Cidades

Especialistas defendem aprimoramento do saidão para evitar tragédias

Especialistas destacam que o benefício, apesar de importante para a ressocialização, precisa de acompanhamento mais próximo do Estado para ser efetivo e sugerem alternativas

Isa Stacciarini
postado em 14/08/2018 06:00
O regime semiaberto beneficia presos com bom comportamento detidos no Centro de Progressão PenitenciáriaO benefício do saidão para presos precisa ser aprimorado para garantir a efetividade da ressocialização. Essa é a opinião de advogados e estudiosos da área, que sugerem ações para o cumprimento devido do benefício. A discussão voltou à tona desde que um detento contemplado com o saidão do Dia dos Pais cometeu um assalto com reféns na 505 Sul e, na fuga, provocou um acidente de trânsito no Eixão Sul. A batida deixou três mortos e seis feridos.

Por lei, cada preso pode deixar a cadeia sem custódia, para reencontrar parentes, por 35 dias ao ano. O saidão é exclusivo àqueles que cumprem pena no regime semiaberto e não tenham cometido infração disciplinar de natureza média ou grave durante seis meses. Eles podem sair do estabelecimento prisional até as 10h do dia fixado para o início do período de cada saída temporária e devem retornar à unidade até as 10h do dia de término.

Precisa ainda voltar para casa até as 18h e não pode sair do DF nem usar bebidas alcoólicas, entorpecentes ou frequentar prostíbulos e bares. Este ano, até agora, a Vara de Execuções Penais (VEP) do TJDFT determinou cinco saídas ; serão nove no total. Cerca de mil presos são liberados em cada saidão. Ao todo, 43 não retornaram. Os dados são da Secretaria de Segurança Pública e da Paz Social (SSP-DF). Segundo a pasta, as forças policiais registraram sete ocorrências de crimes cometidos por internos beneficiados.

Com a repercussão do crime, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Distrito Federal (OAB-DF), Juliano Costa Couto, encaminhou ontem um ofício à Subsecretaria do Sistema Penitenciário do DF (Sesipe), à SSP-DF e à Polícia Civil em que pede mais informações sobre a estrutura para monitorar presos beneficiados com o saidão (leia Três perguntas para).

Políticas públicas


Professor de direito da Universidade de Brasília (UnB) e coordenador da pós-graduação em Direitos Humanos, Alexandre Bernardino Costa observa que quase todos os presos beneficiados com o saidão retornam ao cumprimento da pena. ;Poucos casos acabam gerando repercussão, até porque são apenados com bom comportamento e estão perto do fim do cumprimento da sentença. As exceções que acontecem são uma fatalidade. Encarcerar ainda mais e muito mal, como fazemos, não garante segurança nas ruas;, afirma. ;O modelo punitivo não gera benefício para segurança pública, prisional, nem para a população. Só serve para acarretar em mais encarceramento;, reforça.

José Gomes de Matos Filho, presidente da Comissão de Ciências Criminais da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Distrito Federal (OAB-DF), considera o saidão um instrumento de ;teste; para avaliar o comportamento do preso. ;Um dia ele vai retornar à sociedade e precisamos nos perguntar que tipo de egresso nós queremos. No saidão, um número expressivo de presos retorna ao sistema sem cometer nenhum crime, mas está provado que uma parcela acaba praticando delitos. Independentemente disso, é um direito que o preso tem;, destaca.

Para aprimorar o sistema, José Gomes sugere o uso de tornozeleiras eletrônicas, caso dos apenados que cumprem prisão domiciliar, além do reforço no policiamento.

Colaborou Marlene Gomes (especial para o Correio)

Três perguntas para Juliano Costa Couto, presidente da OAB-DF


O que fazer para garantir a segurança da comunidade e o cumprimento do benefício dos presos?
Exigir do poder Executivo que oferte e garanta estrutura mínima necessária para não colocar em risco a população. A intenção do benefício de ressocialização é positiva, mas precisa vir acompanhada de políticas públicas indispensáveis para o sucesso da medida, inclusive com a correta avaliação de condição social e psíquica do preso.

Quais os aspectos positivos e negativos da medida?
Os positivos são a possível ressocialização do interno e a reintegração dele à sociedade. Inclusive é um instrumento previsto pela Lei de Execuções Penais (LEP), mas também tem os pontos negativos, quando a saída de um preso sem os devidos cuidados do Estado acaba ocasionando em crimes que colocam em risco a vida das pessoas. É o poder público patrocinando indiretamente essas ações.

Quais ações poderiam garantir o cumprimento do saidão de forma efetiva?
Uma das medidas poderia ser a utilização de tornozeleiras eletrônicas para as polícias terem um controle próximo do beneficiado. Com a estratégia, as forças de segurança identificariam onde o apenado está e, consequentemente, o preso não tenderia a se arriscar, sob pena de ser responsabilizado.

Povo fala


Qual a sua opinião sobre os saidões?

Antônio dos Santos,
69 anos, taxista, morador de Sobradinho
;Sou contra. Quem autoriza o saidão não está respeitando a vida, o patrimônio e a paz das pessoas. A pessoa sai da cadeia hoje, mata amanhã e depois volta para a cadeia.;

Eliene de Souza Dias Barbosa,
56 anos, funcionária pública, moradora do Guará
;Uma vez que ele foi condenado e está preso, deve cumprir toda a sentença na prisão, sem saidão. Ele não merece qualquer benefício. Vivemos com muita insegurança.;

Chayne Araujo Rocha,
26 anos, vendedor, morador do Recanto das Emas
;Deveria haver um gerenciamento de presos, com um controle sobre aqueles que realmente estão aptos a ter o benefício. Esse tipo de coisa não pode ser concedida para qualquer um, sem existir um rigoroso controle.;

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