Cidades

Moradores do Sol Nascente, em Ceilândia, contam como é morar na região

Moradores destacam os problemas da região, como segurança e transporte público, mas elogiam a urbanização que vem sendo feita na cidade, com cerca de 100 mil habitantes. Projetos da própria comunidade investem na qualidade de vida das pessoas

Walder Galvão - Especial para o Correio
postado em 26/08/2018 08:00
Após quase 30 anos de existência, o Setor Habitacional Sol Nascente, em Ceilândia, começa a ganhar identidade própria. A região está em processo de urbanização e apresenta melhorias significativas, mas ainda enfrenta precariedade em diversos serviços públicos, principalmente devido ao número de moradores ; são cerca de 100 mil pessoas.

;Quando me mudei para cá, eu odiei. Era muito deserto, sujo e violento, parecia uma boca de fumo. Mas hoje, eu acho isso aqui um lugar maravilhoso de se morar;, reconhece a dona de casa Silvanete Praxedes da Silva, 52 anos. Nascida em Pernambuco, ela chegou ao Distrito Federal aos 5 anos. Passou toda a vida como moradora de Ceilândia e se mudou para o Sol Nascente há 6 anos.

Com o pouco dinheiro da aposentadoria do marido, Reginaldo Jorge da Silva, a família de Silvanete decidiu comprar um lote no Sol Nascente. ;Tenho três filhos, dois moram em Ceilândia, e a mais nova, comigo. Construímos toda nossa vida por aqui e não temos vontade de ir embora;, ressalta.

Essa relação de pertencimento à cidade, mesmo com tanto por fazer, ajuda os moradores a tomarem iniciativas, enquanto as ações do poder público não chegam a toda região. Para a falta de transporte público, por exemplo, eles recorrem ao uso de veículos piratas; a ausência de policiamento é resolvida com grades no comércio. Apesar dos problemas, o orgulho de morar no bairro está no olhar e em ações de muitos que vivem ali.

As melhorias que ocorrem no Sol Nascente não partem apenas do governo. O desejo de viver em um lugar melhor motiva a população local a ter uma participação maior na comunidade. Desde 2014, o Projeto Mãos Solidárias ajuda mães e crianças da região. Cursos de manicure e cabeleireiro são oferecidos para as adultas e aulas de reforço, karatê, jiu-jitsu e informática fazem parte do cronograma de atividades infantil.

;Muitos pais não têm onde deixar os filhos enquanto estão no trabalho e temos várias mulheres precisando de capacitação. Muitas são vítimas de violência doméstica ou algum problema com drogas;, conta a coordenadora do projeto, Maria Onária Sousa Teixeira, 31. No total, o Mãos Solidárias atende a 180 crianças e a 70 mães.

Maria Onária ressalta que, ;aos trancos e barrancos;, o projeto continua a sobreviver. ;Sempre precisamos de doações, principalmente de alimentos. Temos três lotes, onde funcionam as atividades das crianças, mas, às vezes, não conseguimos nem oferecer um lanche;, se queixa. De acordo com ela, os cursos e as aulas são ministrados por voluntários da própria comunidade, que têm o desejo de melhorar as coisas na região onde vivem.

Junto à história da cidade, gerações começaram a se formar no Sol Nascente. Paola Cristiny Silva, 18, mora na região desde que nasceu e afirma que o local passou por diversas melhoras ao longo dos anos. ;Hoje, temos um comércio mais forte e movimentado e muitas ruas estão asfaltadas. As linhas de ônibus aumentaram, mas ainda não são suficientes;, pondera. Para ela, a tendência é de que os moradores recebam ainda mais acesso a serviços públicos.

Mesmo depois de casada, Paola decidiu continuar morando na região. Ela conta que o local passou a oferecer opções de lazer, mesmo que precárias. ;Hoje, temos barzinhos e até algumas festas realizadas pela própria população;, diz. Para ela, o ideal seria reforço no policiamento. ;Todos sabemos que aqui é muito perigoso, mas, nos dias atuais, ninguém é seguro em nenhum lugar;, constata.

História


O Sol Nascente começou a se formar com pessoas em busca de moradia barata. Somado a isso, o oportunismo de grileiros e a falta de fiscalização de governos no passado fizeram com que a região se expandisse e se tornasse maior até mesmo que a Rocinha, favela localizada no Rio de Janeiro. Em 2013, a Companhia de Planejamento do DF (Codeplan) divulgou uma pesquisa que mostrava que a região somava mais de 20 mil residências.

A vizinha Ceilândia foi criada oficialmente em 1971. Cerca de 20 anos depois, os primeiros moradores do Sol Nascente começaram a chegar ao lugar. Apenas em 2008, a ocupação passou a ser reconhecida como setor habitacional pela Lei Complementar n; 785, de 14 de novembro. Hoje, cerca de 15% da população da região administrativa mora na ocupação.

Desde então, o Sol Nascente passa por um processo de urbanização. Na entrada do bairro e nas vias principais, o cenário é diferente de 10 anos atrás. As construções de madeira perderam espaço e as residências de alvenaria avançou. O asfalto deixou de ser sonho da população local e passou a cortar diversas ruas. O comércio também ganhou força e começou a gerar empregos para as pessoas que vivem lá. O Governo do Distrito Federal (GDF) regularizou algumas áreas e entregou 344 escrituras só este ano. Além disso, os moradores da região ganharam uma Unidade de Saúde Básica (USB) no início do ano.

Apesar das melhorias, a área ainda segue com um contraste de diferenças. Os locais mais urbanizados se assemelham a Ceilândia, no entanto, não é preciso andar muito para encontrar ruas em condições precárias. Quanto mais longe do centro, pior é a situação para os moradores. Entre as reclamações da população, estão segurança e transporte público.

Medidas


Com o passar do tempo, o GDF passou a intensificar os trabalhos no Sol Nascente. Atualmente, estão sendo investidos R$ 220,3 milhões em obras de urbanização, como drenagem pluvial, pavimentação asfáltica, execução de calçadas e implementação de meios-fios. No total, 75% do recurso é originário da Caixa Econômica Federal e 25%, do governo local. A Companhia de Saneamento Ambiental (Caesb) informa que cerca de 80% da população da região conta com abastecimento de água e aproximadamente 25%, com coleta de esgoto. Até o momento, 79km das vias foram pavimentadas.

No âmbito da segurança, a Polícia Militar informa que tem implantado diversos tipos de patrulhamento no local, como até mesmo rondas a pé nas quadras residenciais e comerciais. Além disso, a corporação ressalta que um grande problema encontrado na região é a reincidência criminal. Segundo a PM, muitos criminosos não permanecem presos e voltam a cometer os mesmos delitos quando soltos.

Em relação à mobilidade urbana, o Transporte Urbano do DF (DFTrans) ressalta que tem consciência do aumento da demanda no bairro e que houve o reforço em diversas linhas da região desde abril. O órgão destaca que, à medida que as obras de infraestrutura forem concluídas, as rotas de ônibus serão ampliadas para passar nas ruas que, hoje, não têm asfalto.

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