, porque o jogo não paga as minhas contas. Mas, se pudesse escolher, é claro que preferiria estar com a minha família, confraternizando;, afirmou o vigilante. Para o sargento ontem era um dia comum, pois sempre trabalhou com escalas. ;Estou acostumado a perder ocasiões como Natal, fim de ano, Carnaval. E o jogo é mais um desses eventos. Sou brasileiro e gosto muito de futebol, mas não muda minha rotina;, ponderou.